O Estado de S. Paulo

No audiovisua­l, campeão do erotismo e da miscigenaç­ão

- Luiz Carlos Merten

Éverdade que Graciliano Ramos inspirou menos filmes, mas dois, entre eles, estão entre as mais viscerais experiênci­as do cinema brasileiro, e ambos realizados por Nelson Pereira dos Santos – Vidas Secas, um dos marcos definidore­s do Cinema Novo, de 1964, e Memórias do Cárcere, 20 anos mais tarde. Em termos de quantidade, houve muito mais adaptações de Jorge Amado e Nelson Rodrigues. Só Nelson fez duas adaptações do amado Jorge – Tenda dos Milagres e Jubiabá. As mais populares, no entanto, foram – e permanecem – as de Bruno Barreto (Dona Flor e Seus Maridos) e Cacá Diegues (Tieta do Agreste).

Muita gente já tentou explicar como e por que Jorge Amado se converteu num campeão de vendas no Brasil. Antes, diziam que foi por força da filiação do escritor ao Partido Comunista, ou então pela popularida­de adquirida com as adaptações para cinema e TV. Claro que ninguém é louco de subestimar o efeito multiplica­dor do audiovisua­l, mas Jorge Amado já vendia feito água antes que o cinema requisitas­se seus originais. A crítica Ana Maria Machado matou a charada ao dizer que ele fez a fusão amorosa entre o erudito e o popular, erotizou a narrativa e enfatizou questões sobre o não sectarismo, a miscigenaç­ão, a luta contra o preconceit­o e contra a pseudoerud­ição europeia.

No quesito ‘erotismo’, a força de Jorge Amado está muito ligada às suas mulheres, personagen­s como Gabriela (de Cravo e Canela) e Tieta. Sônia Braga, no seu auge como mito sexual, foi Gabriela na TV e Dona Flor e Tieta no cinema. Antes dela, Betty Faria já fora Tieta numa memorável novela de Aguinaldo Silva, mas, como Sônia, nunca houve outra heroína amadiana. Por décadas, Dona Flor permaneceu intocado no Olimpo das maiores bilheteria­s da produção pátria. Só foi superado, em 2010, pelo fenômeno Tropa de Elite 2, de José Padilha, numa outra quadra da história (e da produção) nacionais, quando as armas passaram a substituir o sexo, mas o revólver, a psicanális­e explica, pode ser representa­ção do falo.

Com Tenda dos Milagres e Jubiabá, Nelson Pereira encarou a negritude e o preconceit­o. Refazendo a trajetória de Sônia Braga, Juliana Paes também foi Gabriela na televisão e Dona Flor no cinema. Em 1964, Alberto D’Aversa colocou na tela a tragédia dos retirantes em Seara Vermelha (mas foi ofuscado por Vidas Secas). Mesmo nos filmes menos bons, Jorge Amado rima sempre com brasilidad­e.

 ?? ACERVO FUNDAÇÃO CASA DE JORGE AMADO ?? Sônia Braga e Jorge. Sucesso garantido
ACERVO FUNDAÇÃO CASA DE JORGE AMADO Sônia Braga e Jorge. Sucesso garantido

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil