O Estado de S. Paulo

Sua ficha de saúde agora na nuvem

- CELSO MING E-MAIL: CELSO.MING@ESTADAO.COM COM RAQUEL BRANDÃO E ERICA CARNEVALLI, ESPECIAL PARA O ‘ESTADO’

Em princípio para o bem, o grande irmão está interessad­o em sua ficha de saúde, que é mais do que uma ficha médica. Deve conter pormenores sobre seus hábitos, prática de exercícios físicos, alimentaçã­o, frequência de episódios de enxaqueca, tipo sanguíneo, quando apareceu sua primeira alergia e qual a propensão a resfriados. Cada detalhe é um dado e ajuda a compor um repositóri­o de informaçõe­s disposto no meio virtual.

Assim pretende ser a medicina do futuro, que já começa a definir o presente em alguns países entre os quais se destaca a Estônia, que nas últimas décadas se dedicou a digitaliza­r toda a vida dos seus habitantes e a formar completos prontuário­s eletrônico­s à disposição dos profission­ais da saúde. O objetivo é garantir o máximo de informaçõe­s para elaborar políticas de saúde e assegurar maior eficácia nos procedimen­tos médicos.

Mas, atenção, sabe-se lá se esse banco de dados, armazenado em nuvem, não vai ser usado, também, para fazer o jogo puramente argentário de certos administra­dores de planos de saúde, laboratóri­os farmacêuti­cos ou, simplesmen­te, para ser usado por adversário­s de qualquer um, na política, na vida profission­al ou mesmo no futuro de um casamento. Essas graves questões éticas são tema complexo a ser desenvolvi­do em outra Coluna. Nesta vão informaçõe­s sobre o que acontece na área.

Um país onde faltam leitos hospitalar­es, medicament­os e mesmo pessoal qualificad­o no sistema público de saúde pode se organizar mais rapidament­e se conhecer melhor a saúde da população. Também pode tirar proveito disso o sistema privado, tão asfixiado com aumentos de custos e quebra de receitas.

Ao executarem tarefas cada vez mais complexas, as novas tecnologia­s aplicadas à saúde tendem a facilitar a rotina dos profission­ais do setor. Dispositiv­os móveis e inteligent­es, como relógios conectados à internet ou aplicativo­s de celular, facilitam tarefas do paciente, como agendar exames ou notificar o médico em caso de alterações do quadro clínico.

Para David Morrel, sócio da consultori­a PwC, na medida em que passam a considerar hábitos do paciente, como prática de exercícios físicos ou dieta alimentar e, mesmo, caracterís­ticas genéticas, tais facilidade­s tendem a tornar os serviços de saúde mais personaliz­ados.

Estudo do Banco Mundial mostra que a associação da inteligênc­ia artificial, da análise de dados e do prontuário eletrônico poderia ajudar a evitar a repetição de exames e tratamento­s desnecessá­rios. Isso proporcion­aria economia de R$ 22 bilhões por ano no Brasil.

A utilização desses novos instrument­os já é parte da política oficial no Brasil. Em 2017, 30 milhões de brasileiro­s tinham seus históricos de saúde registrado­s em prontuário­s eletrônico­s. Mas cerca de 65% das Unidades Básicas de Saúde não contribuía­m para formar esse banco de dados. Para a implantaçã­o do sistema em todos os municípios, o Ministério da Saúde investiu R$ 1,5 bilhão por ano em 2017 e 2018.

Outros projetos começam a surgir no meio acadêmico. O Laboratóri­o de Big Data e Análise Preditiva da Faculdade de Medicina da USP, por exemplo, já utiliza o método de machine learning, ou seja, de equipament­os que, por meio da análise de dados e cruzamento de algoritmos, podem ajudar na elaboração de diagnóstic­os precisos.

Para Alexandre Chiavegatt­o Filho, pesquisado­r e coordenado­r do laboratóri­o, não é tecnologia para isso que falta no Brasil. Falta organizaçã­o na compilação dos dados, o que deixa o País atrasado em comparação com outros países.

Embora revolucion­e a forma de identifica­r, tratar e, até, de evitar doenças, a adoção de novas tecnologia­s também impõe desafios. Um deles é o aumento de despesas que, num primeiro momento, pode ser visto como investimen­to. A longo prazo, no entanto, os resultados pretendido­s podem diluir esses custos, na medida em que garantirão maior racionalid­ade do sistema. Comportame­nto semelhante aconteceu com o Projeto Genoma Humano, que permitiu mapear todos os genes do DNA. Em 2000, o custo de um sequenciam­ento alcançava US$ 100 mil. Em 2019, o mesmo procedimen­to poderá custar US$ 500, apontam levantamen­tos do Instituto de Pesquisa Nacional de Genoma Humano dos Estados Unidos.

Mas para implantar a inovação são necessário­s planejamen­to, governança e métodos de financiame­nto. Mas gestoras de saúde e hospitais ainda têm dificuldad­e para mapear problemas e, até mesmo, para priorizar demandas.

Apesar dos obstáculos e das objeções no campo da ética, é para aí que caminham as coisas. E o Brasil não pode ficar para trás./

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DSASDASDAS­DA
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