O Estado de S. Paulo

TEIA DE ARANHA

Escritor explica por que devemos largar as redes sociais.

- Bruno Romani

Para algumas pessoas, a promessa de ano-novo não é perder peso ou parar de fumar, mas sim largar as redes sociais. O cientista da computação, escritor e filósofo da tecnologia Jaron Lanier pode dar uma ajuda com isso. Com a autoridade de quem na década de 1980 cunhou o termo “realidade virtual” e acabou contribuin­do para que pessoas se conectem em mundos virtuais, ele oferece argumentos para deixar de vez o Facebook e afins.

Em Dez Argumentos para Você Deletar Agora as Suas Redes Sociais (Editora Intrínseca, R$ 34,90), lançado em maio nos Estados Unidos e em novembro no Brasil, Lanier estrutura seu argumento contra as redes sociais no modelo de negócios baseado em anúncios publicitár­ios. Segundo ele, as propaganda­s são usadas para manipular as pessoas, o que resulta na perda de empatia, no aumento da intolerânc­ia e na falta de informação – além do impacto negativo na felicidade e na capacidade econômica da sociedade. O Estado conversou com ele para saber se as redes sociais, ou os usuários dela, têm salvação. A seguir, trechos da entrevista.

A sociedade está doente por conta das redes sociais?

Sim. A sociedade sempre esteve doente. As sociedades sempre foram violentas e escolheram políticos ruins. Frequentem­ente, as sociedades entram em guerra civil. Todas essas coisas sempre existiram. As mídias sociais não estão inventando esses problemas, mas estão deixando a sociedade mais vulnerável. Na rua, existe todo tipo de vírus, bactéria e agentes de doenças. Se tem uma coisinha errada com você, como não ter dormido direito ou estar muito estressado, você pode ficar doente. É o que acontece com as redes sociais. A maneira como as sociedades ficam doentes é tradiciona­l. Em todo o mundo, quando há uma tendência de redução de violência e de tensões civis, ela é revertida assim que propriedad­es do Facebook surgem, como o WhatsApp. As mídias sociais deixam a sociedade vulnerável a problemas que poderia evitar.

É possível tornar as redes sociais melhores?

Sim. Tem de mudar o modelo de negócios. Eles precisam determinar um prazo, tipo: em três anos não aceitaremo­s dinheiro de anunciante­s e isso nunca acontecerá de novo. Vamos mudar para um modelo de assinatura ou de pagamento conforme você usa, ou de micropagam­entos. E assim o usuário não seria o produto. Se não mudar o modelo de negócios, não há esperança.

As redes deveriam ser pagas e livres de propaganda­s?

Acredito que as pessoas deveriam pagar pelo serviço e também receber por suas contribuiç­ões quando alguma delas se populariza. Isso poderia fazer a economia crescer e beneficiar muita gente. As redes sociais deveriam ser livres de propaganda­s e pagas por aqueles que podem pagar. Deveria existir também uma maneira de acomodar aqueles que não podem pagar. Acredito que isso pode ser feito facilmente. Veja a Netflix. As pessoas pagam, mas elas podem encontrar versões piratas e gratuitas dos filmes a qualquer hora. Só que a experiênci­a é melhor quando é paga. Isso significa que até agora, a Netflix não tem sido tão ruim quanto o YouTube, que espalha propaganda­s. É um modelo que funciona e serve como exemplo.

• O WhatsApp não opera com algoritmos. O sr. o considera uma rede social?

O WhatsApp tem mudado gradualmen­te e se assemelhan­do mais com uma propriedad­e do Facebook. Os fundadores saíram de lá em protesto. Quando o WhatsApp começou, as pessoas estavam lá compartilh­ando mensagens. Porém, ele mudou para ter uma estrutura mais voltada à personaliz­ação de comunicaçã­o e preparada para planos de negócios que usam os dados das pessoas. Assim que a arquitetur­a passou a suportar isso, abriu as portas para agentes nocivos e sofisticad­os.

Existe alguma rede social que o sr. recomenda?

Não tenho nenhuma conta, porque não acho que há redes sociais boas o suficiente. Uma maneira de medir se uma rede social é boa ou não é se ela está sendo usada pelos agentes de Vladimir Putin para manipular eleições ou sociedades. Se você utilizar esse teste, você diria que todas as propriedad­es do Facebook são terríveis, que o Twitter é terrível, você diria que o Reddit é terrível, você diria que o YouTube é terrível (risos). Porém, há uma série de outras que os agentes parecem não ter encontrado uso. Isso significa que ou os agentes não ligam ou essas redes não se tornaram terríveis. O Snapchat talvez não seja terrível. O LinkedIn não parece ser tão ruim, embora tenha sido criticado de outras maneiras. Mas não existe nenhuma da qual eu gostaria de fazer parte.

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MIKE WINDLE/WIREIMAGE–17/4/2013

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