Alerta de barragens tira 600 pessoas de suas casas em MG
Estruturas foram construídas no modelo de Brumadinho e empresas se recusam a atestar estabilidade; Vale e ArcelorMittal alegam precaução
Quase 600 moradores de Barão de Cocais, a 80 km de Belo Horizonte, e Itatiaiuçu, a 78 km da capital mineira, foram retirados de suas casas ontem, por causa do risco de rompimento de barragens. Os empreendimentos em Barão de Cocais e Itatiaiuçu são da Vale e da ArcelorMittal, respectivamente, que alegaram prevenção.
Segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM), os empreendedores, em consonância com o órgão, acionaram o nível 2 de emergência das barragens – o que justificaria a retirada de pessoas no entorno. Ambas foram construídas com a metodologia de alteamento à montante, técnica mais barata e de maior risco, mas já não estavam em operação.
Segundo a ANM, empresas terceirizadas fizeram inspeção nos locais para elaboração da Declaração de Condição de Estabilidade (DCE). “Nenhuma das empresas atestou a estabilidade das barragens”, informou o órgão, em nota. O coordenador adjunto da Defesa Civil de Minas Gerais, coronel Flávio Godinho, afirmou que as minas em Barão de Cocais e Itatiaiuçu foram paralisadas e as famílias retiradas, após o toque de sirenes. “E só retomarão as atividades após as empresas Vale e ArcelorMittal apresentarem os laudos.”
Medo. “Faz três anos e três meses que era para eu estar morto (em Mariana). Mas naquele dia saí mais cedo do trabalho. Agora não acredito que estou vivendo tudo de novo.” O relato é de José Geraldo de Almeida Filho, que acordou por volta de 2 horas de ontem com o som de um alarme soando na comunidade onde vive, de Socorro.
Agora tem medo de voltar para casa – algo também sem previsão oficial. “A gente sabe que todo mundo pode morrer. É fora de questão voltar, a não ser que a Vale esvazie tudo lá.” Almeida Filho conversou com o Estado algumas horas depois da saída às pressas, abrigado em um dos hotéis da região para onde a empresa encaminhou 205 pessoas evacuadas de cinco comunidades rurais na área que pode ser atingida em caso de rompimento da barragem Sul Superior. Outras 188 foram para as casas de parentes.
O local, já desativado, recebia os rejeitos da mina de Gongo Soco. A extração de minério de ferro do local foi paralisada, segundo a Vale, em abril de 2016. Conforme a Defesa Civil, 33 pessoas se recusaram a deixar as residências. É o caso do marido de Vilma Aparecida dos Santos, que não quis ir embora, mesmo quando a mulher e o filho mais novo foram levados a um hotel. “Ele ficou com cinco amigos, porque acha que não vai acontecer nada. Mas eu não arrisquei.”
Estimativas da prefeitura são de que pelo menos mil pessoas vivam à beira do Rio São João, a 1,2 quilômetros, e também podem ser atingidas. Elas estão sendo informadas do risco, mas só devem ser retiradas se o alarme de rompimento soar.
De acordo com a Vale, a Sul Superior é uma das dez barragens à montante inativas remanescentes da empresa e faz parte do plano de aceleração de descomissionamento (desativação) anunciado após o desastre de Brumadinho – até ontem, com registro de 157 mortos.
Itatiaiuçu. O presidente da ArcelorMittal Mineração Brasil, Sebastião Costa Filho, informou que um laudo com critérios mais rígidos de segurança, apresentado ontem por uma empresa de consultoria, fez a empresa retirar cerca de 200 pessoas da comunidade de Pinheiros, em Itatiaiuçu.
“O que eu entendi é que nós nunca mais vamos poder voltar para lá. Tem o psicológico. Como é que vamos dormir?’, indagava um dos moradores levado para um hotel. Segundo ele, a empresa chegou a falar em indenização “ou em construir casas longe da barragem”.
A mina de Serra Azul produz 1,2 milhão de toneladas de concentrado e minério granulado. A barragem de rejeitos está desativada desde outubro de 2012. De acordo com o Corpo de Bombeiros, se houver o rompimento da estrutura, os rejeitos podem atingir a BR-381, que liga Belo Horizonte a São Paulo e o Rio Manso.
Em nota, a ArcelorMittal informou que a medida foi de precaução. “Apesar do transtorno para a comunidade, esta é a decisão correta.”
Na madrugada
“Moro com a minha mãe, que tem 100 anos e não consegue andar direito. Só peguei os remédios dela e fui para a rua.” Joaquim Ramos Teixeira
ACORDADO NESTA SEXTA, ÀS 3 HORAS,
POR VIZINHOS, EM ITATIAIUÇU