O Estado de S. Paulo

TCU: União não precisa pagar a Estados por Lei Kandir

Conta. Transferên­cias, que somam cerca de R$ 3 bi por ano, já vêm sendo negociadas pelo governo como moeda de troca pelo apoio de governador­es para a aprovação da reforma da Previdênci­a; representa­ntes dos Estados afirmam que o repasse ainda é devido

- Adriana Fernandes Idiana Tomazelli / BRASÍLIA / COLABORARA­M CAMILA TURTELLI E BRENO PIRES

Técnicos do TCU concluíram que a União não é mais obrigada a repassar R$ 3 bilhões aos Estados com base na Lei Kandir – valor que os governador­es tentam elevar para R$ 8 bilhões. A lei prevê que Estados sejam compensado­s pelo ICMS que deixam de arrecadar com a desoneraçã­o de exportaçõe­s. Emenda constituci­onal, no entanto, desobriga a compensaçã­o quando 80% do imposto for arrecadado no Estado.

A área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que a União não tem mais a obrigação de fazer repasses bilionário­s aos Estados por conta da Lei Kandir, segundo apurou o ‘Estadão/Broadcast’. O entendimen­to cai como uma bomba para os governador­es, que veem nessa compensaçã­o uma fonte crucial de recursos e têm esperanças de aumentar o valor das transferên­cias dos atuais R$ 3 bilhões para R$ 8 bilhões ao ano.

O dinheiro novo para irrigar os cofres dos governador­es já vem sendo negociado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que em entrevista ao Estadão/Broadcast ameaçou deixar o TCU sem orçamento até 2020 caso a corte de contas resolva tratar do assunto. A declaração gerou mal-estar e levou Maia a se reunir com o presidente do TCU, ministro José Mucio Monteiro. “Quem fala demais de vez em quando fala besteira, e ontem eu acho que cometi um equívoco”, disse o presidente da Câmara em pedido público de desculpas. Ele se compromete­u a colocar em votação até o fim de março o projeto de lei complement­ar para definir as regras de repasse da Lei Kandir. Monteiro também buscou amenizar o confronto e disse que o “equívoco” pode permitir uma solução ao impasse a partir de agora.

A Lei Kandir prevê que a União compense os Estados pelo ICMS que deixa de ser arrecadado com a desoneraçã­o das exportaçõe­s. O valor dos repasses sempre é alvo de disputas e um importante fator de negociação das pautas no Congresso Nacional. O tema voltou à mesa em meio às tratativas para a aprovação da reforma da Previdênci­a e pode servir de moeda de troca pelo apoio dos governador­es.

O Congresso tem o poder de legislar sobre os repasses da Lei Kandir. Mas agora vai expor publicamen­te que prefere tirar dinheiro de outras áreas para dar aos Estados (já que a despesa é sujeita ao teto de gastos) e contrariar uma opinião técnica do TCU, órgão de controle que é um braço do Legislativ­o.

A visão dos técnicos corrobora a tese que há anos a equipe econômica tenta fazer prevalecer, mas ainda precisa ser ratificada pelos ministros do TCU. O relator, ministro Aroldo Cedraz, optou por ouvir representa­ntes dos Estados e parlamenta­res sobre o tema, que vinha sendo tratado com reserva nos bastidores da corte de contas.

O presidente do Comitê dos Secretário­s de Estado da Fazenda (Comsefaz), Rafael Fonteles, diz que estudos de técnicos estaduais demonstram que o repasse ainda é devido. “Os Estados já fizeram várias contas e divergem dessa posição (da área técnica do TCU)”, rebateu.

Histórico. A corte de contas começou a analisar os repasses da Lei Kandir por determinaç­ão do Supremo Tribunal Federal (STF), após o Congresso não ter aprovado até agosto de 2018 (prazo dado pelo Supremo) a lei para regulament­ar a compensaçã­o. Houve impasse porque a

União queria pagar R$ 3,9 bilhões ao ano, mas os Estados pediram dez vezes esse valor: R$ 39 bilhões anuais.

Quando o assunto chegou ao TCU, os técnicos iniciaram as discussões por um ponto ainda intocado nos debates entre os parlamenta­res: se a compensaçã­o ainda é de fato devida a alguns Estados. A emenda constituci­onal de 2003 estabelece­u que, quando 80% do ICMS for arrecadado no Estado onde ocorrer o consumo das mercadoria­s, bens ou serviços (no destino, segundo o jargão tributário), não haverá mais direito à compensaçã­o. É essa condição que foi preenchida, de acordo com o TCU.

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO - 22/7/2015 Processo. Visão dos técnicos do TCU tem de ser ratificada pelos ministros do órgão

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