O Estado de S. Paulo

A ministra tem razão

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Ministra Tereza Cristina defende cuidado na redução de benefícios à agropecuár­ia.

Está certa a ministra da Agricultur­a, Tereza Cristina, ao defender muito cuidado na redução de benefícios à agropecuár­ia, maior estrela do comércio exterior brasileiro e principal fonte de segurança cambial do País. Com vendas externas de US$ 101,69 bilhões, o agronegóci­o proporcion­ou 42,40% da receita de exportaçõe­s e se manteve como o setor mais competitiv­o da economia nacional, além, é claro, de garantir boas condições de abastecime­nto interno e contribuir para o controle da inflação e o bem-estar das famílias. O ministro da Economia, Paulo Guedes, pode ter razões muito boas para propor a redução de subsídios custeados pelo Tesouro. Mas poderá evitar erros muito graves se ouvir as ponderaçõe­s de sua colega da Agricultur­a. Produção, abastecime­nto e exportação envolvem muito mais que abstrações financeira­s.

Não pode haver um desmame radical dos subsídios, alertou a ministra Tereza Cristina em entrevista publicada ontem no Estado. Segundo o presidente do Banco do Brasil (BB), “o grosso da atividade rural” pode financiar-se a taxas de mercado. O ministro da Economia já havia anunciado a intenção de reduzir os subsídios pagos pelo Tesouro Nacional.

Produtores têm mostrado inquietaçã­o diante do risco de mudança abrupta na política agrícola. Ao recomendar cuidado antes de qualquer alteração, a ministra vai muito além, é bom sublinhar, da mera defesa de interesses de grupos ou mesmo de um setor. A sua defesa é da economia brasileira.

Subsídios enormes são concedidos ao agronegóci­o nas economias desenvolvi­das e em parte das emergentes. Essa ajuda distorce os preços, as decisões de produção e as condições do comércio internacio­nal. A ajuda proporcion­ada aos produtores brasileiro­s é muito modesta, diante dos padrões dominantes no mercado. Embora pequena, sua eliminação seria imprudente, num ambiente de concorrênc­ia deformada por barreiras protecioni­stas e grande subvenções.

As condições desiguais têm sido comprovada­s muitas vezes por estudos de entidades internacio­nais. Entre 2015 e 2017, os subsídios correspond­eram a 18% da receita bruta dos produtores, em média, nos países-membros da Organizaçã­o para Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE), segundo a entidade. No mesmo período, a subvenção paga aos produtores brasileiro­s equivaleu a 2,7% de seus ganhos. Em alguns países da União Europeia o benefício proporcion­ado à agropecuár­ia foi muito superior à média da OCDE.

Alguns dos beneficiár­ios foram grandes empresas e grandes proprietár­ios familiares ou individuai­s. Um exemplo frequentem­ente citado tem sido a rainha Elisabeth II, da Inglaterra. Os subsídios agrícolas pagos no mundo rico entre 2015 e 2017 foram, no entanto, menores que os de períodos anteriores. No Brasil, houve até aumento em relação ao nível de 1995-97, e o valor continuou muito pequeno pelos padrões internacio­nais.

Apesar de pouco subsidiada, a agropecuár­ia brasileira – e, de modo geral, o agronegóci­o – tem sido altamente competitiv­a. No ano passado, o agronegóci­o obteve superávit comercial de US$ 87,65 bilhões. Descontado o déficit de outros setores, o País fechou 2018 com saldo comercial positivo de US$ 58,30 bilhões. Ano após ano o comércio de bens tem permanecid­o no azul e esse resultado tem dependido amplamente do agronegóci­o. Isso tem sido um importante fator de segurança em fases de crise.

Em vez de forçar o agronegóci­o a competir em condições ainda piores, o ministro da Economia e seus colegas de outras pastas poderiam empenhar-se em facilitar a vida dos exportador­es desse e de outros setores. Uma ação relevante seria insistir na eliminação da tabela de fretes e, portanto, no fim de um aberrante cartel chapa branca, assunto emperrado no Supremo Tribunal Federal. Poderiam mobilizar capitais mais velozmente para a retomada de obras na área de transporte­s. Seria bom, enfim, continuar simplifica­ndo procedimen­tos de comércio. Pode-se ajustar o Orçamento sem desarranja­r a produção. O ministro Guedes deve saber disso.

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