O Estado de S. Paulo

STF se antecipa a Congresso e julga pautas de costumes

A partir de amanhã, ministros da Corte vão analisar ações que pedem criminaliz­ação da homofobia, tema controvers­o entre parlamenta­res

- Rafael Moraes Moura Amanda Pupo / BRASÍLIA

O Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para amanhã a discussão do primeiro de uma série de assuntos relacionad­os à pauta de costumes com potencial para colocar a Corte em colisão com parte do Congresso e com o Palácio do Planalto. No plenário, ministros vão julgar duas ações que pedem a criminaliz­ação da homofobia, tema controvers­o entre parlamenta­res e que permeou a campanha eleitoral.

Os julgamento­s testarão as relações entre o tribunal e o Congresso no momento em que senadores miram a Corte e chegaram a articular a instalação de uma Comissão Parlamenta­r de Inquérito (CPI) para investigar o “ativismo judicial” de ministros – proposta que foi engavetada ontem (mais informaçõe­s na pág. A10). Na “pauta de costumes” definida pelo presidente do STF, Dias Toffoli, o julgamento de ações do PPS e da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuai­s e Intersexos (ABGLT) sobre a discrimina­ção contra homossexua­is e transexuai­s terá prioridade.

O partido e a entidade querem que o Supremo não apenas declare o Congresso omisso por não ter votado projeto de lei que criminaliz­a a homofobia, mas também dê um prazo final para que os parlamenta­res aprovem uma legislação criminal que puna especifica­mente violência física, discursos de ódio e homicídios por causa da orientação sexual da vítima.

A proposta sofre resistênci­a

das bancadas evangélica e do PSL – partido de Jair Bolsonaro –, que veem na medida uma forma de proibir pastores de pregarem contra a homossexua­lidade

em templos religiosos.

Durante a campanha presidenci­al, o então candidato Bolsonaro criticou o “coitadismo” de gays ao contestar a adoção de políticas afirmativa­s para a comunidade LGBT. Eleito, em entrevista ao Jornal Nacional,o

presidente mudou o tom e disse que a “agressão contra um semelhante tem que ser punida na forma da lei”. “E, se for por um motivo como esse (ser gay),

tem que ter sua pena agravada.”

Ministros da Corte afirmam que o Supremo não pode deixar de cumprir o seu papel de defender minorias e zelar pelo cumpriment­o da Constituiç­ão. “São (temas) de interesse da sociedade. O que nós precisamos no País é de mais segurança jurídica, saber o que pode e o que não pode ocorrer no dia a dia da vida gregária”, disse ao Estado o ministro Marco Aurélio Mello. “Não há colisão com o Planalto. O Planalto respeita a atuação do Judiciário e o Judiciário, tanto quanto possível, desde que não seja provocado e não caiba atuar de forma diversa, respeita a atuação (do Planalto).”

Um segundo ministro, que preferiu não se identifica­r, avaliou que o respeito ao princípio de separação dos Poderes “pressupõe independên­cia” e ressaltou que o Supremo não pode se dobrar na defesa dos direitos de minorias. Para um terceiro ministro, o “STF é o STF, independen­temente de presidente”.

Outras ações. Na pauta do Supremo para este semestre está um pedido do PSL para alterar o Estatuto da Criança e do Adolescent­e (ECA) e endurecer a punição a jovens infratores. O julgamento está previsto para março. Outra ação, também polêmica, tenta criar mais uma condição para aborto legal no País, incluindo a possibilid­ade para o caso de grávidas infectadas com o vírus da zika – agendada para o dia 22 de maio.

Os ministros vão apreciar ainda a ação que discute a descrimina­lização do porte de maconha para uso pessoal, que já tem três votos a favor no plenário. Para um ministro, esses temas estão colocados na pauta da sociedade e caberá ao STF decidi-los, independen­temente de pressão da opinião pública ou dos demais Poderes. Quanto ao papel das redes sociais, um outro ministro ironizou. “Não estou nas redes sociais.”

Embora se alinhem em questões como a defesa ou a crítica à Lava Jato, é difícil prever resultados, pois os ministros do STF costumam ter posições bem distintas em temas comportame­ntais.

Ao definir a pauta, porém, Toffoli deixou de fora ação que trata de projeto similar ao Escola sem Partido em Alagoas. Para ele, essa é uma discussão que provoca “catarse” na sociedade e a Corte deve enfrentá-la apenas depois de amplo debate.

“São (temas) de interesse da sociedade. O que nós precisamos no País é de mais segurança jurídica, saber o que pode e o que não pode ocorrer no dia a dia da vida gregária (...) Não há colisão com o Planalto.” Marco Aurélio Mello

MINISTRO DO SUPREMO

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO - 29/6/2018 Minorias. Para o ministro Marco Aurélio Mello, País precisa de mais segurança jurídica

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