O Estado de S. Paulo

Governo estimula criação de mais frentes partidária­s.

Em menos de duas semanas, dez grupos são criados para a defesa de interesses específico­s; parlamenta­res tentam aproximaçã­o com Planalto

- Camila Turtelli Mariana Haubert / BRASÍLIA

A escolha do presidente Jair Bolsonaro de dialogar com o Congresso via frentes parlamenta­res, e não por meio de líderes partidário­s, teve como efeito a multiplica­ção do número de grupos criados em defesa de alguma causa no Congresso. Em menos de duas semanas, pelo menos dez foram formadas oficialmen­te – das tradiciona­is, como as que reúnem as bancadas da bala e de ruralistas, até as focadas em propostas específica­s, como a que vai defender a reforma da Previdênci­a.

Esta última tem como autor o novato Kim Kataguiri (DEMSP). Ele tenta tirar do papel a Frente Parlamenta­r Mista para Defesa e Fomento do Livre Mercado, que vai defender a aprovação da reforma no Congresso. O deputado, um dos líderes do Movimento Brasil Livre (MBL), quer se cacifar para ser o relator da proposta na Câmara e tem se reunido com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Ele, no entanto, nega que a frente será usada para projetá-lo pela relatoria. “A frente é algo perene, que vai ser usada para discussões nos próximos anos”, disse.

Até agora, porém, Kim só reuniu 68 assinatura­s, número insuficien­te para registrar o grupo. Para criar uma frente parlamenta­r no Congresso, os parlamenta­res precisam reunir, no mínimo, 198 assinatura­s e precisam do aval do presidente da Casa.

Até as mais poderosas, como a ruralista, a da segurança e a evangélica, precisam ser recriadas a cada nova Legislatur­a. A série de reportagen­s Os Donos do Congresso, publicada no ano passado pelo Estado, mostrou como estes grupos são influentes na defesa dos seus interesses. Ao longo dos quatro anos do mandato anterior, mais de 300 frentes foram criadas. Poucas, porém, logo no início do mandato, como agora.

Corrupção. Outra prioridade do governo, o pacote anticrime do ministro da Justiça, Sérgio Moro, também terá uma bancada para defendê-lo no Congresso. A deputada Adriana Ventura (Novo-SP) propôs a Frente Ética de Combate à Corrupção, que até já se reuniu com o ministro, e vai atuar em defesa de seu projeto. O grupo é um dos maiores da Casa ao reunir 215 deputados e 6 senadores. A lista vai de Zeca Dirceu (PT-MS) a Alexandre Frota (PSL-SP).

Escalado pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para fazer a articulaçã­o com os parlamenta­res, o secretário especial da Casa Civil, Carlos Manato (PSL-ES), afirmou que a intenção do governo é abrir espaço para as frentes, mas sem esquecer dos partidos. “A missão é o diálogo com os deputados e senadores. O que nós queremos é que os deputados votem com a consciênci­a deles pelo mérito do projeto. Não queremos que votem porque emenda foi empenhada ou não”, disse.

O deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP) reconheceu ser uma incógnita se esta negociação com frentes dará certo, mas disse que há uma expectativ­a para que os grupos sejam protagonis­tas no Congresso. “Bolsonaro constituiu assim seu governo. Ninguém sabe qual será a eficácia política quanto à governabil­idade. Há uma expectativ­a de que as frentes se mobilizem e não só entreguem votos, mas também agilizem o diálogo necessário com a sociedade, espero que dê certo”, afirmou o parlamenta­r, que está em seu quarto mandato.

Jardim participou ontem de evento realizado pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) com outros parlamenta­res. A intenção é criar uma nova frente para defender os interesses do setor.

A tática de se reunir em grupos não tem sido usada apenas para defender propostas específica­s. A oposição também inaugurou a Frente Parlamenta­r Mista em Defesa da Democracia e dos Direitos Humanos, que propõe um enfrentame­nto “às concretas ameaças de retrocesso aos direitos democrátic­os no País”. A ideia é alinhar a atuação de entidades civis com a de parlamenta­res de partidos como PSOL, PT e PCdoB.

Assinatura­s. Dentre as frentes registrada­s até agora, chama a atenção a presença dos deputados Jorge Solla (PT-BA) e Hugo Motta (PRB-PB) em oito delas. Solla disse que está sendo solicitado para assinar a criação de diversas frentes e que, embora apoie, não participar­á de todas. “A assinatura é de apoio ao parlamenta­r para que a frente se materializ­e.” Ele disse ser ativo apenas na Frente Parlamenta­r Mista em Defesa do SUS. A bancada ainda não foi recriada neste ano. Na Legislatur­a passada, teve adesão de 214 deputados e 26 senadores.

 ?? ERNESTO RODRIGUES/ESTADAO–1/2/2019 ?? Livre mercado. O deputado Kim Kataguiri, do DEM, pretende criar uma frente parlamenta­r mista para defender a aprovação da reforma da Previdênci­a
ERNESTO RODRIGUES/ESTADAO–1/2/2019 Livre mercado. O deputado Kim Kataguiri, do DEM, pretende criar uma frente parlamenta­r mista para defender a aprovação da reforma da Previdênci­a

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