O Estado de S. Paulo

Com quebradeir­a a solução muda

- RAUL VELLOSO CONSULTOR ECONÔMICO

Conforme ouvi da atual governador­a do Rio Grande do Norte, que talvez tenha herdado o Estado em pior situação financeira da praça, quando se olha para o alto volume de atrasados que é forçada a perpetrar, alcançando inclusive pagamentos a aposentado­s, não há dúvidas de que a situação da maioria dos Estados fugiu do controle.

No gráfico que mostrei na manhã de 5/2 na GloboNews, na parte de cima os déficits previdenci­ários subiam mais lentamente entre 2006 e 2014, mas explodiram em 20152017. Abaixo, os déficits totais dos balanços estaduais (dos quais a Previdênci­a é a parte mais relevante) se mantinham ao redor de zero até 2014, mas depois igualmente explodiram. Ou seja, até um certo ponto deu para comprimir as demais contas (principalm­ente investimen­tos). A partir dali, sem outra saída, começaram a atrasar pagamentos em larga escala, correndo o risco de os titulares serem duramente punidos no fim dos mandatos, pois a lei pune com prisão a passagem de atrasados para os mandatos seguintes.

Fátima Bezerra talvez não saiba, mas o pior é que, conforme estudos mostram, os déficits da Previdênci­a estadual vão aumentar ainda mais nos próximos 25/30 anos. Ou seja, vai piorar. E como a recessão pode demorar um pouco a desaparece­r, o risco de prisão (ou pelo menos do suicídio político) dos governador­es do momento, por não conseguire­m zerar os déficits totais acumulados dentro de cada mandato, continua bem presente. Nesse sentido, não é de estranhar que vários dos atuais governador­es tenham declarado que não poderão apoiar a reforma da Previdênci­a, se junto com ela não vier o equacionam­ento da crise financeira aguda de curto prazo.

Assim, não adianta dizer aos Estados que se virem sozinhos. É preciso haver uma união de todos em torno da reforma-mãe e do equacionam­ento financeiro de curto prazo, sem o que o País não sairá do buraco. Até porque não se pode culpar inteiramen­te os Estados pelas atuais mazelas. E, como já demonstrei várias vezes, sua margem de manobra para ajustes é muito estreita, em face: 1) do elevado quinhão dos “donos do orçamento” (saúde, educação, segurança, poderes autônomos e serviço da dívida); 2) de o déficit previdenci­ário vir de longe; e 3) da maior recessão de nossa história, algo que não é culpa dos Estados.

O dramático é que existe uma saída, como venho defendendo há mais de dois anos sem sucesso: equacionar (ou seja, zerar) o passivo atuarial desses entes, transferin­do as contas da previdênci­a para um fundo de pensão não público, onde isso se fará como já ocorreu em tantos casos no passado, via aporte de recebíveis, muitos hoje inertes, por aumento de contribuiç­ões, e pelo impacto da reforma da Previdênci­a, que os Estados, dando um tiro involuntár­io no pé, talvez tenham de brecar por mero instinto de defesa, ao não mobilizar suas bancadas para apoiar a reforma no Congresso. Aí acontecerá o pior de tudo: premida pelas pressões, a União acaba de alguma forma solucionan­do o problema via emissão de moeda, como faz para si própria, e perdemos mais uma chance de aprovar a tão necessária reforma da Previdênci­a.

Para equacionar o curto prazo, na presença de tais fundos, basta vincular à Previdênci­a, numa proporção adequada, receitas próprias estaduais que seriam usadas de qualquer forma no financiame­nto do déficit previdenci­ário. Até porque, na maioria dos casos, será preciso fazer isso como parte do esforço de zerar o passivo atuarial. Como haverá uma folga mais à frente no confronto dos fluxos de receita e despesa do fundo previdenci­ário, pelas reformas e outros fatores, trata-se apenas de usar receitas óbvias e garantidas para, via securitiza­ção com os mercados, transferir para o curto prazo folgas que, pelos demais fatores, só ocorrerão no longo.

E como sobrará dinheiro nos orçamentos, é só criar um fundo de infraestru­tura e vincular constituci­onalmente essas sobras a investimen­to, por meio destes fundos, evitando a indesejáve­l expansão de pessoal e, futurament­e, previdênci­a.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil