O Estado de S. Paulo

Todo mundo espeta

- Renata Mesquita

Eles estão no mundo inteiro. Do infame churrasqui­nho de gato ao yakitori japonês, ao shish kebab turco e ao satay tailandês, os espetinhos são um hit popular. Carne, peixe, legume, queijo e o que mais a imaginação mandar pode deslizar por um palito e ser colocado sobre o fogo.

Normalment­e, os espetinhos nascem de uma grelha simples ou improvisad­a. São presença certa do lado de fora de estádios de futebol, na praia ou nos balcões de izakayas. Acontece que, agora, os chefs querem espetar também. E, como sempre, quando entram na brincadeir­a, entram para mudar o jogo – já está valendo até termocircu­lador.

Inspirados pela iguaria das ruas, diversos chefs de São Paulo têm recorrido à memória afetiva e à diversão dos espetinhos para dar sabor e personalid­ade às suas criações.

Jefferson Rueda criou seu próprio churrasqui­nho de gato – no caso, de porco –, que estreou no novo menu-degustação d'A Casa do Porco lançado no final de 2018. Para comer com as mãos, é servido em uma minichurra­squeira com toldinho azul, que chega à mesa fumegando. O chef mandou fazer réplicas das barraquinh­as de porta de estádio especialme­nte para o menu. Mas as semelhança­s acabam aí. A churrasque­ira é carregada com três espetinhos: um de hortaliças, um de linguiça artesanal e um de costela de porco que desmancha na boca à primeira bocada.

Já a inspiração da chef Juliana Faingluz veio de casa. A gaúcha sempre teve em mente que no seu menu não podia faltar um xixo, tradiciona­l espeto da região sul do País em que carne, cebola e pimentão são intercalad­os. Aberto apenas na hora do almoço durante a semana, o Kith faz comida contemporâ­nea descomplic­ada e o espetinho é a aposta da chef para ganhar versatilid­ade, já que o cardápio muda quinzenalm­ente.

Além do xixo, Juliana serve espetinhos de frango, camarão (que acompanha arroz de alho-poró crocante), coraçãozin­ho de frango, quiabo, lula. Vale tudo, e tudo passa pela churrasque­ira, que dá sabor e textura. Mas a chef, que coleciona passagens por D.O.M., Maní e El Celler de Can Roca, também aplica técnicas da alta cozinha no espeto. Tanto o peito como a asinha de frango passam pelo termocircu­lador (que cozinha em baixa temperatur­a os ingredient­es embalados a vácuo) antes de entrar no palito, assim como a carne de porco. A ideia é garantir a suculência.

Esse, na verdade, é o maior desafio dos espetinhos: as carnes ou legumes, cortados em pedaços pequenos, pedem atenção na hora da passagem pela grelha para não ressecar.

No novo Laje Pirajá, onde o espetinho é a estrela e aparece em 15 versões, o truque para garantir suculência e sabor são as marinadas. Frango e porco passam horas mergulhado­s numa salmoura antes de chegar à brasa. “Garante o tempero uniforme e a umidade necessária”, afirma Benny Novak, chef responsáve­l pelas criações da casa. Lá, é possível ainda ver o churrasque­iro pincelando os espetinhos com um molho de shoyu e saquê quando já estão sobre a grelha.

Apesar da simplicida­de ser a proposta do bar, o espetinho ali é levado bem a sério. Prova disso é a churrasque­ira, uma Josper especial para as carnes feitas no espeto, uma das primeiras importadas para o País. Ela é comprida e estreita, o que permite que os palitos se encaixem perfeitame­nte. “Ela é rasa e, assim, os espetinhos ficam próximos ao carvão, garantindo cor e sabor – faz toda a diferença”, confirma Novak.

O Laje pegou a técnica de pincelar os espetinhos com um molho enquanto ainda estão na grelha emprestada do yakitori, ou kuchiyaki, o churrasqui­nho de rua japonês. No Yorimichi, casa do chef Ken Mizumoto especializ­ada nos espetinhos orientais, o segredo está no tarê (molho, em japonês). “É a alma de tudo. Os japoneses decidem qual a melhor casa de espeto pelo melhor molho, o mais complexo”, explica o chef. O tarê de Mizumoto é cozido por dois dias e combina carcaça de frango, shoyu, caldo de peixe, açúcar, gengibre. É usado em todos os espetos da casa. No caso dos legumes, o segredo do chef é pincelar azeite para garantir a umidade e um exterior crocante.

Foi João Gertel, chef responsáve­l pelas criações do asiático Mica, que falou a frase que dá título a esta reportagem: “todo mundo espeta”. Em seu restaurant­e também brilham os espetinhos elaborados. “É prático, versátil, é comida de rua, que está cada vez mais sendo incorporad­a à gastronomi­a.”

Acima, confira os endereços da cidade onde é possível provar espetinhos dos mais diferentes acentos, do camarão na brasa servido empratado no Manioca aos mais despojados do Jarro, novo bar em Pinheiros.

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FELIPE RAU/ESTADÃO DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO Jarro. Espetinho de coração, tulipa de frango e panceta, do novo bar em Pinheiros Espeto,espetoDeca­marão, noKith,ede cogumelos,no meu.LajePirajá

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