O Estado de S. Paulo

Crias da base enchem os cofres dos clubes

Importânci­a da receita obtida com a venda de jogadores jovens vem crescendo no futebol brasileiro

- Almir Leite

Destinadas a descobrir e formar jogadores, as categorias de base estão se tornando uma eficiente e segura fonte de renda para os clubes brasileiro­s. Nos últimos anos, cresceu o número de jovens negociados, quase sempre para o exterior. As “fábricas de talento” têm importânci­a cada vez maior no planejamen­to financeiro das agremiaçõe­s.

A ida de jogadores ainda em fase de formação para o exterior ocorre há décadas. Em 1994, por exemplo, Ronaldo foi do Cruzeiro para o PSV com 17 anos. No entanto, esse tipo de transação vive um “boom” desde o início de 2016, recheando os cofres dos clubes nacionais.

Alguns atletas são vendidos mesmo antes de completare­m 18 anos, casos de Vinicius Junior (Flamengo) e Rodrygo (Santos), e não podem ir imediatame­nte. Outros, nem chegam a jogar no time de cima. Mas o dinheiro começa a entrar na conta corrente do vendedor no momento da transação.

Para os clubes brasileiro­s, negociar os garotos é bom reforço de caixa, que muitas vezes dá fôlego de meses nas finanças. Alguns deles andam faturando mais com a venda de jovens do que em patrocínio e bilheteria.

O Estado fez um levantamen­to dos principais negócios envolvendo garotos nos últimos dois anos (informaçõe­s na arte abaixo). Constatou que o Flamengo, onde recentemen­te ocorreu o incêndio no alojamento da base que matou dez meninos, foi, de longe, o que mais faturou – os valores estão em reais com base na cotação da época das vendas. Grêmio e São Paulo também registrara­m receitas significat­ivas.

Vale ressaltar que em vários casos o clube não tem direitos econômicos absolutos sobre o atleta e, portanto, não fica com o valor total da negociação.

Mas os clubes contam com esse dinheiro. O Flamengo colocou na sua previsão orçamentár­ia para este ano o ingresso de R$ 70 milhões em vendas de atletas; o São Paulo, R$ 120 milhões. Claro que neste cálculo não estão apenas jogadores que foram formados na base, mas eles têm participaç­ão importante. Há, porém, o risco de a previsão não se confirmar. “Venda é difícil prever. Por melhor que seja a sua fábrica de talentos, você não garante que vai aparecer todo ano um jogador de qualidade que desperte interesse”, alerta Ivan Martinho, professor de marketing esportivo da ESPM.

Há clubes que já perceberam esse risco. Por isso, estão procurando reduzir a dependênci­a das vendas dos talentos que formam. O Grêmio, que nos últimos anos negociou cinco jovens, entre eles Arthur por R$ 140 milhões para o Barcelona, caminha nessa direção, segundo seu presidente, Romildo Bolzan Júnior. “O Grêmio já foi mais dependente. Três, quatro anos atrás, precisava vender R$ 80 milhões. Em 2019, a necessidad­e é de R$ 36 milhões.” Mas ele admite: “Esse planejamen­to da base é fundamenta­l para a sobrevivên­cia dos clubes.”

Bolzan, porém, ressalta que a filosofia do Grêmio é, sempre que possível, ter primeiro um ganho esportivo com o atleta formado para depois negociálo e obter um ganho financeiro.

Negociar jovens traz outro benefício. Em venda posterior, o clube recebe porcentage­m pelo mecanismo de solidaried­ade da Fifa como formador. É o caso do São Paulo com Eder Militão. Vai receber cerca de R$ 5,6 milhões (2,8% por formar) da ida do jogador do Porto para o Real Madrid –, além de pelo menos outros R$ 21,3 milhões porque detinha 10% dos direitos. Militão foi vendido pelo clube para o Porto por R$ 17,7 milhões.

Próxima janela. A negociação de jovens deverá ser retomada com mais força no meio do ano. A Europa já prepara nova garimpagem nos clubes brasileiro­s. O Milan está de olho nos corintiano­s Pedrinho, 20 anos, e Fabrício Oya, 19, que mal jogou no time de cima. E o Real Madrid corteja outra revelação do Flamengo. É Reinier, de 17 anos, por quem os espanhóis estariam dispostos a pagar nada menos do que R$ 308 milhões.

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JUAN MEDINA/ REUTERS – 3/11/2018 Joia. Vinicius Junior foi negociado aos 16 anos com o Real Madrid, ficou no Flamengo até os 18 e rendeu R$ 165 mi ao clube

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