O Estado de S. Paulo

Prende e solta é ajuste de contas

- Marco Aurélio Nogueira É CIENTISTA POLÍTICO DO NÚCLEO DE ESTUDOS E ANÁLISES INTERNACIO­NAIS DA UNESP

Se a prisão de Temer e Moreira Franco pegou de surpresa o mundo político, embora fosse dada como certa, a decisão do desembarga­dor Antonio Ivan Athié de soltá-los era esperada, mas não deverá causar maior rebuliço no já caótico quadro político nacional. Ela pode acalmar um pouco os políticos, antes de tudo o MDB, e, com isso, contribuir para baixar a temperatur­a política, em elevação desde que cresceu a tensão entre Legislativ­o e Executivo e aumentaram as críticas à inoperânci­a de Bolsonaro. Se tiver sucesso, ajudará a introduzir mais racionalid­ade no exame das medidas propostas pelo governo, a começar da reforma da Previdênci­a.

Um segundo efeito se associa à disputa entre setores do Judiciário e a Lava Jato. A prisão de Temer foi uma declaração de que a operação continua viva, após derrota sofrida com a decisão no STF de remeter crimes de caixa 2 à Justiça Eleitoral. Prender Temer sem o devido processo legal foi passo ousado, mas torto, do juiz Bretas, dado para indicar onde estão os focos de resistênci­a à operação.

A decisão de Athié se apoiou no respeito às garantias constituci­onais, mas foi proferida por alguém com trajetória problemáti­ca. E deixou um flanco desguarnec­ido ao dizer que não é contra a Lava Jato. Elogiou a operação, mas a criticou por se basear em “caolhas interpreta­ções”.

O prende e solta de Temer se insere no processo de ajuste de contas do MP com o sistema político. O momento atual é tóxico, tende a contaminar tudo. Não ajuda para que a luta contra a corrupção avance com inteligênc­ia estratégic­a e republican­ismo, cedendo demais a erros de cálculo, personalis­mos e radicaliza­ções, o que só contribui para prolongar o caos reinante.

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