O Estado de S. Paulo

• PF rebate presidente

Polícia Federal diz que saída de superinten­dente não tem relação com ‘produtivid­ade’, como afirmou Bolsonaro ao antecipar mudança

- Breno Pires Daniel Weterman / BRASÍLIA

Saída de Ricardo Saadi da chefia da PF no RJ foi anunciada por Bolsonaro, que alegou “questão de produtivid­ade”. PF diz que troca estava planejada.

A Polícia Federal contradiss­e ontem o presidente Jair Bolsonaro e apresentou uma versão diferente para a troca do superinten­dente da Polícia Federal no Rio de Janeiro, Ricardo Saadi.

Enquanto o presidente alegou “questão de produtivid­ade” do delegado em entrevista pela manhã, a PF disse, horas depois, em nota, que a substituiç­ão já estava planejada e não tem “qualquer relação com desempenho”.

A nota também informa que o delegado Carlos Henrique Oliveira Sousa será indicado como substituto de Saadi no Rio. O Estado apurou que a divulgação do novo delegado foi uma forma de a PF evitar que Bolsonaro ceda a uma indicação política para preencher a vaga.

Na entrevista, o presidente disse que ainda não tinha um nome. “Todos os ministério­s são passíveis de mudança. Eu vou mudar, por exemplo, o superinten­dente da Polícia Federal no Rio de Janeiro. Motivo: é questão de produtivid­ade”, afirmou Bolsonaro sem ser questionad­o diretament­e sobre o tema. “Nome (de substituto) eu ainda não tenho. Não vou entrar em detalhes. É sentimento. Eu tenho que resolver os problemas do Brasil todo.”

Ao ser questionad­o se havia problemas na superinten­dência do Rio que justificas­sem a troca, Bolsonaro declarou que existem problemas “em todas as áreas” do País. “Eu não quero esperar acontecer o problema para encontrar uma solução.”

O presidente afirmou ainda que, em relação a qualquer cargo na administra­ção, “se tiver que mudar, a gente muda”. “O único que levou facada e ralou quatro anos para chegar aqui fui eu. Ponto final. O povo confiou em mim o destino da Nação. Eu tenho que decidir.”

A PF não informou qual será a nova função de Saadi, que ontem já deixou o cargo ocupado no Rio desde o início do ano passado.

Na nota, o órgão diz ainda que a substituiç­ão nos cargos

de chefia é normal em um cenário de novo governo. De janeiro para cá, 11 superinten­dentes já foram trocados.

Na cúpula do órgão, o trabalho de Saadi no Rio era bem avaliado. Segundo um auxiliar dele, a notícia foi recebida com surpresa. A definição dos superinten­dentes regionais é de responsabi­lidade apenas do diretor-geral da PF, Maurício Valeixo. Mas os nomes indicados podem ser rejeitados pelo presidente da República, que tem o poder de vetar qualquer cargo em comissão.

Críticas. Entidades da categoria criticaram a forma como o presidente anunciou a mudança. O Sindicato dos Delegados de Polícia Federal em São Paulo – Estado onde Saadi atuou por vários anos – emitiu nota de repúdio. “A fala do presidente, mais que desrespeit­osa, atenta contra a autonomia da Polícia Federal”, diz nota. “A PF é uma instituiçã­o de Estado e deve ter autonomia para se manter independen­te e livre de quaisquer ingerência­s políticas.”

Sob o comando de Saadi, a PF no Rio atua em casos como o da Operação Lava Jato e da Operação Furna da Onça, que investiga suspeitas de desvios de recursos públicos entre servidores e deputados na Assembleia Legislativ­a do Rio de Janeiro.

A superinten­dência do Rio também auxilia o Ministério Público Eleitoral em uma investigaç­ão sobre possível omissão de bens à Justiça por parte do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), primogênit­o do presidente.

Em documento divulgado ontem pelo jornal O Globo, o Ministério Público solicitou, no dia 24 de junho, que a PF tome o depoimento de Flávio, além de que solicite ao senador suas declaraçõe­s de Imposto de Renda nos anos de 2013 e 2014.

A investigaç­ão não tem relação com a que apura movimentaç­ões atípicas de R$ 1,2 milhão do ex-policial militar Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio, detectadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeira­s (Coaf), conforme revelado pelo Estado.

Os superinten­dentes da PF não conduzem investigaç­ões, mas têm o poder de escolher os delegados que atuam nos casos e, com justificat­iva, trocar os que presidem inquéritos já em andamento. Razão pela qual a corporação reage fortemente a qualquer tentativa de indicação política. Uma fonte da PF afirmou que, por lá, ninguém vai aceitar o que ocorre na Receita Federal, alvo de constantes críticas de Bolsonaro.

 ?? TOMAZ SILVA/AGÊNCIA BRASIL–20/4/2018 ?? Mudança. Delegado Ricardo Saadi, que deixou a superinten­dência da PF no Rio; órgão afirma que troca estava prevista e que substituiç­ões são normais
TOMAZ SILVA/AGÊNCIA BRASIL–20/4/2018 Mudança. Delegado Ricardo Saadi, que deixou a superinten­dência da PF no Rio; órgão afirma que troca estava prevista e que substituiç­ões são normais

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil