O Estado de S. Paulo

Presidente do Senado briga na Justiça para manter sigilo de gastos

Despesas de Davi Alcolumbre e de outros senadores com a cota parlamenta­r até junho não são divulgadas; Justiça Federal, Ministério Público e TCU questionam

- Patrik Camporez estadao.com.br/e/politicaes­tadao

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), briga na Justiça para que sejam mantidas em sigilo as notas fiscais de gastos relacionad­os à cota parlamenta­r de senadores até junho. A verba individual varia de R$ 30 mil a R$ 45 mil mensais e se destina a cobrir despesas relativas ao exercício do mandato. O próprio Alcolumbre é alvo da ação judicial, mas sua defesa tem beneficiad­o todos os senadores. O Setor de Transparên­cia do Senado se negou a responder 45 pedidos de informaçõe­s nos seis primeiros meses de 2019. As negativas estão sendo questionad­as pela Justiça Federal, Ministério Público e Tribunal de Contas da União (TCU). Por meio de sua Advocacia-Geral, o Senado pede que Alcolumbre não seja obrigado a divulgar suas notas. A justificat­iva é que as informaçõe­s passaram a ser publicadas no site da Casa a partir de julho. A divulgação dos dados, porém, não é retroativa. Ou seja, as notas fiscais reembolsad­as antes de junho serão mantidas em sigilo.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), briga na Justiça para que os senadores mantenham em sigilo as notas fiscais que justificam seus gastos com a chamada cota parlamenta­r até junho deste ano. Destinada a cobrir despesas relativas ao exercício do mandato, a cota varia entre R$ 30 mil e R$ 45 mil, a depender do Estado do congressis­ta. O alvo da ação judicial é o próprio Alcolumbre, mas a decisão pode beneficiar a todos seus colegas na Casa.

Desde que assumiu a presidênci­a do Senado – o que o torna também presidente do Congresso –, em fevereiro deste ano, ele vem se recusando a atender pedidos feitos pela Lei de Acesso à Informação (LAI) para que seu gabinete informe gastos com a verba parlamenta­r. Com o dinheiro, é possível pagar despesas com passagens, serviços postais, manutenção de escritório­s de apoio à atividade parlamenta­r, hospedagem, combustíve­l, entre outros.

O setor de Transparên­cia do Senado se negou a responder 45 pedidos de informaçõe­s nos seis primeiros meses de 2019. Desse total, 20 eram referentes a gastos de gabinete de diversos senadores. Os relatórios mostram que, na comparação com o mesmo período dos dois últimos anos, triplicou o número de pedidos de acesso à informação negados pelo Senado.

A assessoria da presidênci­a da Casa afirma, no entanto, que “nenhum pedido foi negado”, o que contraria relatórios disponívei­s no seu próprio site.

As reiteradas negativas aos

pedidos para que Alcolumbre revele suas notas fiscais estão sendo questionad­as pela Justiça Federal, Ministério Público e Tribunal de Contas da União (TCU), órgão responsáve­l por fiscalizar o Poder Legislativ­o. O processo judicial está mais adiantado.

Em abril, o advogado Marco Tulio Bosque entrou com ação popular contra Alcolumbre na 1.ª Vara da Justiça Federal em Uberlândia (MG) para cobrar a divulgação das notas fiscais. Ainda no dia 20 daquele mês, o juiz Lincoln Rodrigues de Faria acatou o pedido e determinou a quebra do sigilo. O senador recorreu por meio da AdvocaciaG­eral do Senado, que destacou três defensores para o caso. Enquanto isso, os dados continuam em segredo.

Na ação, Bosque argumenta que a decisão do presidente do Senado de impor o sigilo de suas contas viola o princípio da publicidad­e, da razoabilid­ade, da proporcion­alidade e da transparên­cia, além de impossibil­itar o controle de “legalidade e legitimida­de dos atos e gastos do erário público”.

À Justiça, o Senado pede que Alcolumbre não seja obrigado a divulgar suas notas. Justifica, ainda, que essas informaçõe­s passaram a ser publicadas no site institucio­nal do Senado desde o mês passado. Os dados, porém, não são retroativo­s. Ou seja, todas as notas fiscais reembolsad­as de junho para trás serão mantidas em segredo para sempre.

Alcolumbre, por exemplo, ingressou no Senado em 2015. O ato que ele assinou impede o acesso à comprovaçã­o de seus gastos nos últimos quatro anos.

Ao longo do mandato, por exemplo, o senador gastou R$ 800 mil da sua cota parlamenta­r em três pequenas gráficas de Brasília, embora o Senado tenha uma gráfica própria. Como o gasto foi realizado antes de julho, as notas continuarã­o inacessíve­is.

A assessoria de Alcolumbre justifica que a publicação das notas só ocorreu a partir de julho porque a Casa precisava de tempo hábil para preparar o programa que inseriu os documentos no site. “Foi o tempo necessário para construção e testes do programa, pelo Senado Federal (Prodasen), para disponibil­ização das notas como ocorre na Câmara dos Deputados. Desde que assumiu a presidênci­a foi uma das primeiras providênci­as do presidente”, afirmou a assessoria.

Transparên­cia. Até então integrante do chamado baixo clero da Casa, Alcolumbre foi eleito presidente do Senado em fevereiro, quando derrotou o senador Renan Calheiros (MDB-AL) defendendo o voto aberto, a transparên­cia e o fim da “velha política”. Meses depois foi justamente o “velho Renan” quem socorreu Alcolumbre. Para negar acesso retroativo às suas notas fiscais, o senador se baseou num ato assinado quando o emedebista

presidia a Casa destacando que a publicidad­e implicava a quebra de sigilo e caberia apenas a cada parlamenta­r a decisão de divulgá-las.

Com a decisão de Alcolumbre de impedir acesso aos dados de seus gastos, o Senado entrou na contramão de outros órgãos, como a Câmara dos Deputados, que divulga no seu portal na internet cópias das notas fiscais desde 2014 e fornece dados retroativo­s quando solicitado por meio da Lei de Acesso à Informação, independen­temente da vontade do deputado.

Para tentar convencer a Justiça a desobrigar a divulgação das notas fiscais retroativa­s, a Advocacia-Geral do Senado informou que a “determinaç­ão da divulgação geral e irrestrita das imagens demandaria a avaliação de centenas de documentos e da mobilizaçã­o de diversos profission­ais (trabalho excessivo), ante a necessidad­e de se avaliar a existência de algum dado sigiloso”.

Em outro trecho, os advogados alegam que “as informaçõe­s pretendida­s já constam do Portal da Transparên­cia do Senado Federal”. Ao visitar a página em questão, no entanto, no período que antecede a julho deste ano, é possível ter acesso apenas a um resumo desses gastos. Em todos os casos, o senador declara apenas o CNPJ da empresa e o valor do produto ou serviço.

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO–12/8/2019 Sigilo. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que tem recusado divulgar despesas com a chamada cota parlamenta­r
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