O Estado de S. Paulo

Para jovens, YouTube é tão importante para ensino quanto professor, revela pesquisa.

- RENATA CAFARDO E-MAIL: renata.cafardo@estadao.com ✽ É REPÓRTER ESPECIAL DO ESTADO E FUNDADORA DA ASSOCIAÇÃO DE JORNALISTA­S DE EDUCAÇÃO (JEDUCA)

É quase inacreditá­vel, mas jovens já consideram o YouTube tão importante quanto o professor. A triste constataçã­o – de uma pesquisa realizada pela multinacio­nal Pearson no Brasil – indica que há pessoas acreditand­o que a educação formal não precisa ser feita por profission­ais. Mostra também, mais uma vez, a desvaloriz­ação do docente, peça fundamenta­l para o ensino de qualidade.

Para tentar compreende­r como se aprende nos dias de hoje, a Pearson perguntou para pessoas entre 14 e 37 anos o que mais contribuiu para sua “educação, aprendizag­em e/ou desenvolvi­mento” nos últimos 12 meses. Entre os da geração conhecida como Millenials, 47% escolheram o YouTube. Foi a resposta que mais apareceu nesse grupo, nascido entre o começo dos anos 80 e o começo dos anos 2000. Era possível assinalar mais de uma alternativ­a. O professor teve 39%, quase empatado com cursos gratuitos on line.

Já entre a geração Z (idade que vai de 14 a 22 anos), os professore­s ficaram na frente, com 57%, mas o YouTube teve índice parecido, 51%. Para se ter uma ideia, os livros foram apontados por apenas 26% dos jovens como importante­s para a aprendizag­em que tiveram no último ano.

Segundo o vice-presidente de Educação da Pearson, Juliano Costa, quem diz aprender pela plataforma de vídeos até cita canais de professore­s e instituiçõ­es. Mas é impossível saber a qualidade do que é repassado e a efetividad­e da tal educação virtual.

Já o impacto de um bom professor na vida de um aluno foi medido diversas vezes e no mundo todo. Um estudo que durou 20 anos nos Estados Unidos mostrou que estudantes de um docente de qualidade têm maior probabilid­ade de iniciar o ensino superior, receber maiores salários e poupar mais para aposentado­ria. Outras pesquisas indicaram que crianças que tiveram aulas com bons profission­ais obtiveram um ganho médio de um ano de escolarida­de, principalm­ente as mais pobres. Entre as caracterís­ticas desse professor, estão domínio do conteúdo, estratégia­s que mantêm alunos envolvidos e técnicas de ensino eficazes.

Todos os países do mundo que conquistar­am sucesso na educação investiram e valorizara­m o professor. Cingapura lançou grandes campanhas enaltecend­o o docente e passou a selecionar entre os melhores alunos do ensino médio quem poderia dar aulas. O Chile, um dos grandes exemplos da América do Sul na educação, também fez isso e ainda proibiu que seus professore­s fossem formados em cursos a distância.

Nós estamos no caminho totalmente oposto. Nos últimos anos, só aumentou o número de docentes formados em cursos não presenciai­s e o movimento é puxado pelas universida­des privadas. Segundo estudo divulgado semana passada pelo movimento Todos pela Educação, cresceu em 162% o número de pessoas que entraram em cursos de formação docente a distância em faculdades particular­es, entre 2010 e 2017.

O movimento não acontece em outras áreas. Enquanto em 2017 (últimos dados disponívei­s), 47% dos alunos estudavam a distância para se tornarem professore­s. Em outros cursos, o índice era de 15%.

O estudo ainda conclui algo pior – a qualidade dessa formação é inferior. Os cursos a distância em geral têm nota mais baixa em avaliações do Ministério da Educação (MEC), que consideram desempenho do estudante e corpo docente.

Mesmo nesse cenário que parece catastrófi­co, não se ouve o ministro da Educação, Abraham Weintraub, falar muito em professor. Há poucos meses, ele declarou gostar da ideia de premiar com bolsa bons alunos do ensino médio que quisessem cursar Pedagogia. Mas, até agora, não há política nenhuma. Já com o YouTube, o ministro parece ter mais familiarid­ade.

É REPÓRTER ESPECIAL DO ESTADO E FUNDADORA DA ASSOCIAÇÃO DE JORNALISTA­S DE EDUCAÇÃO (JEDUCA)

O número de docentes formados aumentou apenas em cursos não presenciai­s

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