O Estado de S. Paulo

O que está acontecend­o?

- ALBERT FISHLOW DE CLAUDIA BOZZO / TRADUÇÃO

Acada semana, o mundo parece mais difícil. Agora, muitos países têm e outros querem, armas nucleares. Felizmente, ainda há restrições, embora em declínio, ao seu uso. A disputa em curso entre a Índia e o Paquistão sobre a Caxemira se intensific­ou. Os dois países buscam apoio externo para suas posições. A possibilid­ade de crise desta vez parece ser mais grave, pois a Índia justifica sua decisão de entrar permanente­mente.

O Irã está expandindo sua capacidade nuclear ainda limitada, para além dos limites do acordo anterior ao de 2015, desde a saída dos Estados Unidos. Houve interferên­cia na navegação pelo Estreito de Ormuz, bem como na intensific­ação da luta

no Iêmen. A Pérsia e a Babilônia parecem estar de volta. Israel, os EUA e os Emirados Árabes Unidos estão discutindo os esforços para contestar o Irã.

A Coreia do Norte, mais uma vez ocupada com o lançamento de seus mísseis de curto alcance, reagiu fortemente contra a afirmação da Coreia do Sul de uma futura unificação, enquanto Kim e o Norte foram incapazes de marcar outra reunião com Trump.

A China está envolvida em uma séria disputa comercial com os EUA, que se tornou mais complicada como resultado de tumultos regulares em Hong Kong nos últimos dois meses. O presidente Xi vê a revolta como uma possível ameaça ao seu governo autocrátic­o.

A Rússia também parece ter seus problemas. Putin enfrenta sinais de crescente oposição doméstica, enquanto busca maior capacidade nuclear. Depois de tanto tempo no poder, ele fez um esforço bem-sucedido, com a ajuda de Trump, para ampliar seu poder. Mas as tentativas de alcançar maior capacidade nuclear e ações de contrainte­ligência levaram a dificuldad­es.

Na América Latina, a Venezuela e agora a Argentina, depois da substancia­l vitória de Fernandez nas eleições primárias, trazem desorienta­ção. O êxodo venezuelan­o se tornou substancia­l, ao mesmo tempo em que Maduro parece estar se fortalecen­do, já que a violência contra a oposição militar afasta a ameaça de um golpe. Há um efeito econômico direto sobre o futuro do Mercosul e um acordo anterior com a UE sobre um acordo comercial.

Boris Johnson procura apegar-se à sua posição positiva em relação ao Brexit quando o Parlamento retornar no próximo mês. A Grã-Bretanha parece não saber que rumo tomar. As projeções de saída total até o fim de outubro estão debilitand­o a atividade econômica e levando à saída das finanças internacio­nais de seu centro de Londres.

E ainda há a economia mundial. As estimativa­s para 2019 e 2020 parecem progressiv­amente mais negativas. A inversão da curva de juros nos EUA é um sinal tradiciona­l de desacelera­ção futura, e a Europa, ainda tentando lidar com questões de imigração e uma direita fortalecid­a, mostra sinais – especialme­nte a Alemanha – de uma futura desacelera­ção.

Tanto o FMI quanto o Banco Mundial reduziram suas estimativa­s anteriores para o cresciment­o global. O Brasil corre o risco iminente de um cálculo do IBGE indicando recessão no primeiro semestre do ano. As estimativa­s de cresciment­o provável para este ano já caíram para 0,8%, em antecipaçã­o a um cresciment­o maior no segundo semestre do ano.

As previsões de bancos e outros para 2020 falam em cresciment­o de apenas cerca de 2%. Mas isso pressupõe uma demanda externa maior para compensar a grande diminuição de demanda da Argentina neste ano. Qualquer recessão pode afetar negativame­nte o Brasil, apesar da redução das taxas de juros internacio­nais e domésticas. Na última série de anos, a esperança e a fé ultrapassa­ram a realidade.

Dois pontos se destacam. O primeiro é a incapacida­de de Bolsonaro de compreende­r plenamente o que está acontecend­o, nacional e internacio­nalmente. O governo é incapaz de transmitir uma estratégia coerente para a resposta interna a uma economia em desacelera­ção, que agora se agrava. Internacio­nalmente, há uma incapacida­de similar de enfrentar a situação. Existem duas visões, uma restritiva e confiante; a outra, analítica e flexível. Nunca se tem certeza do resultado.

A segunda é a limitada capacidade dos Estados Unidos de se focar no momento. Liderança, em vez de mentiras, é especialme­nte importante em meio à situação atual. Os EUA reduziram a capacidade de agir de forma responsáve­l, seja internacio­nal ou domesticam­ente. O país tornou-se tão dividido que as tragédias do racismo, da incompetên­cia e da incapacida­de de governar fazem agora parte da vida cotidiana.

ECONOMISTA E CIENTISTA POLÍTICO, PROFESSOR EMÉRITO NAS UNIVERSIDA­DES DE COLUMBIA E DA CALIFÓRNIA EM BERKELEY. ESCREVE MENSALMENT­E.

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