Racismo pode levar à eliminação da Bulgária
Uefa estuda forte punição por causa dos atos racistas de torcedores búlgaros contra jogadores negros da Inglaterra
REPROVAÇÃO
Os atos racistas de um grupo de torcedores búlgaros contra os ingleses Sterling e Mings durante a partida de anteontem entre as duas seleções pelas Eliminatórias da Eurocopa-2020 levaram à queda do presidente da Federação de Futebol da Bulgária, Borislav Mihailov. Ele renunciou ao cargo após ser pressionado pelo primeiro-ministro do país, Boyko Borissov. A Uefa também reagiu. O presidente da entidade, Aleksander Ceferin, pregou uma “guerra aos racistas”. A Bulgária pode ser eliminada da Euro.
O pedido de eliminação virá por parte da Fare Network, ONG que fará a investigação do caso em conjunto com a Uefa. Na entidade esportiva, há quem considere a retirada dos búlgaros da competição como uma punição que poderá ajudar a conter os racistas no futuro.
Ceferin se pronunciou após várias manifestações de repúdio feitas por dirigentes, associações e jogadores na Europa e da indignação da Associação de Futebol da Inglaterra (FA, na sigla em inglês), que pediu à Uefa uma ação “muito rigorosa” contra as atitudes racistas.
“Acredite em mim, a Uefa está comprometida a fazer tudo que puder para eliminar esta doença do futebol”, disse, por comunicado enviado à agência Associated Press. “Não podemos aceitar isso. Devemos sempre nos esforçar para fortalecer nossa determinação. De forma mais ampla, a família do futebol – dos dirigentes aos jogadores, treinadores e torcedores – precisa trabalhar com os governos e as ONGs para liderarmos uma guerra contra os racistas e marginalizarmos suas visões abomináveis na sociedade.”
Os episódios racistas aconteceram durante a goleada de 6 a 0 da Inglaterra sobre a Bulgária. O jogo foi interrompido por duas vezes no primeiro tempo, aos 28 e aos 43 minutos, por causa de cânticos racistas, imitações do som de macacos e saudações nazistas dos torcedores da equipe da casa que tinham por objetivo ofender os ingleses Sterling e Mings, ambos negros.
Durante a primeira paralisação, o locutor do Estádio Nacional Vasil Levski, em Sófia, advertiu que a partida poderia ser encerrada se os abusos racistas não parassem, cumprindo o primeiro passo do protocolo antirracismo da Uefa. Durante a segunda pausa, dezenas de torcedores responsáveis pelos cânticos saíram do estádio.
Punição exemplar. Ao fim da partida, o presidente da Associação de Futebol da Inglaterra, Greg Clarke, pediu punição à Federação de Futebol da Bulgária. Ontem, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, também repudiou as ofensas.
A atitude mais concreta, entretanto, veio do primeiro-ministro da Bulgária, Boyko Borissov. Ele pediu que o presidente da federação, Borislav Mihailov, renunciasse, e foi atendido logo depois. “É inaceitável que a Bulgária, um dos países mais tolerantes do mundo, onde pessoas de diferentes etnias vivem em paz, esteja associada a racismo e xenofobia”, condenou.
Mihailov, ex-jogador que atuou como goleiro (defendeu a Bulgária nas Copas do Mundo de 1986, 1994 e 1998), até tentou resistir. “É claro que ele não renunciará”, chegou a dizer o porta-voz da federação búlgara, Hristo Zapryanov. “O Estado não tem o direito de exigir isso e de interferir no futebol. A união de futebol não pode ser responsabilizada pelo hooliganismo de um grupo de pessoas.”
A pressão, porém, foi forte. Borissov anunciou o rompimento de relações com a federação enquanto Mihailov estivesse no comando. Disse que o governo não daria mais nenhum apoio ao futebol do país. O exgoleiro foi obrigado a rever sua posição. “A decisão (de Mihailov em renunciar) é resultado das tensões criadas nos últimos dias, que provocam danos ao futebol búlgaro e à federação”, justificou a federação, por nota.
A Uefa, por sua vez, deve aplicar punição severa aos búlgaros. Para Ceferin, porém, o problema do racismo vai além das fronteiras do futebol. “As federações de futebol não vão conseguir resolver sozinhas este problema. Os governos precisam fazer mais nesta área. Somente trabalhando juntos, em nome da decência e da honra, vamos conseguir fazer algum progresso”, declarou. Ele considera que o crescimento do nacionalismo no continente “vem dando combustível para este comportamento inaceitável”.
Investigação. Piara Powar, diretor da ONG Fare Network, que combate o racismo no futebol e que investigará o caso em parceira com a Uefa, condenou os cartolas búlgaros . “Acreditamos
que os eventos que ocorreram em Sófia devem resultar na eliminação da Bulgária na Euro. A escala dos problemas é evidente, a falha da federação búlgara em criar medidas que possam prevenir episódios como esse e a negação contínua do problema por parte de suas lideranças mostram que o futebol do país não merece estar competindo na elite da Europa”, disse.
O atacante Sterling, um dos atingidos pelos atos de intolerância, definiu como “idiotas’’ os torcedores racistas. “Sinto muito pela Bulgária ser representada por idiotas em seu estádio. De qualquer forma, 6 a 0 e vamos para casa, pelo menos fizemos nosso trabalho. Boa viagem para nossos torcedores, vocês foram bem”, postou no Twitter, horas depois do jogo.
Boyko Borissov
PRIMEIRO-MINISTRO DA BULGÁRIA
‘É inaceitável que a Bulgária, um dos países mais tolerantes do mundo, onde pessoas de diferentes etnias vivem em paz, esteja associada a racismo e xenofobia’