Teatro sensorial
Monique Gardenberg volta com ‘Os Sete Afluentes do Rio Ota’, peça que, em 5h50 de duração, une ópera, cinema, teatro Nô e dança
Foi como um reencontro de amigos que, curiosamente, não deixaram de se ver. Ao retomar a encenação de Os Sete Afluentes do Rio Ota, peça que estreia no dia 25 no Sesc Pinheiros ainda sob o eco do estrondoso sucesso de 15 anos atrás, a diretora Monique Gardenberg percebeu que o espetáculo continua atual. “A partir de reflexões sobre a 2.ª Guerra Mundial, o texto trata de ódio e totalitarismo, além de tocar em questões urgentes como emancipação da mulher e respeito à homossexualidade”, disse a encenadora, que permitiu ao Estado assistir ao ensaio do espetáculo na tarde da última quarta-feira.
Os Sete Afluentes do Rio Ota é um épico teatral – ao longo de 5h50 de duração (com intervalo), o espetáculo apresenta uma jornada iniciada no final da 2.ª Guerra, quando Luke, um soldado americano, retorna a Hiroshima, em 1945, para fazer algumas fotos dos sobreviventes. Tais imagens comporão um álbum que fará uma viagem no tempo, até chegar ao ano 2000, quando será um importante objeto durante uma trágica cena familiar.
A peça nasceu a partir de um espanto de seu criador, o canadense Robert Lepage, em sua primeira viagem àquela cidade japonesa: ele esperava encontrar muitos vestígios de destruição provocada pela bomba atômica lançada pelos americanos no dia 6 de agosto de 1945 e que vitimou entre 90 mil e 166 mil pessoas nos quatro primeiros meses após a detonação. Mas, em vez de se deparar com uma comunidade marcada pela dor, surpreendeu-se com um lugar marcado pelo renascimento.
Para dar conta desse momento de vitalidade da história humana, Lepage decidiu criar um espetáculo marcado pela produção colaborativa, ou seja, uniu diversos gêneros artísticos para montar uma saga que viajasse no tempo e no espaço. Assim, o espectador é brindado com uma narrativa que utiliza recursos dos teatros de sombra e nô, da dança, do canto lírico e do popular, além de imagens cinematográficas. Além disso, há uma profusão de idiomas, com os atores falando, além do português, em francês, alemão e japonês, o que necessita o uso de legendas em algumas cenas.
Lepage iniciou os ensaios em janeiro de 1994, no Canadá, e a peça só foi estrear mundialmente dois anos depois, em Nova York. O sucesso foi estrondoso. “Quando assisti, em 1996, tive a certeza de estar diante de uma experiência teatral sem precedentes”, conta Monique, em depoimento ao material de divulgação. “Pela primeira vez, o teatro transcendia o palco, suas limitações técnicas, para viajar no tempo, no espaço, e sublimar a autoridade da encenação teatral. Ao atravessar os últimos 50 anos do século 20, a peça nos revela, com toda poesia e delicadeza, nossa comovente insignificância, mas também nosso poder de resistência e reinvenção, diante dos descaminhos da humanidade ou das tragédias pessoais.”