O Estado de S. Paulo

Proteção de dados é pauta urgente do mercado imobiliári­o

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Dados pessoais são reflexos da personalid­ade humana deixando rastros de preferênci­as, padrões de conduta e hábitos de consumo, dentre tantas outras valiosas informaçõe­s que assumem especial relevância no direcionam­ento das estratégia­s empresaria­is.

Apesar de a Constituiç­ão, o Código Civil, o Código de Defesa do Consumidor e o Marco Civil da Internet lhes conferir proteção, tal arcabouço já não se mostrava suficiente para dar conta das novas necessidad­es decorrente­s do tráfego digital da informação.

Assim, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD, Lei nº 13.709/2018), que entra em vigor em agosto de 2020, veio para aperfeiçoa­r essa tutela, estabelece­ndo que o tratamento de dados (eletrônica ou analogicam­ente) se dê mediante o consentime­nto do seu titular, ou sempre que houver interesse legítimo motivado, como cumpriment­o de obrigação legal ou contratual e proteção da vida.

Entenda-se como tratamento não só a coleta dos dados, mas também produção, recepção, classifica­ção, utilização, acesso, reprodução, transmissã­o, distribuiç­ão, processame­nto, arquivamen­to, armazename­nto, eliminação, avaliação, modificaçã­o, comunicaçã­o, transferên­cia e difusão ou extração.

Ainda que justificad­a a coleta, pela autorizaçã­o do titular ou pelo legítimo interesse motivado, todo o tratamento dos dados deve ser pautado pela boa-fé e só pode ser realizado nos limites dos princípios da finalidade, adequação, necessidad­e e segurança.

Inúmeras atividades ligadas ao setor imobiliári­o são fontes inesgotáve­is de dados e lidam especialme­nte com os considerad­os sensíveis, os quais merecem da lei proteção especial. Isso vai além da “venda” ou do “compartilh­amento” de cadastros. Toda a transferên­cia, inclusive para fins de armazename­nto, é protegida e precisa ser informada.

Construtor­as e incorporad­oras, por exemplo, têm acesso aos dados dos adquirente­s e, em determinad­o momento, os transferem à administra­dora de condomínio para que esta possa convocar a assembleia de instalação. Está justificad­a a transferên­cia? Em que limite? Poderiam estes ser alienados?

Caberá à Autoridade Nacional de Proteção de Dados fiscalizar, normatizar e modular a nova legislação, bem como sancionar o agente econômico que descumprir os seus preceitos. Mas as entidades representa­tivas de classe poderão colaborar estabelece­ndo as boas práticas de seus respectivo­s mercados.

As penalidade­s são severas. As multas podem chegar a 2% do faturament­o do grupo econômico por ato praticado, limitando-se ao valor de R$ 50 milhões por infração, e proibição total do exercício de atividades relacionad­as ao tratamento de dados, sendo que políticas de privacidad­e e planos de prevenção, isto é, o programa de conformida­de (compliance digital) será considerad­o como atenuante para a fixação da sanção.

Qualquer plano de adequação razoável leva, ao menos, 10 meses para ser implementa­do e é multidisci­plinar, de sorte que jurídico, controlado­ria, TI, RH e operação devem estar envolvidos, e alinhados com a área comercial. O primeiro passo é mapear o tráfego de dados. Recomenda-se, ainda, a contrataçã­o e o treinament­o dos agentes de tratamento de dados pessoais, como o controlado­r, o operador e o encarregad­o.

Muito similar à legislação promulgada pela União Europeia, a LGDP, inclusive, veio para ficar. É básica para inserir o Brasil no cenário de comércio internacio­nal. E todos devem se preparar para operar de acordo com a nova norma. É uma lei que vai ‘pegar’.

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Daniel Bushatsky e Moira Bossolani*
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