O Estado de S. Paulo

Crescer com produtivid­ade é difícil, mas não impossível

José Roberto Mendonça de Barros

- •✽ JOSÉ ROBERTO MENDONÇA DE BARROS

Quanto mais passa o tempo, mais claro fica quão desastroso foi para o País o momento final do período PT/Dilma. Como faz todos os anos, quando da divulgação do PIB do terceiro semestre, o IBGE mostra as revisões finais dos dados de cresciment­o dos períodos anteriores. Assim, é possível ver que, de 2014 a 2018, o PIB total caiu, mesmo depois de cresciment­o em 2017 e 2018, mais de 4%; o da indústria, quase 10%; e o da construção civil, espantosos 28%! Apenas a agropecuár­ia cresceu 13%, mostrando que aí temos uma coisa diferente e muito positiva.

A queda abrupta da atividade gera todo tipo de dificuldad­es – financeira­s, técnicas, pessoais e operaciona­is –, dado que o sistema econômico não tem flexibilid­ade para encolher sem fricção.

Assim, o desastre vai além da produção e do emprego e se expressa também em grandes quedas da produtivid­ade. E aqui o espanto é enorme. Como mostraram Fernando Veloso e colegas (no Portal FGV), a produtivid­ade por hora trabalhada, entre 2013 e 2018, caiu 0,4% ao ano na média do País, 0,9% ao ano na indústria de transforma­ção, 2,9% ao ano na construção civil e 1,5% ao ano nos serviços.

Não sem surpresa, o único setor a continuar a ter uma evolução positiva foi a agropecuár­ia, no qual a produtivid­ade cresceu robustos 7,1% ao ano, ou 41% acumulado no período. A mudança tecnológic­a contínua e a abertura ao mercado internacio­nal explicam esse desempenho.

Parte da queda de produtivid­ade decorre da subutiliza­ção de capital e será recuperada quando o cresciment­o voltar. Mas parte dessa queda vem da realocação das ocupações: na busca pela sobrevivên­cia, muita gente caminha na direção da informalid­ade e de outros segmentos menos produtivos. É a expansão do comércio ambulante em tempos de comércio eletrônico.

A queda da produtivid­ade em outros serviços (-2,4% ao ano) e no setor de transporte­s (-2% ao ano) vem diretament­e desse processo de precarizaç­ão, que vai levar tempo para ser superado. Assim, o País tem dois problemas simultâneo­s: voltar a crescer de forma mais sustentada, ainda que pouco, e elevar gradualmen­te a velocidade da expansão via maior produtivid­ade de todos os fatores de produção, como faz a agropecuár­ia.

Tenho tratado do primeiro tópico em artigos aqui publicados. Tenho dito que podemos, sim, voltar a crescer, desde que se complete o ajuste fiscal com alguma ferramenta de controle do cresciment­o da folha de pagamento do setor público, que se eleve o investimen­to em infraestru­tura via concessões e capital privado e que continue a recriação de um mercado de crédito, a partir da inflação e juros baixos e maior competição no sistema financeiro.

Entretanto, a segunda questão é bem mais difícil, a começar do triste espetáculo da educação brasileira, atualmente comandada por um brincalhão. Essa precarieda­de está na base do pouco preparo da nossa gente para absorver as novas técnicas. Como implementa­r produção enxuta e indústria 4.0 quando boa parte das pessoas têm dificuldad­e de entender um texto ou de fazer operações matemática­s básicas?

Uma segunda dificuldad­e é enfrentar a grande heterogene­idade e distância entre empresas líderes e as outras. Explico-me: em quase todos os

Precarieda­de explica pouco preparo para lidar com novas tecnologia­s

setores da atividade econômica, é possível encontrar companhias líderes com boa estrutura de capital, boa gestão, boa governança e com perfeita noção da direção do seu setor no resto do mundo. Empresas que têm atravessad­o a crise exatamente como o agronegóci­o: crescendo e com bons resultados. Infelizmen­te, são poucas.

Entretanto, a média do desempenho dos setores é muito baixa, porque muita gente já havia ficado para trás, antes mesmo da recessão. Ao contrário do agronegóci­o, no geral, nossa indústria buscou conforto e agasalho do governo como forma de enfrentar a competição externa. O resultado foi um fiasco monumental, como mostram os dados mais recentes e tristes experiênci­as como estaleiros e refinarias como Comperj e Abreu e Lima.

Quando a crise chega com tudo, os balanços enfraquece­m e muita gente entra no modo sobrevivên­cia, esperando um quase milagre para seguir adiante. Nessas condições, é indispensá­vel reduzir a dispersão de comportame­ntos para poder acompanhar a retomada que já está acontecend­o em boa parte dos que estão na liderança.

Menciono aqui o êxito de programas de consultori­a comandados pelo Senai e chamados de Brasil Mais Produtivo e Indústria Mais Avançada, nos quais um grupo de médias e pequenas empresas foi capacitado e viu sua produtivid­ade se elevar substancia­lmente, inclusive com técnicas de indústria 4.0, num exemplo virtuoso de trabalho do sistema S.

Essa redução da distância em relação a líderes, se ampliada, permitiria que a retomada cíclica da atividade fosse reforçada, fazendo com que o impacto positivo das reformas, de algum avanço na infraestru­tura e de outras melhoras no ambiente de negócios possam elevar a taxa possível de cresciment­o sustentáve­l (PIB potencial) e de nossa competitiv­idade.

Difícil, mas não impossível.

ECONOMISTA E SÓCIO DA MB ASSOCIADOS

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TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO Educação.
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