O Estado de S. Paulo

Arte que resiste

Crise nos museus e falta de patrocínio não impediram que 2019 tivesse boas e populares mostras

- Antonio Gonçalves Filho

Nem todos os museus puderam festejar este ano, a exemplo do Masp, a quebra de um recorde de público. A crise atingiu particular­mente os museus do Rio – o MAR (Museu de Arte do Rio) deu aviso prévio a seus funcionári­os em novembro e o Museu do Amanhã não teve melhor sorte financeira. Em São Paulo, a situação foi diferente, consideran­do as exposições de peso montadas por museus e institutos, a começar pela mostra Tarsila Popular, no Museu de Arte de São Paulo, que recebeu 402 mil visitantes, de abril até o seu encerramen­to, em julho.

O mesmo Masp, que dedicou o ano às mulheres, realizou logo em seguida (de agosto a novembro) a melhor exposição do ano, Histórias das Mulheres: Artistas até 1900, que reuniu 60 grandes telas de pintoras não populares como Tarsila, mas de talento comparável, entre elas Eva Gonzalès (1849-1883), única aluna de Manet, autora da pintura (foto maior) que ilustra esta página. Na mesma exposição figuravam pintoras em atividade até o fim do século 19, da rebelde Artemisia Gentilesch­i (1593-1653) até a maior impression­ista americana, Mary Cassat (1844-1926).

O ano começou bem, em fevereiro, com a retrospect­iva dedicada ao pintor suíço Paul Klee (1879-1940), Equilíbrio Instável, no Centro Cultural Banco do Brasil, que reuniu pela primeira vez na América Latina mais de uma centena de obras do artista, selecionad­as pela curadora Fabienne Eggelhöffe­r, que teve a preocupaçã­o didática de agrupar trabalhos de vários períodos, reforçando o posterior à virada de 1916, quando Klee visitou a Tunísia e embarcou em sua viagem para a abstração.

Outro grande nome internacio­nal, o do alemão Harun Farocki (1944-2014), recebeu uma homenagem do Instituto Moreira Salles (IMS), que reuniu filmes e instalaçõe­s do artista, grande nome do cinema ativista dos anos 1960 que renovou a linguagem da videoarte.

A presença de artistas estrangeir­os em institutos e museus brasileiro­s, aliás, cresceu em 2019: o Instituto Tomie Ohtake organizou a primeira individual no País do artista pop japonês Takashi Murakami, que abriu este mês e vai até março do próximo ano. Uma parceria do CCBB com a Japan House trouxe ao Brasil a artista Chiharu Shiota, conhecida por seus trabalhos ‘site specific’ que usam um emaranhado de linhas.

A 36.ª edição do Panorama da Arte Brasileira do Museu de Arte Moderna de São Paulo, ao adotar o título Sertão, mostrou artistas que dividem a experiênci­a do território limítrofe que é também travessia, redefinind­o o conceito – o sertão como criação mental – e destacando tanto mineiras que moram no Crato

(Raquel Versieux) e em Paris (Ana Pi) como nordestino­s que adotaram São Paulo como local de trabalho.

O ano foi também de grandes retrospect­ivas, além da mostra de Tarsila. O Centro Cultural Fiesp exibiu obras pouco conhecidas do pintor cearense Leonilson na mostra Arquivo e Memórias Vivos. Leonilson foi um dos principais artistas surgidos nos anos 1980, época em que se destacou também Nuno Ramos, que retomou a pintura na mostra Sol a Pino, no Galpão da Fortes D’Aloia & Gabriel, também o local de uma exposição primorosa, a da jovem pintora Marina Rheingantz.

Esse interesse pela pintura trouxe de volta às galerias artistas já falecidos como Niobe Xandó (Simões de Assis), Flávio de Carvalho (Almeida e Dale), Antonio

Bandeira (MAM), Volpi (ao lado do escultor Bruno Giorgi, na Pinakothek­e) e Miguel Bakun (duas mostras, uma no Instituto Tomie Ohtake e outra na Simões de Assis). E reforçou a presença dos pintores jovens e em ascensão, como Felipe Góes (Galeria Kogan Amaro)

As artes gráficas foram igualmente contemplad­as com grandes exposições: na Pinacoteca do Estado destacaram-se duas delas, Gravura e Crítica Social ea mostra de Leon Ferrari. A galeria de Paulo Kuczynski promoveu uma retrospect­iva de gravuras (muitas delas inéditas) de Goeldi. Na Fundação Ema Klabin foi possível ver gravuras de Rembrandt nos 350 anos da morte do pintor holandês. A Galeria Estação prestou tributo à arte do pernambuca­no Samico (1928-2013). O Museu da Casa Brasileira fez uma bela homenagem ao designer Alexander Wollner (1928-2018).

Ainda sobre retrospect­ivas, a do escultor Franz Weissmann (1911-2005) no Itaú Cultural (em cartaz até 9 de fevereiro) revelou ao público seu processo de trabalho, reunindo esboços e maquetes de suas obras. Outro escultor, o inglês Tony Cragg, também ganhou uma grande retrospect­iva, que merece ser vista (até 1.º de março) no Museu Brasileiro de Escultura e Ecologia. E, entre as melhores do ano, destaca-se a do artista carioca Cildo Meireles (até 2 de fevereiro) no Sesc Pompeia. Entre as mostras de fotografia estão quatro gigantes: Claudia Andujar (IMS), Carlos Moreira (Porto Seguro), Sebastião Salgado (Sesc Paulista) e Fernando Lemos (Sesc Bom Retiro).

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Acima, a tela de Eva Gonzalès em mostra do Masp; ao centro, obra de Cildo no Sesc Pompeia; abaixo, peça de Franz Weissman no Itaú
Melhores. Acima, a tela de Eva Gonzalès em mostra do Masp; ao centro, obra de Cildo no Sesc Pompeia; abaixo, peça de Franz Weissman no Itaú
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DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO
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JF DIORIO/ESTADÃO

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