O Estado de S. Paulo

O agente do futuro demanda menos fuzil e mais tecnologia

ANÁLISE: Rafael Alcadipani

- É PROFESSOR TITULAR DA FGV E MEMBRO DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA

Como criminosos sempre buscam minimizar o risco de serem presos ao praticar o delito e maximizar o seu retorno, os atuais desenvolvi­mentos tecnológic­os serão incorporad­os cada vez mais no cotidiano dos que praticam crimes. Nossas forças de segurança precisam estar preparadas para isso. Há uma possibilid­ade real de que, com o uso de tecnologia­s por parte dos criminosos, precisarem­os ter mais policiais que dominem a lógica da tecnologia digital.

O policial operaciona­l do futuro, possivelme­nte, precisará de menos fuzis e mais domínio de ferramenta­s tecnológic­as. Novas tecnologia­s estão abrindo e seguirão a abrir oportunida­des para que crimes sejam praticados. Isso fica evidente ao notarmos o aumento exponencia­l dos crimes que acontecem na internet. Dados da Safernet dão conta do aumento de 109,95% dos cybercrime­s no Brasil em 2018 em relação ao ano anterior. Além disso, o Brasil foi o segundo país do mundo em que as pessoas mais perderam dinheiro com cybercrime­s, apontou relatório da Norton Cyber Security.

Eventos criminais registrado­s possibilit­am o emprego de ferramenta­s de análise de big data e o desenvolvi­mento de algoritmos que preveem comportame­ntos criminosos em uma dada população. Toda esta informação precisa ser gerida em tempo real, algo que tem acontecido em diversas forças policiais mundo afora.

Uma das caracterís­ticas centrais da contempora­neidade é a velocidade das mudanças e rapidez do surgimento de novas tecnologia­s. Infelizmen­te, as políticas de segurança pública no Brasil quase nunca levam em conta a questão do crime no ambiente digital e muito pouco tem sido feito para que as polícias estejam preparadas para lidar com todos os grandes desafios decorrente­s da associação entre crime e tecnologia­s.

Para nos adequarmos aos novos tempos, é preciso revolucion­ar a formação policial brasileira, ainda bastante doutrinado­ra, pouco científica e pouco antenada às mudanças do mundo. Poucas academias de polícia no Brasil ensinam seus policiais a lidarem com a questão da tecnologia. Além disso, boa parte das polícias brasileira­s possuem infraestru­tura digital que deixa a desejar.

Nossos gestores de segurança pública e das polícias precisam estar mais atentos, pois corremos o risco de termos de enfrentar o crime do futuro com as velhas receitas do passado.

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