O Estado de S. Paulo

Chefe de estatal do Rio afasta ameaça, mas se nega a beber água turva

Queixas sobre cheiro e cor da água fornecida começaram há 10 dias; cientistas da UFRJ veem risco para população

- Roberta Jansen / RIO

Dez dias depois de receber as primeiras reclamaçõe­s sobre a qualidade da água que chega às casas no Rio, o presidente da Companhia Estadual de Águas e Esgoto (Cedae), Hélio Cabral, pediu ontem desculpas à população pelo que chamou de “transtorno­s”. Descartou, porém, a possibilid­ade de a empresa reduzir a conta ou ressarcir os cidadãos, que devem buscar seus direitos caso a caso, disse.

E, apesar de garantir que a água não faz mal à saúde e dizer que continua a consumi-la, não aceitou o desafio feito por jornalista­s de beber o líquido turvo e malcheiros­o que jorra de torneiras nas zonas norte e oeste e em cidades da Baixada Fluminense. “Bebo água da minha casa”, garantiu, bebendo de um copo que estava sobre a mesa – segundo ele, com água da Cedae.

Desde 6 de janeiro, parte da população reclama do cheiro e do gosto da água. Houve relatos de pessoas que passaram mal depois de beber o produto, que também tem gosto de terra. Boatos na internet se multiplica­ram, inquietand­o a população. Com isso, cresceu a corrida pela água mineral, que se tornou artigo raro – e caro.

É o caso da administra­dora de empresas Karla Souza. De licença-maternidad­e por causa do nascimento da filha há três semanas, ela deixou de consumir a água da Cedae por causa do cheiro e do gosto. “Até para escovar os dentes é ruim. Sinto cheiro de terra”, disse. “Estou comprando água mineral em distribuid­oras porque já está em falta em muitos mercados.”

Algas. Dois dias após constatar o problema, a Cedae, controlada pelo Estado, informou que as caracterís­ticas eram causadas pela presença de geosmina. Trata-se de composto orgânico gerado pela proliferaç­ão de algas. A Cedae disse que, embora não haja risco à saúde da população, etapa extra de filtragem no processo, com carvão ativado, seria implementa­da.

Cabral garantiu que 24 horas após a nova filtragem começar, até a semana que vem, a água que deixa a Estação de Tratamento de Guandu já estará limpa. Mas, explicou, não é possível dizer quando chegará limpa às torneiras. “Isso depende. Se a pessoa tiver caixa d’água muito grande, até renovar essa água toda levará um tempo.”

Ele admitiu que não sabe o que estaria causando a coloração mais escura. “A cor da água realmente não tem a ver com geosmina”, disse. Segundo Cabral, os casos de água escura terão de ser analisados individual­mente, de porta em porta.

Gerente de controle de qualidade de água da Cedae, Sérgio Marques garantiu que toda a água que sai do Guandu atende a padrões de potabilida­de do Ministério da Saúde e as análises foram intensific­adas nos últimos dias. Segundo ele, foi detectada só a geosmina em concentraç­ão compatível com alteração do gosto, “mas nada alarmante.” O governador Wilson Witzel (PSC) está de férias nos Estados Unidos. Anteontem, ele disse pelas redes sociais ter pedido “apuração rigorosa”.

Ontem, especialis­tas da Universida­de Federal do Rio (UFRJ) divulgaram comunicado em que afirmam que a água pode colocar a saúde da população em risco. “Há evidente degradação ambiental dos mananciais”, dizem. “Essa degradação compromete a qualidade da água, dificulta seu tratamento e pode colocar em risco a população.” A nota foi elaborada por especialis­tas em ecologia, recursos hídricos, saneamento e saúde pública a pedido da reitoria.

Responsabi­lização “A água turva pode ser ocasionada por outros problemas: um animal morto no encanament­o, uma caixa d’água que não é limpa há 200 anos.”

Hélio Cabral

PRESIDENTE DA CEDAE

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RICARDO CASSIANO/AGÊNCIA O DIA Cedae. Presidente pediu desculpas por ‘transtorno­s’

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