O Estado de S. Paulo

Sustentabi­lidade à mesa no Madrid Fusión 2020

- Renata Mesquita MADRI VIAGEM A CONVITE DE TOUR SPAIN

“A cozinha pode ser uma ferramenta de transforma­ção e reivindica­ção.” Foi com tal afirmação que Joan Roca começou sua apresentaç­ão no 18° Madrid Fusión, congresso de gastronomi­a que ocorreu no início desta semana na capital espanhola.

O chef do premiado El Celler de Can Roca aproveitou seu espaço no palco para apresentar o menu servido aos chefes de Estado presentes durante a COP25, a Conferênci­a do Clima, realizada em Madri em dezembro. Chamado de ‘La Tierra se Agota’ (A Terra Se Esgota), Roca aproveitou o convite para provocar os importante­s comensais sobre as mudanças climáticas e as questões sociais que o planeta enfrenta. Com pratos criativos, botou literalmen­te os problemas à mesa, desde a falta de água limpa na África à necessidad­e de diminuir o consumo de carne (o prato principal foi feito com beterraba e melancia) e de fomentar uma cadeia socialment­e mais justa para produtores, como os de cacau na América Latina.

Roca fez ainda questão de incluir um rótulo de vinho chileno em homenagem ao país que deveria ter sido a sede do encontro – devido ao momento político que enfrenta, o evento foi transferid­o para a capital espanhola.

O chef ainda aproveitou para anunciar a inauguraçã­o, nas próximas semanas, da Casa Cacao, que vai funcionar como um misto de fábrica, loja e hotel. O espaço será dedicado ao chocolate artesanal, produzido com amêndoas de países como Peru, Colômbia e Equador. O projeto é tocado por Jordi, o irmão Roca especializ­ado em confeitari­a, que visitou esses países para conhecer a cadeia local e comprar o cacau direto dos produtores por um preço mais justo.

Na terça-feira, foi a vez de outro Roca, Josep, subir aos palcos do congresso. O sommelier e chef de sala do restaurant­e em Girona abordou um tema pouco comum para o evento, mas cada vez mais relevante: como as intolerânc­ias e alergias se tornaram um grande desafio para os restaurant­es. Nos últimos 15 dias, mais de 92 pessoas que estiveram no Celler alertaram ter algum tipo de alergia ou intolerânc­ia. “O que é mais importante: o ego do chef ou a satisfação do nosso cliente?”, questionou. Também mostrou como o restaurant­e se organiza para receber esse público e ressaltou que é preciso cada vez mais estudar e treinar a equipe para lidar com tais questões.

Estrangeir­os. O chef australian­o Josh Niland – anote esse nome – também lotou o auditório principal ao apresentar seus métodos de maturação de peixes frescos. As técnicas desenvolvi­das pelo chef, que incluem secar os peixes com panos de papel, conseguem aumentar a vida útil dos pescados em até um mês. Autointitu­lado “fish-butcher”, ou açougueiro de peixes, ele lançou no último semestre um livro sobre sua pesquisa, The Whole Fish Cookbook: New Ways to Cook, Eat and Think (algo como Caderno de Receitas do Peixe: novas formas de cozinhar, comer e pensar), bastante elogiado.

Outro estrangeir­o que lotou o auditório principal foi o alemão René Frank, do Coda Dessert Dining (Berlim), único restaurant­e com estrela Michelin com menu-degustação só de sobremesas. Apesar de trabalhar somente com receitas doces, o açúcar refinado não entra em sua cozinha.

“O açúcar industrial limita a criativida­de do confeiteir­o.” Ele abriu sua apresentaç­ão com essa frase e mostrou as diferentes maneiras que usa para extrair o dulçor dos alimentos, sejam eles doces ou salgados, como vegetais e até peixe, por meio de técnicas como fermentaçã­o e conservas.

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FOTOS: MADRID FUSIÓN Vegano. Prato feito com beterraba e melancia alerta para o consumo excessivo de carne
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Joan Roca. Chef levou aos pratos desafios ambientais

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