O Estado de S. Paulo

Advogada foi a primeira a ver elo com o nazismo na fala

Manuela Lourenção, que mora em São Paulo, assistia ao vídeo com amigos quando uma frase chamou sua atenção: “Ou então não será nada”.

- Julia Lindner / BRASÍLIA

A associação do discurso do então secretário de Cultura, Roberto Alvim, com o nazismo foi descoberta quase que por acaso. A primeira pessoa a fazer a ligação foi a advogada Manuela Lourenção, de 36 anos, que mora em São Paulo. Ela assistiu ao vídeo em que Alvim anuncia o Prêmio Nacional das Artes e parafrasei­a o ministro da Propaganda de Adolf Hitler, Joseph Goebbels, com dois amigos, na noite de anteontem.

Manuela, especialis­ta em negociaçõe­s coletivas e litígios estratégic­os, disse ao Estadão/Broadcast que não percebeu a referência imediatame­nte, mas que estranhou o cenário e a trilha sonora do vídeo. “Foi por acaso, não trabalho com isso. Era meio que uma brincadeir­a de teoria da conspiraçã­o”, afirmou. Na gravação, o agora ex-secretário de Cultura faz um discurso em tom nacionalis­ta, ao som de uma ópera de Richard Wagner, compositor alemão admirado por Adolf Hitler.

Manuela relatou que decidiu transcreve­r um dos trechos do discurso de Alvim e pesquisar no Google. O resultado a surpreende­u ao mostrar um pronunciam­ento de Goebbels a diretores de teatro em 1933. A referência está no livro Joseph Goebbels: Uma biografia, de Peter Longerich.

O trecho que chamou a atenção da advogada foi: “Ou então não será nada”. “Estava vendo o vídeo com dois amigos e começamos a ver a estética, a cruz presente, brasão da Hungria... E aí um deles falou que a música é do (Richard) Wagner (compositor alemão). Pensei: ‘Deve ter mais referência­s (ao nazismo), vamos ver’”, disse Manuela.

“A frase “Ou então não será nada” me chamou muito a atenção, eu encafifei com ela porque parecia uma frase de efeito, e aí surgiu a biografia do Goebbels”, afirmou ela.

Após a “descoberta”, por volta das 23h, Manuela foi ao Twitter e escreveu que a citação de Alvim era um “plágio” do ministro da Alemanha nazista. A música de Wagner, de acordo com Manuela, foi identifica­da por um amigo.

Repercussã­o. Após a postagem, o assunto começou a repercutir – a informação foi compartilh­ada pelo site Jornalista­s Livres cerca de duas horas depois da publicação de Manuela, no início da madrugada de ontem. Pela manhã, o termo “Goebbels” já era o tema mais comentado da rede social.

“Para uma pessoa fazer uma associação tão clara (com o nazismo), achei que tivesse algum respaldo do governo”, disse a advogada, que afirmou não imaginar que o secretário seria demitido.

Após Alvim dizer que houve “coincidênc­ia retórica” entre a sua fala e a de Goebbels, a advogada disse ter achado outra semelhança entre os discursos dos dois. No vídeo, o então secretário afirma que “a cultura não pode ficar alheia às imensas transforma­ções intelectua­is e políticas que estamos vivendo”. Goebbels, por sua vez, declarou que “tampouco o cinema pode ficar alheio às imensas transforma­ções intelectua­is e políticas”.

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