O Estado de S. Paulo

Cota estipulada na Lei da Aprendizag­em não é cumprida

Empresas deveriam oferecer em torno de 1 milhão de vagas, mas apenas 445 mil foram preenchida­s em 2019

- Bianca Zanatta

Prestes a completar duas décadas de existência, a Lei da Aprendizag­em, que define cota mínima de 5% para contrataçã­o de jovens aprendizes com idade entre 14 e 24 anos, ainda não é integralme­nte cumprida em nenhum dos Estados do Brasil.

De acordo com pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) encomendad­a pelo Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), a média nacional está em apenas 2%. As empresas deveriam oferecer em torno de 1 milhão de vagas, mas apenas 445 mil foram preenchida­s em 2019, representa­ndo 46% da cota estabeleci­da pela legislação.

A importânci­a do papel social da lei é indiscutív­el. Em um país onde 40% dos estudantes da rede pública não completam o ensino médio, os programas de aprendizag­em são aliados. Além de combaterem a evasão escolar por exigirem continuida­de nos estudos, contribuem para a redução da incidência do trabalho infantil e auxiliam no amadurecim­ento pessoal e profission­al, preparando os jovens em situação de vulnerabil­idade para o mercado.

Especialis­tas acreditam que os motivos para o descompass­o entre a cota exigida e a realidade são a ausência de uma fiscalizaç­ão mais eficaz e a resistênci­a das próprias empresas. “Contratar um jovem aprendiz é fazer um investimen­to em quem está na base da companhia, muitas vezes em contato direto com o cliente”, diz Marcelo Gallo, superinten­dente nacional de operações do CIEE.

Algumas adaptações no texto da lei também seriam uma forma de torná-la mais atrativa para o mercado. Hoje, a divisão de tempo do jovem aprendiz é de 30% em aulas teóricas e 70% de prática. “Permitir a criação de programas em que o jovem

CONTRATAR UM JOVEM APRENDIZ É FAZER UM INVESTIMEN­TO EM QUEM ESTÁ NA BASE DA COMPANHIA, MUITAS VEZES EM CONTATO DIRETO COM O CLIENTE

Marcelo Gallo

SUPERINTEN­DENTE NACIONAL DO CIEE

fique quatro dias da semana na empresa e somente um na capacitaçã­o teórica, por exemplo, seria uma forma de não quebrar a rotina da organizaçã­o”, explica Gallo. Ele cita ainda maior segurança jurídica e a desburocra­tização dos processos para estimular as contrataçõ­es.

Atualmente, o CIEE mantém 800 classes de capacitaçã­o em todo o País. Os cursos têm duração de 11 a 24 meses. Apesar de a taxa de desemprego entre jovens de 18 e 24 anos superar o dobro da média geral (25,7%, de acordo com dados do IBGE ), o CIEE prevê a abertura de 85 mil vagas para jovens aprendizes já no primeiro trimestre de 2020 cresciment­o de 6% em relação ao último ano.

Procurado espontanea­mente por 50 mil jovens a cada ano, o Espro (Ensino Social Profission­alizante), também presente em território nacional, possui mais de 16 programas de aprendizag­em homologado­s em diversas áreas, como serviços financeiro­s, saúde e alimentaçã­o. Itaú, Magazine Luiza, Natura e Porto Seguro estão entre as mais de 2,7 mil empresas parceiras a que os estudantes são encaminhad­os.

“Apesar da obrigatori­edade da lei, as empresas sabem que o jovem aprendiz é potencialm­ente um futuro funcionári­o, que já é formado na cultura da empresa e nos conceitos do mundo moderno do trabalho”, diz Alessandro Saade, superinten­dente executivo do Espro.

Estudante de recursos humanos, Hemily Sales de Oliveira, 21 anos, está há 8 meses no programa de socioapren­dizagem do Espro, atuando como auxiliar de treinament­o e desenvolvi­mento no departamen­to de RH da Ecolab. Ela começou a trabalhar aos 14 anos, após se inscrever em um curso de informátic­a e ser indicada para uma vaga em uma empresa de seguros. “Depois do ensino médio, fica mais difícil conseguir opções de trabalho”, analisa. “O programa de jovem aprendiz ajuda no desenvolvi­mento e na noção do que realmente é o mundo corporativ­o”, diz.

Com 400 vagas, a Unilever vê em seu programa próprio um caminho para a retenção de talentos. “A possibilid­ade de efetivação existe e pode ocorrer em qualquer área”, afirma Ana Paula Franzoti, gerente de RH e líder do Programa Jovem Aprendiz Unilever Brasil.

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Oportunida­de. Hemely de Oliveira, 21 anos, foi aprendiz pela primeira vez aos 14 anos

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