FAZER O BEM
Entidades buscam doações para quem precisa.
No último mês, a disseminação do novo coronavírus alterou comportamentos e emoções : ruas e avenidas de grandes centros urbanos do planeta estão vazias. As casas, cheias. Com medo, pessoas buscam refúgio e ficam enclausuradas em quarentena.
Ao mesmo tempo, a ameaça diante da pandemia e as alterações na vida de todos fizeram com que despertasse um sentimento de cooperação entre os brasileiros. Diferentemente do que ocorreu durante outros problemas sanitários globais mais antigos, a tecnologia permite, agora, que um maior número de pessoas possa ajudar em causas humanitárias.
Entidades assistenciais já acostumadas a realizar doações demonstram força e articulação diante da disseminação da covid-19 no Brasil. “Há, no gesto de doação, o sentido de humanidade que, de algum modo, se perdeu com o consumo desenfreado”, opina Humberto Silva, professor de Filosofia da Faap.
Para quem cumpre as orientações do Ministério da Saúde e se mantém isolado, ficar em casa sem poder ajudar pode ser angustiante. “O isolamento social pode levar à sensação de que não conseguimos atingir nosso semelhante com algum ato de generosidade. Essa sensação pode se dar devido à distância que nos impede de reconhecer os sinais de gratidão e satisfação de quem recebe a doação”, analisa a neuropsicóloga Gisele Calia.
Ela ressalta que há diferenças no cérebro entre “fazer o bem sem olhar a quem” ou “olhando a quem”. “Um estudo científico realizado em 2018, na Universidade de Pittsburgh, na Pensilvânia, demonstra que o fornecimento de apoio social ‘direcionado’, ou seja, voltado a alguém específico e conhecido, ativa as mesmas regiões cerebrais envolvidas no cuidado parental (de
pai e mãe)”, afirma.
Poder contribuir para minimizar os efeitos da pandemia em uma comunidade carente ou para os profissionais de saúde, que estão na linha de frente e que, muitas vezes, não têm equipamentos adequados para enfrentar o coronavírus, pode ser recompensador. O grande ganho psíquico que advém de um ato de generosidade é a sensação de felicidade, na análise da neuropsicóloga. “Simples assim. Esse resultado experimentado por qualquer pessoa que pratique atos de generosidade foi comprovado cientificamente por estudos com ressonância magnética. As imagens dos exames apontam que, só de planejar atos de generosidade, as regiões cerebrais relacionadas à felicidade ficam ativas”, conta Gisele.
A especialista esclarece que esse comportamento cerebral tem uma explicação evolutiva. “O ser humano só se tornou uma espécie que sobreviveu na natureza por tantos anos, sem condições de competir fisicamente com outras espécies mais ‘fortes’, porque desenvolveu, além da inteligência, a capacidade de ajudar uns aos outros”, afirma.
Gisele menciona um fato atribuído à antropóloga americana Margaret Mead (1901-1978), em resposta a um aluno, que ilustra bem a importância do cuidado mútuo entre os seres humanos para a sobrevivência como espécie. “Ao ser indagada sobre qual seria o primeiro sinal de civilização, de vida organizada culturalmente, ela teria dito que foi ‘um fêmur quebrado e cicatrizado’.” Ele seria a evidência de que alguém teve tempo de ficar ao lado da pessoa que caiu e quebrou o osso da coxa, que a ajudou até que ele cicatrizasse e ela pudesse se locomover novamente, correr de predadores, ir até o rio beber água e buscar comida”, conta.
Agora, de volta ao século 21. Esse mesmo sentimento de cooperação toma conta de muitas pessoas, como Giovanna Leopoldi. “Poder ajudar, pelo menos um pouco, me deixa muito feliz. O mais importante agora é o seguinte: conseguiremos passar por essa pandemia não só protegendo os que mais sofrem, mas mostrando amor e carinho ao próximo. A doença pode ser grave, principalmente para a população em vulnerabilidade, então, é imprescindível dar essa atenção”, declarou, após fazer uma doação para a ONG Visão Mundial, que atende crianças e adolescentes em comunidades carentes. “Eles pediram doações em dinheiro para conseguir comprar e distribuir uma quantidade maior de cestas básicas, kits de higiene e materiais educativos para essas pessoas que mais precisam. Sou muito criteriosa com doações. E tive a oportunidade de ver, por meio das redes sociais da ONG, as entregas acontecerem”, relata.
Banco. Grandes instituições brasileiras também fizeram doações de parte de seus lucros para ajudar a combater o novo coronavírus no Brasil. O Banco Safra, por exemplo, anunciou que está doando R$ 20 milhões para hospitais públicos e Santas Casas, destinados à ampliação de leitos hospitalares e compra de equipamentos e insumos médicos.
O banco tambémconvida clientes e parceiros para fazerem doações em torno dessa causa. Já foram iniciados projetos para implementar leitos de UTI na rede municipal de São Paulo, com gestão e operação do Hospital Albert Einstein; criar leitos em um hospital de campanha no Grajaú, sob gestão do Hospital Sírio Libanês; doar equipamentos de proteção à Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; e também a participação no projeto do Hospital de Campanha Lagoa-Barra, que terá 200 leitos para atender pacientes do SUS, conduzido pela Rede D’Or.
Nesta etapa, o Banco Safra vai doar o equivalente a 60 leitos de UTI, um milhão de máscaras cirúrgicas, 700 mil aventais de proteção, e participar da construção de dois hospitais de campanha.
PARA NEUROPSICÓLOGA, ATOS DE GENEROSIDADE TRAZEM A SENSAÇÃO DE FELICIDADE