CHINA REABRE, MAS AINDA EM MARCHA LENTA
Pequim avalia que novas contaminações podem prejudicar retomada da economia no longo prazo
Após dez semanas confinados em casa, os moradores de Wuhan já conseguem sair para ver a luz do dia. O aeroporto deve reabrir na próxima semana e todos terão permissão para deixar a cidade de 11 milhões de habitantes pela primeira vez desde que ela foi fechada, em 23 de janeiro, em uma tentativa de controlar o coronavírus.
Pequim diz que o país venceu a batalha contra o surto, relatando todos os dias que as transmissões domésticas são insignificantes ou inexistentes. A reabertura gradual de partes da Província de Hubei – e agora de Wuhan, sua capital – é prova disso. Mas vencer essa guerra está provando ser algo mais difícil, pois envolve não apenas prevenir uma segunda onda de infecções, mas também retomar a economia. A cada dia fica mais claro que as autoridades não podem realizar as duas tarefas ao mesmo tempo.
“Para impedir a propagação do vírus, a China precisa manter algum tipo de medida de distanciamento social”, disse Neil Thomas, pesquisador do centro de estudos Marco Polo, entidade com sede em Chicago especializada em temas chineses.
O governo chinês está descobrindo que permitir que as pessoas se aproximem demais eleva o risco de um novo aumento de infecções. Relatórios de saúde recentes falam em “portadores silenciosos” e estudos apontam que até um terço das pessoas infectadas com o coronavírus apresentam sintomas tardiamente.
“A possibilidade de uma nova onda de infecções permanece relativamente alta”, disse o porta-voz da Comissão Nacional de Saúde do país, Mi Feng.
Em comunicado na TV, o Partido Comunista da China prometeu “fazer a prevenção e o controle da situação”, por um lado, “e lidar com a retomada da produção”, por outro. Assim como Donald Trump, nos EUA, que queria a abertura do comércio na Páscoa – ele recuou, após a explosão de casos –, o líder chinês, Xi Jinping, também está preocupado com o impacto econômico da paralisação nacional.
A maioria dos economistas prevê uma queda acentuada na taxa de crescimento da China no primeiro trimestre, com alguns prevendo a primeira contração desde 1976. É certo que, apesar da reabertura gradual de Wuhan, as coisas ainda estão longe do normal. A tentativa de retomada é feita com avanços e recuos. Pequenas empresas – de bares de karaokê a cibercafés – que tentaram reabrir, no início de março, foram intimadas a fechar novamente. As autoridades chinesas não explicam as razões, mas analistas apontam que Pequim teme que novas infecções causem impacto ainda pior na economia no longo prazo. Em Wuhan, a covid-19 matou oficialmente 2,5 mil pessoas e outras 2,5 mil continuam internadas.
“É um cálculo difícil, pois envolve o risco à saúde pública versus o risco econômico”, disse Ryan Manuel, diretor da Official China, consultoria especializada em política chinesa. Mas é uma conta que outros países, incluindo Itália, Espanha e EUA, terão de fazer. “Todos precisarão ter uma estratégia”, disse Alicia Garcia Herrero, economista do Banco Natixis. “Hoje, os líderes chineses podem dizer que estão indo devagar por razões sanitárias. Mas, na verdade, é porque eles não podem vender seus produtos para ninguém.” / W. POST