Professores da rede pública se preocupam menos com aula online
Pesquisa mostra diferença no modo como docentes enfrentam isolamento social imposto pela covid-19
A primeira pesquisa feita com professores após o fechamento das escolas no País mostra diferenças entre como os profissionais de escolas públicas e particulares estão enfrentando a situação de isolamento. Enquanto a maioria de quem dá aulas em instituições privadas acredita que seu papel é interagir remotamente com seus alunos, só uma minoria dos que atuam nas estaduais e municipais pensa da mesma forma. Em comum, ambos se mostram muito preocupados com a própria saúde e pedem apoio psicológico para lidar com a pandemia do novo coronavírus.
Apesar da onda de atividades online para alunos de elite nessas primeiras semanas, o mesmo não tem acontecido nas redes públicas. A maioria das secretarias de Educação apenas suspendeu as aulas – algumas decretaram férias – e ainda prepara programas para educação a distância. As redes de São Paulo e de Amazonas são algumas das mais adiantadas.
A pesquisa foi realizada pelo Instituto Península entre os dias 23 e 27 de março, com 2,4 mil professores do País. Entre os docentes das redes municipais, por exemplo, só 14% disseram que receberam algum suporte para educação a distância na sua escola ou rede onde trabalham. Entre os que estão em escolas particulares, esse índice é de 65,3%.
Isso ajuda a explicar o fato de que, quando perguntados qual o seu papel nesse momento, mais de 60% dos professores de escolas públicas responderam que era “se manter em casa cuidando de si e de seus familiares”. Os de instituições particulares também veem importância nesse cuidado pessoal, mas a maioria diz que deve “interagir remotamente com seus alunos”. “Existe a complexidade de se lidar com um Estado ou uma cidade inteira para atividades online, são dimensões diferentes, além da infraestrutura da escola privada e nas casas dos alunos, que também é mais bem preparada”, diz a diretora executiva do Instituto Península, Heloísa Morel. “Mas grande parte das secretarias não sabe nem como fazer e está correndo pra encontrar soluções.”
O Península e outras fundações, como Lemann, Unibanco, Natura e Todos pela Educação, estão se organizando numa coalizão para entregar um conteúdo de educação a distância para as redes de ensino público. Como o Estado informou, um dos projetos é oferecer materiais online pelo celular por meio de acordos com operadoras. As entidades estão fazendo uma curadoria dos conteúdos existentes para apresentar às secretarias de Educação.
“O risco é tremendo de aumentar a desigualdade na educação, então é preciso pelo menos mitigar danos”, diz a diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Públicas da FGV, Claudia Costin. Segundo ela, há redes que podem aproveitar o momento para atuar com criatividade e usar todo tipo de comunicação com alunos, como rádio e apostilas físicas. Pesquisas indicam que, entre os mais pobres, 30% não têm sequer internet em casa.
Saúde mental. O estudo feito pela Península mostra ainda como os professores já se mostram abalados pelo atual momento: 91% se dizem preocupados com a própria saúde, apesar de uma minoria informar que faz parte dos grupos de risco para o coronavírus. Eles também já declaram um grande impacto em sua saúde mental e, quando são questionados sobre que tipo de apoio gostariam de receber, pedem “informação” e suporte “psicológico”.
A pesquisa “Sentimento e percepção dos professores brasileiros nos diferentes estágios do Coronavírus no Brasil” vai continuar ouvindo docentes para mostrar a reação dos profissionais até o fim do isolamento. E monitorar também a volta às aulas. Estudos indicam que há aumento de evasão quando estudantes ficam muito tempo fora da escola.