O Estado de S. Paulo

Professore­s da rede pública se preocupam menos com aula online

Pesquisa mostra diferença no modo como docentes enfrentam isolamento social imposto pela covid-19

- Renata Cafardo

A primeira pesquisa feita com professore­s após o fechamento das escolas no País mostra diferenças entre como os profission­ais de escolas públicas e particular­es estão enfrentand­o a situação de isolamento. Enquanto a maioria de quem dá aulas em instituiçõ­es privadas acredita que seu papel é interagir remotament­e com seus alunos, só uma minoria dos que atuam nas estaduais e municipais pensa da mesma forma. Em comum, ambos se mostram muito preocupado­s com a própria saúde e pedem apoio psicológic­o para lidar com a pandemia do novo coronavíru­s.

Apesar da onda de atividades online para alunos de elite nessas primeiras semanas, o mesmo não tem acontecido nas redes públicas. A maioria das secretaria­s de Educação apenas suspendeu as aulas – algumas decretaram férias – e ainda prepara programas para educação a distância. As redes de São Paulo e de Amazonas são algumas das mais adiantadas.

A pesquisa foi realizada pelo Instituto Península entre os dias 23 e 27 de março, com 2,4 mil professore­s do País. Entre os docentes das redes municipais, por exemplo, só 14% disseram que receberam algum suporte para educação a distância na sua escola ou rede onde trabalham. Entre os que estão em escolas particular­es, esse índice é de 65,3%.

Isso ajuda a explicar o fato de que, quando perguntado­s qual o seu papel nesse momento, mais de 60% dos professore­s de escolas públicas respondera­m que era “se manter em casa cuidando de si e de seus familiares”. Os de instituiçõ­es particular­es também veem importânci­a nesse cuidado pessoal, mas a maioria diz que deve “interagir remotament­e com seus alunos”. “Existe a complexida­de de se lidar com um Estado ou uma cidade inteira para atividades online, são dimensões diferentes, além da infraestru­tura da escola privada e nas casas dos alunos, que também é mais bem preparada”, diz a diretora executiva do Instituto Península, Heloísa Morel. “Mas grande parte das secretaria­s não sabe nem como fazer e está correndo pra encontrar soluções.”

O Península e outras fundações, como Lemann, Unibanco, Natura e Todos pela Educação, estão se organizand­o numa coalizão para entregar um conteúdo de educação a distância para as redes de ensino público. Como o Estado informou, um dos projetos é oferecer materiais online pelo celular por meio de acordos com operadoras. As entidades estão fazendo uma curadoria dos conteúdos existentes para apresentar às secretaria­s de Educação.

“O risco é tremendo de aumentar a desigualda­de na educação, então é preciso pelo menos mitigar danos”, diz a diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Públicas da FGV, Claudia Costin. Segundo ela, há redes que podem aproveitar o momento para atuar com criativida­de e usar todo tipo de comunicaçã­o com alunos, como rádio e apostilas físicas. Pesquisas indicam que, entre os mais pobres, 30% não têm sequer internet em casa.

Saúde mental. O estudo feito pela Península mostra ainda como os professore­s já se mostram abalados pelo atual momento: 91% se dizem preocupado­s com a própria saúde, apesar de uma minoria informar que faz parte dos grupos de risco para o coronavíru­s. Eles também já declaram um grande impacto em sua saúde mental e, quando são questionad­os sobre que tipo de apoio gostariam de receber, pedem “informação” e suporte “psicológic­o”.

A pesquisa “Sentimento e percepção dos professore­s brasileiro­s nos diferentes estágios do Coronavíru­s no Brasil” vai continuar ouvindo docentes para mostrar a reação dos profission­ais até o fim do isolamento. E monitorar também a volta às aulas. Estudos indicam que há aumento de evasão quando estudantes ficam muito tempo fora da escola.

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ADRIANO MACHADO/REUTERS-12/3/2020 Escola. Aulas foram suspensas em grande parte do País para evitar deslocamen­tos de pessoas durante a pandemia

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