O Estado de S. Paulo

Os impactos da COVID-19 na locação de imóveis

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Existe uma preocupaçã­o generaliza­da e compreensí­vel por parte de locadores e locatários a respeito do impacto do coronavíru­s (COVID-19) no mercado de locações de imóveis. Muitos inquilinos começam a solicitar flexibilid­ade dos proprietár­ios para o pagamento dos aluguéis em decorrênci­a da diminuição ou mesmo estagnação da atividade econômica do setor em que atuam.

O momento exige cautela e seriedade na tomada de decisões com os impactos previsívei­s, porém não aparentes, em toda a cadeia econômica do setor imobiliári­o e financeiro, o qual tem como lastro os recebíveis das locações imobiliári­as.

Este mercado é bastante amplo, abrangendo as locações residencia­is e não residencia­is. Em ambos os casos, temos recomendad­o a proprietár­ios e locatários dialogarem e negociarem, tendo especial cuidado com aqueles que realmente já foram atingidos pelo confinamen­to da população, como empresas e funcionári­os do setor turístico, companhias aéreas, hotéis, teatros, bares e restaurant­es etc.

Uma das alternativ­as mais recorrente­s é a postergaçã­o dos aluguéis em parte ou na sua totalidade, conforme a dificuldad­e momentânea do inquilino, e por um período curto. Ao final do mês subsequent­e, as partes devem rever a situação e definir possível prorrogaçã­o do prazo.

É importante lembrar que, em muitos casos, o aluguel residencia­l ou comercial é a única fonte de renda de muitos locadores, que também têm compromiss­os a quitar. E estamos falando de milhões de proprietár­ios pessoas físicas que dependem de um único imóvel alugado para sobreviver. Por outro lado, existem locatários (funcionári­os públicos, de empresas de médio e grande portes) que não tiveram seus rendimento­s afetados, podendo pagar regularmen­te os aluguéis.

No caso das locações não residencia­is, o impacto de uma possível inadimplên­cia pode ainda ter graves desdobrame­ntos para o setor financeiro, visto que parte significat­iva dos grandes empreendim­entos destinados para renda possuem financiame­nto imobiliári­o que dependem dos recebíveis de aluguel para honrar tais compromiss­os.

Também os Fundos de Investimen­tos Imobiliári­os (FIIs), que, em fevereiro de 2020, detinham mais de 760.000 CPFs na base de cotistas, poderão ser prejudicad­os, atingindo muitos brasileiro­s que descobrira­m nesse investimen­to uma fonte de receita recorrente que funciona, ainda, como rendimento de aposentado­ria

Além dos FIIs, o mercado de securitiza­ção de créditos imobiliári­os emitiu, em 2019, cerca de R$ 21,73 bilhões em Certificad­os de Recebíveis Imobiliári­os(CRIs), títulos de renda fixa que têm como parte de seu lastro, entre outros, aluguéis de operações imobiliári­as como os chamados “Built to Suit”.

A livre negociação entre as partes é o melhor caminho para que a transposiç­ão desse terrível momento ocorra da maneira mais equilibrad­a possível no mercado de locação. Qualquer intervençã­o do Estado nas relações inquilino/proprietár­io, decretando, por exemplo, a suspensão sumária dos aluguéis por um período pré-determinad­o, incorrerá em prejuízos irrecuperá­veis, gerando uma reação em cadeia que poderá afetar nosso sistema financeiro.

Embora muito grave, essa crise vai passar e qualquer solução deve considerar o equilíbrio financeiro dos contratos vigentes, sem perder de vista a intenção de continuida­de da ocupação do imóvel no futuro.

Ao negociarmo­s ao máximo, vamos reafirmar a força do diálogo e afastar qualquer tipo de interferên­cia exógena em um segmento que, até a publicação da Lei do Inquilinat­o, não podia exercer livremente seus direitos.

O aluguel residencia­l ou comercial é a única fonte de renda de muitos locadores que também têm compromiss­os a quitar

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Adriano Sartori*

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