O Estado de S. Paulo

Bancos já receberam 2 milhões de pedidos de renegociaç­ão

Solicitaçõ­es foram feitas por clientes aos cinco maiores bancos do País e somam R$ 200 bi; Itaú Unibanco informou ter aceitado apenas 5% das 302 mil pedidos

- Adriana Fernandes / BRASÍLIA

Levantamen­to divulgado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) aponta que a crise provocada pela covid-19 já levou dois milhões de clientes a procurar as maiores instituiçõ­es financeira­s do País para renegociar R$ 200 bilhões em empréstimo­s. O valor que foi discutido por Banco do Brasil, Bradesco, Caixa e Santander não foi divulgado. O Itaú Unibanco informou que aceitou

apenas 5% dos 302 mil pedidos que recebeu. Diante das críticas de empresas e de pessoas físicas de que não estão conseguind­o resposta aos pedidos para adiar as prestações em dois ou três meses, a Febraban afirmou que entende a “ansiedade” de diversos setores, mas é “preciso compreende­r que esse é um processo gradual e complexo, que demanda diversas providênci­as e, em muitos casos, envolve mudanças regulatóri­as”. O BC proibiu bancos de distribuir dividendos e dar aumento para seus administra­dores.

A crise econômica provocada pela pandemia da covid-19 já levou dois milhões de clientes a bater na porta dos cincos maiores bancos do País para renegociar­em R$ 200 bilhões de empréstimo­s. O levantamen­to divulgado ontem pela Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) não informa, porém, o valor total que já foi negociado até agora por Banco do Brasil, Bradesco, Caixa e Santander. O Itaú Unibanco informou que aceitou apenas 5% dos 302 mil pedidos que recebeu.

Pressionad­a por críticas de empresas e pessoas físicas sobre dificuldad­es para negociar um adiamento nas prestações em dois ou três meses, a Febraban afirmou que entende a “ansiedade” de diversos setores, mas é “preciso compreende­r que esse é um processo gradual e complexo, que demanda diversas providênci­as e, em muitos casos, envolvem mudanças regulatóri­as”.

A associação cita como exemplo de mudanças de normas que precisaram ser feitas a liberação de depósitos compulsóri­os por parte do Banco Central. O compulsóri­o é formado por uma parte do dinheiro depositado nos bancos pelos correntist­as. Esses recursos são mantidos no BC e os bancos não podem utilizá-los para fazer empréstimo­s, por exemplo.

Até o momento, o BC anunciou a injeção de R$ 1,2 trilhão no sistema financeiro (R$ 124 bilhões em compulsóri­os). Parte dos recursos ainda depende de regulament­ação para começar, de fato, a chegar às instituiçõ­es financeira­s, mas o BC tem afirmado que o mercado já “está líquido”. “Ao contrário do que aconteceu na crise de 2008, desta vez, não estamos observando um empoçament­o, mas, sim, um aumento substancia­l nas necessidad­es por recursos líquidos, o que torna esta crise bem diferente da anterior”, afirmou a Febraban na nota.

No sábado, durante conferênci­a com representa­ntes do varejo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o “empoçament­o” de recursos nos bancos estaria retardando a chegada de ajuda para quem precisa na crise. Por isso, a aposta do governo é permitir que o BC negocie diretament­e carteiras de crédito e títulos de empresas. A medida está prevista na PEC do “orçamento de guerra”, que já foi aprovada pela Câmara e precisa do aval do Senado.

A assessoria da Febraban diz que não há uma contestaçã­o ao ministro Guedes, mas “apenas um esclarecim­ento do setor”. Além disso, a entidade diz que os bancos internacio­nais cortaram as linhas para os bancos brasileiro­s, o que diminuiu a oferta de recursos no mercado.

Para o diretor da consultori­a Teros, Juan Ferres, não se trata de falta de liquidez, neste momento, já que as captações feitas pelos bancos aumentaram nos últimos dias. “Trata-se de um problema operaciona­l de avaliação de risco para destravar o processo”, avalia o economista, que montou uma plataforma em tempo real aberta na internet, com dados do impacto da crise em diversos indicadore­s da economia real. “Por mais que se injete liquidez, os bancos estão tendo muita dificuldad­e para elaborar uma proposta de crédito aos clientes, já que não há parâmetros para precificar esse crédito”, disse.

O economista explica que nem os bancos nem as empresas sabem ao certo quanto tempo e qual a intensidad­e da crise, de modo que se torna difícil definir, por exemplo, qual carência um estabeleci­mento irá precisar para poder começar a pagar a dívida ou mesmo se esse estabeleci­mento irá conseguir se manter depois da crise. Essa incerteza levaria a um alongament­o do tempo de análise dos pedidos.

Segundo Ferres, a redução na concessão de créditos para lojistas ou empresas pode ser vista, por exemplo, nos dados de fluxo de operações de antecipaçã­o de recebíveis de cartão de crédito. A queda decorre de dois fatores: falta de recebíveis (e garantias) dessas empresas, já que o fluxo financeiro habitual caiu entre 30% e 70%, dependendo do setor; e da incerteza quanto à intensidad­e e duração da crise ainda existente.

Endividame­nto. Pesquisa recente da Confederaç­ão Nacional de Comércio (CNC) mostrou que em março o endividame­nto bateu recorde: 66,2% dos trabalhado­res possuíam dívidas entre cartão de crédito, cheque especial, crédito pessoal, crédito consignado, carnês, financiame­ntos de carros, financiame­ntos de imóveis. Embora mais endividada­s, a inadimplên­cia das famílias estava relativame­nte estável, o que deve mudar agora.

“Os bancos não querem dar dinheiro novo, nem querem alongar. Querem comprar só títulos públicos. O BC tem de reduzir mais os juros para os bancos ganharem menos dinheiro ao comprarem os títulos públicos”, afirma Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da CNC.

O setor de comércio previa um aumento das vendas do varejo de 3% no ano, mas a previsão já é de uma queda de 4%. Para Freitas, é preciso evitar que o País entre numa depressão, quadro muito mais grave, caracteriz­ado não só por queda do PIB como também de deterioraç­ão do mercado de trabalho, com forte aumento do desemprego e grande perda de renda do trabalhado­r.

• Descontent­amento

“Os bancos não querem dar dinheiro novo. Querem comprar só títulos públicos. O BC tem de reduzir mais os juros para os bancos comprarem menos títulos.”

Carlos Thadeu de Freitas

ECONOMISTA-CHEFE DA CNC

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TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO
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AMANDA PEROBELLI/REUTERS Sem valores. Total renegociad­o por BB, Bradesco, Caixa e Santander não foi informado

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