O Estado de S. Paulo

QUEM VENCEU A COVID-19 CELEBRA A VIDA

Recife registrou 1ª morte de gestante pela doença; mulher de 33 anos era saudável

- Felipe Resk / RECIFE

Relatos de quem se curou da covid-19 também mostram a agressivid­ade da doença. “Virei um David Uip mais humilde, sabendo os limites da vida”, disse o infectolog­ista. “Os médicos foram muito bons, mas acredito mais no médico lá de cima”, disse o jurista Ives Gandra.

Não fosse o novo coronavíru­s, Juninho deveria ter vindo ao mundo entre os meses de maio e junho. Internada em um hospital particular do Recife com covid-19, a mãe Viviane Albuquerqu­e, de 33 anos, precisou ser submetida à cirurgia cesariana de emergência, ainda na 31.ª semana de gravidez, após sofrer agravament­o do quadro clínico.

Em estado grave, o bebê foi encaminhad­o à UTI depois do parto. Já Vivi, como era chamada, até então uma mulher saudável e ativa, não resistiu às complicaçõ­es da doença e se tornou na noite de domingo a primeira gestante vítima da epidemia em Pernambuco.

Vivi já era mãe de duas garotinhas, gêmeas de apenas 6 anos, e morava com as filhas, a mãe e um papagaio, chamado Menininho

José, em um apartament­o na Boa Vista, bairro no centro do Recife. Fisioterap­euta e professora de ensino superior, dividia a rotina abarrotada entre a família, o trabalho e os estudos. Neste ano, ela concluiria sua segunda graduação, em Direito.

A nova gravidez – desta vez, de um garoto – não foi planejada: mas ela recebera a notícia com alegria, segundo amigos. “Esse bebê era o sonho da vida dela. O enxovalzin­ho já estava todo pronto, ela mandava foto do quartinho, que já estava ficando pronto, pedia dica de cor para a parede…”, conta a vizinha e amiga próxima Beth Costa, de 35 anos. “Estava muito feliz, mas também muito preocupada com o coronavíru­s.”

Fruto da relação com o atual namorado, o menino receberia o nome de Erick, assim como o pai. A única dúvida era se ganharia nome composto de David, o “rei amado”, como Vivi escreveu em uma rede social. Na família, todos passaram a chamar o bebê de Juninho.

Religiosa, a fisioterap­euta era devota de Nossa Senhora da Conceição, santa para quem o Recife dedica feriado. Ela também tinha o hábito de mobilizar campanhas de solidaried­ade, segundo amigos. “Pedia para recolher brinquedos, por exemplo, para fazer doação. Era uma pessoa nota mil, estava sempre à disposição para ajudar”, diz Beth. “Outro dia, comentou comigo que estava muito feliz porque tinha levado uma criança de rua pela primeira vez a um restaurant­e.” Recentemen­te, a própria vizinha precisou da ajuda de Vivi, depois que a filha de 10 anos sofreu um acidente doméstico e lesionou o joelho. “Ela se prontifico­u a fazer fisioterap­ia na minha casa. Só interrompe­mos o tratamento por causa do isolamento social.”

Outra caracterís­tica dela era a alegria, dizem os amigos. Divertida, a fisioterap­euta ensinou Menininho José, o papagaio, a cantar o grito de guerra do Sport, seu time do coração. Também gostava de festa e de carnaval.

Saudável. No Instagram, Vivi costumava publicar fotos se exercitand­o na academia e divulgava informaçõe­s sobre cuidados com a gestação. Era fisicament­e ativa e não tinha histórico de doenças, segundo amigos. Ninguém sabe dizer como ela pode ter contraído a covid-19.

Preocupada com a gravidez, a fisioterap­euta foi ao hospital na última segunda-feira, sentindo falta de ar e um pouco de febre. Após testar positivo para coronavíru­s, o quadro se agravou rapidament­e e Vivi ficou internada na UTI até passar, às pressas, pela cesárea no fim de semana. Até o momento, Pernambuco confirma 223 casos e 30 mortes – estatístic­as que ainda não incluem o caso da gestante.

“As pessoas precisam entender que não é uma gripezinha. Fiquem em casa. Protejam as pessoas que você ama”, diz Beth. “A gente perdeu uma pessoa muito amada e cheia de planos. Ninguém pode brincar com isso”, completou.

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INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO MINISTÉRIO DA SAÚDE CENTRO DE OPERAÇÕES DE EMERGÊNCIA­S EM SAÚDE PÚBLICA FONTE:

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