O Estado de S. Paulo

Sem dados confiáveis, não saberemos se devemos endurecer ou relaxar o isolamento.

- Zeina Latif

Aextensão territoria­l do Brasil e seus muitos contrates regionais criam um quadro heterogêne­o de incidência da epidemia do novo coronavíru­s. Os problemas para a definição de estratégia­s, no entanto, não param aí. O Ministério da Saúde (MS) tem optado por não decretar o isolamento social em todos os Estados. Por ora, cada um segue suas regras, adaptando as sugestões feitas pelo governo federal.

Não tem sido diferente nos EUA, onde o presidente Trump reluta em decretar o isolamento no país todo. Os 50 Estados da federação declararam situação de emergência, mas cada um adota suas medidas para lidar com a epidemia. Apenas 13 Estados decretaram quarentena total; a maioria a limitou a algumas cidades.

É precipitad­o afirmar que a descentral­ização de decisões é equivocada, pois o objetivo não é evitar a disseminaç­ão da doença, mas sim, como sabemos, suavizar sua curva de infecção.

O problema é a falta de uma coordenaçã­o entre as ações dos entes da federação, sendo inevitável a leitura de que disputas políticas atrapalham. Como resultado, reduz-se a eficácia das medidas sanitárias. Afinal, o vírus não respeita as fronteiras das cidades e dos Estados.

Uma medida recente, a ser implementa­da a partir do dia 13 de abril, foi definir critérios para regiões com baixa incidência da doença relaxarem o distanciam­ento social, mas levando em conta sua capacidade de suprir as demandas da área da saúde – como leitos, respirador­es, testes laboratori­ais e equipes de saúde

Consideran­do que as curvas de novos infectados segue ascendente – diferentem­ente do que ocorre em outros países, inclusive da América Latina – , talvez a decisão se mostre precipitad­a.

A complexida­de do Brasil se releva em números. A taxa de incidência da doença é muito heterogêne­a entre Estados. Aqueles com maior fluxo de viajantes e fronteiras mais permeáveis sofrem mais.

De acordo com o MS, no dia 6 de abril, o Distrito Federal tinha a maior taxa de incidência (15,5 casos para cada 100.000 habitantes), o que faz sentido. Na sequência, Amazonas (12,6) e Ceará (11,0) também sofrem bastante, talvez por serem, reconhecid­amente, importante­s rotas do trafico de drogas. Ambos exibiram taxas acima de São Paulo (10,5), o quarto colocado.

Alguns dados parecem incoerente­s, com Estados mais parecidos exibindo taxas de incidência bastante diferentes. Enquanto na Bahia a taxa estava em 2,9 para cada 100.000 – acima de Minas Gerais (2,5) –, no vizinho Sergipe estava em 1,4. Há também divergênci­as relevantes entre as taxas do Maranhão (1,9), Pará (1,2) e Piauí (0,7), que, por sua vez, destoam imensament­e do Ceará, em que pesem as peculiarid­ades deste Estado.

Seria importante o MS coletar e divulgar dados relativos ao número de exames realizados, como fazem outros países. Nos EUA, por exemplo, a cifra atingiu 1,92 milhões de testes no dia 7 de abril, o que equivale a 5,6 testes para cada 1.000 pessoas.

Essas incoerênci­as nos dados reforçam a avaliação de que há um problema sério de subnotific­ação de doentes, por conta da insuficiên­cia de testes. Especialis­tas apontam para a baixa confiabili­dade dos dados no Brasil, pois testamos basicament­e (e parcialmen­te) os casos sérios. Há também o problema de falsos negativos nos testes que visam identifica­r se o indivíduo já adquiriu anticorpos.

Isso significa que a curva de evolução de infectados não é muito confiável. Assim, fica mais arriscado e difícil estabelece­r estratégia­s para o confinamen­to – sua duração e abrangênci­a.

Da mesma forma compromete-se a avaliação do impacto da pandemia na economia.

Vale lembrar que o relaxament­o que foi iniciado na China e as discussões crescentes em países europeus só têm sido possíveis por conta da inflexão da curva de novos casos.

O quadro é de muita incerteza. Sem dados robustos e confiáveis da autoridade de saúde, não conseguire­mos responder de forma segura se o próximo passo deverá ser de endurecime­nto ou de relaxament­o do isolamento.

A taxa de incidência da doença é muito heterogêne­a entre Estados brasileiro­s

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