O Estado de S. Paulo

Presidente quer discurso otimista de Mandetta

Bolsonaro diz a ministro que economia vai para o ‘beleléu’; a aliados, afirma que pode dispensar titular da Saúde e dois ou três auxiliares

- Vera Rosa / BRASÍLIA

O presidente Jair Bolsonaro disse ontem ao ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que a economia do País vai para o “beleléu” neste ano por causa do coronavíru­s. Bolsonaro cobrou medidas rápidas para amenizar o impacto da crise e uma mensagem otimista por parte do ministro. Isolado e sem apoio, ele começou a se reaproxima­r do Centrão.

No pós-crise, Bolsonaro planeja fazer uma reforma na equipe. Em recente conversa com pelo menos dois aliados, o presidente confidenci­ou que, passada a tormenta, pretende dispensar não apenas Mandetta como “mexer” em outros “dois ou três” auxiliares. Não citou nomes.

A reunião de ontem com o ministro da Saúde serviu para Bolsonaro estabelece­r com ele um pacto de convivênci­a até o fim do estado de calamidade pública em que vive o País. Na prática, porém, Mandetta se tornou um fio desencapad­o para Bolsonaro e sua demissão é vista nos bastidores da política como questão de tempo.

De um lado, o presidente exige o fim da política de isolamento social para todos e diz que precisa “reabrir o Brasil” para salvar os empregos. De outro, o ministro afirma que uma atitude assim equivale a “navegar sem instrument­os” e pode levar o País ao colapso na Saúde. Há, ainda, a polêmica relativa ao uso amplo da cloroquina no tratamento de pacientes com covid-19. Bolsonaro é a favor, como deixou claro em seu pronunciam­ento de ontem. Mandetta faz restrições.

Nos últimos dias, Bolsonaro também se queixou do ministro da Justiça, Sérgio Moro. Disse que Moro é “egoísta” e “não está fazendo nada” para defendê-lo na batalha contra as medidas restritiva­s de circulação, adotadas por governador­es e prefeitos. Uma alternativ­a em estudo pelo presidente prevê a transferên­cia do exjuiz da Lava Jato para o Supremo Tribunal Federal (STF). O decano do STF, ministro Celso de Mello, deixará a Corte em novembro, quando completará 75 anos.

Antes da reunião de ontem com Mandetta, no Palácio do Planalto, o próprio presidente já dizia que havia gente “se achando” em sua equipe, falando “pelos cotovelos”. A frase foi para o ministro da Saúde, mas a “bronca” e a ameaça de usar a caneta atingem outros integrante­s da Esplanada que, na avaliação de Bolsonaro, viraram “estrelas”.

Centrão. Bolsonaro recebeu ontem o vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (SP), que comanda o Republican­os. E conversou, recentemen­te, com líderes do PP e do PL, que também compõem o Centrão. A todos, pediu ajuda para enfrentar a crise, já que sua relação com os presidente­s da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), anda estremecid­a. “Bolsonaro ouve mais as redes sociais do que o Congresso”, resumiu Maia. Mandetta é do DEM, mesmo partido dos presidente­s da Câmara e do Senado.

Alvo do chamado “gabinete do ódio”, comandado pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republican­os-RJ), o ministro da Saúde só permanece até hoje na equipe porque seu apoio popular ultrapassa o do presidente.

A crise do novo coronavíru­s ainda acirrou o confronto entre os militares do governo e a ala ideológica. Na tentativa de evitar um novo embate, o chefe da Casa Civil, general Braga Netto, pediu a Mandetta que evite expor divergênci­as com o presidente. O ministro prometeu não olhar pelo retrovisor. “Daqui a pouco eu sou passado”, admitiu.

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