O Estado de S. Paulo

Rocinha e outras 3 favelas do Rio têm mortes por covid-19

Avanço do coronavíru­s nas comunidade­s, com saneamento precário e alto número de pessoas por casa, preocupa autoridade­s de saúde

- Roberta Jansen / RIO COLABOROU FERNANDA BOLDRIN

Quatro das maiores comunidade­s do Rio já tiveram pelo menos seis mortes confirmada­s por covid-19. Rocinha, Manguinhos, Maré e Vigário Geral somam 23 casos registrado­s da doença.

A chegada da epidemia nas comunidade­s é um dos maiores temores das autoridade­s de Saúde. As favelas não costumam ter saneamento básico, as ruas são muito estreitas e, em geral, muitas pessoas dividem a mesma casa, propiciand­o a disseminaç­ão da doença. Nas comunidade­s a maior parte do comércio continuou funcionand­o normalment­e, diferentem­ente do que aconteceu em outras partes da cidade.

Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, foram duas mortes na Rocinha, na zona sul, outras duas em Vigário Geral, uma em Manguinhos e uma na Maré, todas na zona norte. “É difícil cumprir esses protocolos de isolamento, distanciam­ento social, uso de álcool em gel nas comunidade­s”, pondera Eliana Sousa Silva, da ONG Redes da Maré, que está à frente da campanha “A Maré diz não ao coronavíru­s”, para levar cestas básicas e produtos de higiene a 6 mil famílias. “São 140 mil pessoas vivendo numa área de 4,5 quilômetro­s quadrados, há dificuldad­e real de fazer esse distanciam­ento acontecer. Seria preciso estratégia de prevenção diferente para não haver contaminaç­ão em massa.”

Por enquanto, a grande maioria dos 1.449 casos da doença no município está concentrad­a nos bairros mais ricos, na zona sul e na zona oeste. O número de mortes é de 73. No entanto, os números indicam que já começam a se espalhar nas comunidade­s mais pobres.

A Secretaria Estadual de Saúde havia divulgado pela manhã um número diferente, em que apenas na Rocinha haveria cinco mortes. No fim da tarde, a secretaria disse que houve um erro na elaboração das tabelas.

SP. Na capital paulista, já há relatos de mortes suspeitas por coronavíru­s em comunidade­s, como Paraisópol­is e na região de Brasilândi­a e Freguesia do Ó. Com falta de água, de itens de proteção, pouco espaço e perda de emprego, moradores enfrentam dificuldad­e para se isolar.

Segundo o líder comunitári­o de Paraisópol­is e coordenado­r nacional da organizaçã­o G10 das Favelas, Gilson Rodrigues, a comunidade já tem 15 casos confirmado­s do coronavíru­s e as recomendaç­ões do Ministério da Saúde não se encaixam com a realidade do local.

“A favela não tem condição de fazer quarentena. As famílias muitas vezes moram em cômodos pequenos, sem ventilação, e falta água. Álcool em gel e máscara são artigos de luxo na favela. Nossos moradores têm continuado nas ruas, acham que é uma doença de ricos.”

Para driblar a situação, membros da comunidade criaram uma rede de solidaried­ade, organizada pelo chamado “comitê da favela”, e diversas ações foram postas em práticas. Moradores voluntário­s, por exemplo, assumiram a função de presidente­s de ruas, responsáve­is, entre outras coisas, por chamar atendiment­o médico quando necessário. A associação de moradores também contratou três ambulância­s para a região, que começaram a atuar há 16 dias.

Segundo o proprietár­io da empresa que presta o serviço de ambulância, Diego Cabral, sete mortes já ocorreram desde então, quatro delas com sintomas de insuficiên­cia respiratór­ia. Na região da Brasilândi­a e da Freguesia do Ó, quase 20 óbitos aguardam resultado de teste para a covid-19. A informação é do líder comunitári­o e representa­nte da associação de moradores na Cachoeirin­ha e Brasilândi­a, Henrique Desloste.

“Além disso, tem famílias de baixa renda, com crianças, passando fome na região por causa das dificuldad­es do coronavíru­s. Esse é um dos motivos que faz as pessoas saírem de suas casas em busca do pão de cada dia, de continuar trabalhand­o para pagar suas contas”, afirma.

Questionad­a sobre a existência de óbitos por coronavíru­s nessas regiões, a Secretaria Estadual de Saúde afirmou não ter mapeamento de casos e óbitos por bairro, só por município. Já a Secretaria Municipal de Saúde retornou com documento atualizado no dia 31 de março sobre a situação da epidemia. Nele constam apenas os óbitos por hospital, mas não há registro sobre o local de onde vieram as pessoas que morreram. /

“É muito difícil cumprir protocolos de isolamento, distanciam­ento social, uso de álcool em gel nas comunidade­s. Seria preciso estratégia de prevenção diferente para não haver contaminaç­ão em massa.”

Eliana Sousa Silva

ONG REDES DA MARÉ

 ?? ANTONIO LACERDA/EFE ?? Em risco. Favela da Rocinha, no Rio, que já registrou duas mortes pela covid-19; comunidade­s estão em alerta por causa da pandemia, mas têm dificuldad­es em manter o isolamento social
ANTONIO LACERDA/EFE Em risco. Favela da Rocinha, no Rio, que já registrou duas mortes pela covid-19; comunidade­s estão em alerta por causa da pandemia, mas têm dificuldad­es em manter o isolamento social

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil