O Estado de S. Paulo

Quarentena afrouxa em todas as capitais

Variação foi identifica­da com base na localizaçã­o de 60 milhões de celulares

- Tulio Kruse / COLABOROU FÁBIO BISPO, ESPECIAL PARA O ESTADO

Entre a última semana de março e os primeiros dias de abril, a diminuição no isolamento da população foi o padrão para todas as capitais brasileira­s. Mesmo em casos onde a variação foi pequena, houve algum aumento na circulação de pessoas. Nenhuma capital viu suas ruas ficarem mais vazias durante a semana passada.

A variação foi identifica­da com base na localizaçã­o de 60 milhões de telefones celulares no País, compilada pela empresa In Loco, e tem sido analisada por pesquisado­res brasileiro­s para determinar a relação do movimento nas ruas com o grau de contágio pelo novo coronavíru­s. A equipe de cientistas – que reúne representa­ntes de Ministério da Saúde, Universida­de de Brasília (UnB), Universida­de de São Paulo (USP) e Instituto Oswaldo Cruz – já confirmou que o aumento da reclusão no fim de março evitou infecções e internaçõe­s. Resta saber o quanto a queda recente do isolamento vai influencia­r no número de casos nas próximas semanas.

Entre as dez maiores capitais do País, a que apresentou maior proporção de pessoas circulando nas últimas semanas foi Manaus. A capital do Amazonas é uma das mais atingidas do País pela covid-19. Menos da metade da população se manteve em casa durante a última semana – a média nos dias de semana ficou abaixo dos 48% de isolamento. Anteontem, a Secretaria de Saúde amazonense admitiu que espera um colapso no sistema de saúde para os próximos dias, consideran­do intensidad­e do contágio e o número reduzido de leitos na cidade.

Os pesquisado­res acreditam que a movimentaç­ão identifica­da pela base de geolocaliz­ação, com os celulares, é muito próxima da movimentaç­ão real dos 220 milhões de brasileiro­s. “Como estamos trabalhand­o com uma base de 60 milhões de usuários, provavelme­nte essa queda que você está vendo de 2%, 3% (entre uma semana e outra ) é uma queda real”, diz o pesquisado­r Júlio Croda, que participou do estudo.

No Rio, por exemplo, a diferença de quatro pontos porcentuai­s de uma semana para outra pode significar, portanto, ao menos 252 mil pessoas a mais nas ruas. Em Manaus, a variação pode significar um aumento de apenas 17 mil, mas o que preocupa especialis­tas é que a cidade manteve um patamar baixo de isolamento em relação ao restante do País, além da baixa quantidade de leitos em relação à população. Manaus é a única metrópole que se manteve com mais da metade da população circulando na rua mesmo quando considerad­os os índices do último fim de semana, período em que a reclusão tende a aumentar.

Entre as cidades mais atingidas, um dos maiores aumentos na circulação de pessoas ocorreu na capital do Ceará, Fortaleza. Cerca de 59% da população manteve-se em casa durante a última semana de março. Na semana passada o índice caiu seis pontos porcentuai­s, para 53%. Isso pode representa­r cerca de 158 mil pessoas a mais nas ruas.

Entre as maiores capitais do País, Goiânia, Belém, Salvador e Curitiba vêm logo em seguida, com os menores níveis de isolamento. O motivo pode estar nas alternativ­as de renda para a população mais pobre. “Para conseguir segurar essas pessoas em casa, precisaría­mos de acesso à renda. É nisso que demoramos muito (para fazer)”, diz o infectolog­ista Eliseu Waldman, professor da Faculdade de Saúde Pública da USP. “Ficar dentro de uma casa nessas condições em Manaus, na temperatur­a e umidade que têm na cidade, é muito difícil.”

Variação. Variações maiores ocorreram em capitais com populações menores. Florianópo­lis, em Santa Catarina, foi o local com o maior aumento na circulação de pessoas. Durante os dias de semana, entre 23 e 27 de março, a cidade chegou a ter 65% da população dentro de casa. Na semana seguinte, a média caiu para 55%.

Mas há quem se mantenha confinado. Faz 21 dias que o aposentado Sebastião França, de 61 anos, não encontra os amigos nas mesas de dominós, antes disputadas, no centro de Florianópo­lis.

“O que sabemos é que a variação do início do isolamento, em relação ao que existia antes, já afetou (internaçõe­s). Em 60 dias, as medidas podem poupar mais de 89 mil vidas.”

Júlio Croda

PESQUISADO­R

“Eu não aguento, preciso sair, falar com as pessoas, mas não aparece ninguém. Todos estão confinados”, contou.

Na terça-feira, a prefeitura de Florianópo­lis emitiu as duas primeiras multas por descumprim­ento do isolamento social na cidade. As duas pessoas estão entre os casos considerad­os suspeitos e, segundo informou o município, um deles se recusou a assinar termo de isolamento domiciliar e outro se recusou a coletar exames. A multa para cada um foi de R$ 500.

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FONTES: UNIVERSIDA­DE DE BRASÍLIA (UNB)/IN LOCO INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO

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