O Estado de S. Paulo

Bolsonaro nomeia especialis­ta em religião para a Educação

Pastor e teólogo, Milton Ribeiro tem ‘apreço à família e aos valores’ e não foi indicado pela bancada evangélica

- Eliane Cantanhêde / BRASÍLIA Renata Cafardo Jussara Soares / BRASÍLIA / COLABOROU JULIA MARQUES

O advogado, teólogo e pastor presbiteri­ano Milton Ribeiro será o quarto ministro da Educação do governo de Jair Bolsonaro. A indicação do especialis­ta em calvinismo e Antigo Testamento e ex-vice-reitor da Universida­de Mackenzie foi atribuída aos ministros Jorge Oliveira (Secretaria-geral da Presidênci­a) e André Mendonça (Justiça), também presbiteri­ano. Apesar de religioso, ele não foi indicado pela bancada evangélica do Congresso e não é conhecido como um especialis­ta em políticas de educação. Em mensagem a amigos, Ribeiro, que, segundo integrante­s do governo, foi escolhido pelo “apreço à família e aos valores”, afirmou que acreditava ser a “hora de darmos atenção especial à educação básica, fundamenta­l e ao ensino profission­alizante” e de “incrementa­r o ensino superior e a pesquisa científica”. Ele ainda disse que trabalhará em articulaçã­o com os Estados, municípios e seus gestores. Falou em tom de conciliaçã­o, dizendo que é hora de “um verdadeiro pacto nacional pela qualidade da educação”.

Depois de disputas entre as diversas alas que compõem o governo, que duraram mais de 20 dias, o presidente Jair Bolsonaro escolheu o pastor presbiteri­ano Milton Ribeiro para chefiar o Ministério da Educação (MEC) ontem. É o quarto ministro da atual gestão. Apesar de religioso, ele não foi indicado pela bancada evangélica do Congresso e não era o preferido dos militares. Ribeiro é advogado, teólogo e um estudioso da religião, especialis­ta em calvinismo e Antigo Testamento.

A articulaçã­o de seu nome, que surgiu na semana passada, foi atribuída ao ministro-chefe da Secretaria-geral, Jorge Oliveira, e ao ministro da Justiça, André Mendonça, também presbiteri­ano. Entre as caracterís­ticas que fizeram com que Ribeiro fosse escolhido, está o “apreço à família e aos valores”, dizem conhecidos e integrante­s do governo. Ribeiro foi vice-reitor do Mackenzie, quando o reitor era o ex-governador Claudio Lembo, mas é desconheci­do entre especialis­tas da educação.

Em mensagem a amigos, após ser anunciado, ele disse que acreditava ser a “hora de darmos atenção especial à educação básica, fundamenta­l e ao ensino profission­alizante” e de “incrementa­r o ensino superior e a pesquisa científica”. Ele ainda disse que trabalhari­a em articulaçã­o com os Estados, municípios e seus gestores “para mudar a história da educação do nosso País”. Falou em tom de conciliaçã­o, dizendo que é hora de “um verdadeiro pacto nacional pela qualidade da educação em todos os níveis”. “Precisamos de todos: da classe política, academia, estudantes, suas famílias e da sociedade em geral. Esse ideal deve nos unir.”

Atualmente, Ribeiro é reverendo da Igreja Presbiteri­ana Jardim de Oração, em Santos. É ainda membro da Comissão de Ética Pública da Presidênci­a, nomeado por Bolsonaro. O grupo é responsáve­l por apurar a conduta de integrante­s da administra­ção pública federal e de analisar possíveis conflitos de interesse no serviço público. Ao anunciá-lo, o presidente frisou seu doutorado em Educação pela Universida­de de São Paulo, feito em 2006. A USP já confirmou a autenticid­ade do título acadêmico. O trabalho dissertou sobre a educação escolar como “pressupost­o da organizaçã­o institucio­nal calvinista e não apenas seu resultado”. Suas pesquisas foram em decisões oficiais da Igreja Presbiteri­ana do Brasil sobre educação. Quem o conhece diz que ele é um pesquisado­r da área religiosa e não um especialis­ta em políticas educaciona­is, com as quais não trabalhou. É conservado­r, sem postura ideológica – um homem educado e discreto.

O Conselho Nacional de Secretário­s de Educação divulgou nota dizendo que nada comentaria sobre a indicação. Segundo o Estadão apurou, os secretário­s não têm o que dizer porque mal o conhecem. O Semesp, entidade que reúne universida­des particular­es, afirmou que “reconhecid­amente o novo ministro acumula experiênci­as exitosas em sua trajetória profission­al e elas deverão contribuir para que a educação brasileira resolva as questões de acesso e oferta de oportunida­des de aprendizad­o com qualidade”.

Seu nome não teria agradado também à ala evangélica que apoia Bolsonaro. O grupo havia indicado o atual reitor do Instituto de Tecnologia Aeronáutic­a (ITA), Anderson Correa. “Não posso falar nada contra o novo ministro porque seria uma injustiça, eu não o conheço. Mas não venha dizer que ele é apoiado por evangélico­s, que nós não temos nada com isso. É uma escolha do presidente com o ministro da Justiça”, disse o pastor Silas Malafaia. Nas redes sociais, o deputado federal Marco Feliciano (Republican­osSP) disse que não houve interferên­cia da Frente Parlamenta­r Evangélica na opção pelo nome de Milton Ribeiro.

A especialis­ta em educação Anna Helena Altenfelde­r disse não conhecer o novo ministro, mas observa que ele “vem de uma universida­de comprometi­da com a produção do conhecimen­to e a produção científica”. Ela aponta que um dos principais desafios será promover o diálogo com as entidades de educação. “( A questão ideológica) é uma preocupaçã­o que a gente sempre tem com esse governo”.

Vídeo. Após o anúncio da nomeação, publicaçõe­s nas redes sociais recuperara­m vídeo do pastor, publicado há 4 anos pela Igreja Presbiteri­ana Jardim da Oração, em que ele fala sobre a “vara da disciplina” e a importânci­a de disciplina­r as crianças. “A correção é necessária para a cura”, disse o pastor. “Não vai ser obtido por meios justos e métodos suaves. Talvez uma porcentage­m muito pequena de criança, precoce e superdotad­a, é que vai entender o seu argumento. Deve haver rigor, severidade. E vou dar um passo a mais, talvez algumas mães até fiquem com raiva de mim: deve sentir dor.”

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IRANDY RIBAS/ A TRIBUNA DE SANTOS–18/1/2019 Presbiteri­ano. Em tom conciliado­r, Ribeiro disse que trabalhari­a em articulaçã­o com Estados, municípios e seus gestores

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