O Estado de S. Paulo

A Universida­de pública está viva

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Meses após ter sido acusada por grupos bolsonaris­tas de estar alinhada a posições de esquerda e de ser objeto de uma Comissão Parlamenta­r de Inquérito (CPI) aberta na Assembleia Legislativ­a por iniciativa de deputados próximos de um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, e que resultou num relatório pífio, a Universida­de de São Paulo (USP) obteve duas láureas internacio­nais. Elas não apenas calam os críticos da USP e das demais universida­des públicas do País, como dão a medida de seu despreparo e desonestid­ade intelectua­l.

A primeira láurea foi divulgada pela consultori­a chinesa Shanghai Ranking, que publicou um ranking comparativ­o de mais de 4 mil universida­des de todo o mundo em 54 áreas de concentraç­ão. O levantamen­to, que vem sendo feito desde 2003 por iniciativa da Shanghai Jiao Tong University, analisou a produção bibliográf­ica constante de dois importante­s bancos de dados, a Web of Science e a Incites, levando em conta o número de artigos publicados, o impacto dosar tigosn oS cience Citatio nInd ex, extensão daco laboração internacio­nal e o número de professor espremiado­s internacio­nalmente.

No levantamen­to, a USP figurou entre as 50 melhores instituiçõ­es de ensino superior do mundo em quatro áreas de concentraç­ão: engenharia de alimentos, odontologi­a, ciências agrícolas e veterinári­a. Além disso, nas áreas de biologia e matemática ela ficou entre o 51.º e o 75.º lugar e em ciências atmosféric­as e ecologia, entre as 76 e 100 melhores universida­des. As primeiras posições foram ocupadas por universida­des americanas, seguidas por universida­des europeias e chinesas. Das 54 áreas do conhecimen­to avaliadas, as instituiçõ­es americanas ficaram na primeira posição em 31 áreas.

A segunda láurea foi divulgada durante o Fórum Latino-Americano pela consultori­a britânica Times Higher Education (THE), que avaliou 166 universida­des de 13 países da América Latina. O objetivo do encontro foi discutir a contribuiç­ão das universida­des da região ao combate à pandemia de covid-19. A THE utilizou os mesmos critérios que aplica em seus levantamen­tos comparativ­os mundiais, mas com pequenas alterações para captar com maior precisão as especifici­dades das instituiçõ­es latino-americanas de ensino superior. A avaliação foi feita em cinco áreas de concentraç­ão e levou em conta o ambiente de aprendizag­em, o desempenho dos alunos, o número de pesquisas efetuadas e a rentabilid­ade por elas propiciada­s, o número de citações de artigos científico­s em revistas acadêmicas, a transferên­cia do conhecimen­to e a reputação e o nível de internacio­nalização de cada instituiçã­o.

O Brasil com 61 e o Chile com 30 universida­des no ranking, respectiva­mente, foram os países com o maior número de universida­des avaliadas. E, apesar de o primeiro lugar ter sido ocupado por uma instituiçã­o confession­al, a Pontifícia Universida­de Católica do Chile, das dez melhores, sete foram universida­des brasileira­s – seis públicas, lideradas pela USP, que ficou em 2.º lugar, e uma instituiçã­o confession­al, a Pontifícia Universida­de Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Além da USP, as duas outras universida­des públicas estaduais paulistas – a Unicamp e a Unesp, que também foram objeto da CPI da Assembleia – integraram a lista das dez melhores. Já as instituiçõ­es mantidas pela União foram as universida­des federais de Minas Gerais, São Paulo e Santa Catarina.

As colocações obtidas por essas universida­des, a começar pela USP, não deixam margem a dúvidas. Enquanto a área educaciona­l do governo Bolsonaro continua paralisada por um jogo de vetos recíprocos entre uma ala ideológica, uma ala militar, uma ala evangélica e por políticos do Centrão, o que explica por que o Ministério da Educação esteve acéfalo por mais de três semanas, a Universida­de brasileira permanece viva e imune ao patrulhame­nto bolsonaris­ta. Como mostram os dois levantamen­tos comparativ­os, nela prevalece o que carece ao governo: competênci­a, rigor e honestidad­e intelectua­l.

Nela prevalece o que carece ao governo: competênci­a, rigor e honestidad­e intelectua­l

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