O Estado de S. Paulo

Em casa, brasileiro descobre o vinho

Mudanças no hábito de consumo dos brasileiro­s, em função do isolamento social, ajudaram as vendas de vinhos e espumantes a avançarem 12% entre janeiro e maio, a maior alta entre as bebidas alcoólicas; expansão foi liderada pelos produtos nacionais

- Fernando Scheller

Sommelier Cibele Siqueira já fez 22 lives durante a quarentena; vendas de vinhos e espumantes cresceram 12% no País de janeiro a maio, a maior alta entre as bebidas alcoólicas. Expansão foi liderada pelos produtos nacionais.

Concentrad­o em casa, o brasileiro mudou alguns hábitos de consumo, resultando em um cresciment­o sem precedente­s de algumas categorias. E, entre as bebidas alcoólicas, a mais beneficiad­a foi a de vinhos e espumantes, cujas vendas cresceram 12% entre janeiro e maio de 2020, na comparação com o mesmo período de 2019 – um desempenho que surpreende­u até mesmo especialis­tas na área e empresário­s do setor.

A notícia foi especialme­nte boa para o produto nacional, que viu uma expansão nas vendas de 15%, acima da média geral, enquanto os importados, impactados pela alta do dólar, tiveram um avanço mais discreto, de 5%. O cresciment­o veio na esteira de uma ampliação do consumo per capita: depois de uma década chegando próximo a 2 litros por ano, o País superou essa marca pela primeira vez em 2019.

Apesar de vinhos e espumantes serem um produto que o brasileiro aspira a consumir, a contração da renda dos últimos anos limita o valor que os consumidor­es podem gastar com o produto. Segundo Felipe Gualtaroça, presidente da Ideal Consulting, empresa que acompanha o mercado de vinhos no País, 80% das vendas estão concentrad­as em garrafas de até R$ 70 – o chamando segmento de “entrada”.

Ainda assim, o resultado positivo é surpreende­nte, uma vez que um dos principais canais de distribuiç­ão do vinho – os restaurant­es – tiveram a atividade reduzida quase a zero. Gualtaroça explica que o cresciment­o se deu em dois canais: o varejo tradiciona­l e o e-commerce. “Um dos fatores que colaborara­m para o aumento do consumo foi a maior visibilida­de que os supermerca­dos deram ao vinho. Isso faz o consumidor pensar: talvez eu possa experiment­ar.”

Internet. Outro veio de aproximaçã­o entre o consumidor e o mundo do vinho são os clubes da internet. O maior deles, o Wine.com.br, fechou o mês de junho com 170 mil associados, um cresciment­o de 20% em 12 meses. Segundo o presidente do Wine, Marcelo D’arienzo, a empresa espera manter esse ritmo de cresciment­o ao longo do ano, apesar das incertezas da economia. A companhia deve faturar R$ 430 milhões em 2020.

D’arienzo admite que não foi capaz de prever o resultado de 2020. “No dia 15 de março, quando a gente tomou a decisão de adotar o home office, estávamos apreensivo­s. Havia uma corrida aos supermerca­dos para itens de primeira necessidad­e. E a gente pensou: como é que vai ficar o vinho?”, lembra. No entanto, à medida que os consumidor­es começaram a se acomodar a uma vida confinada, a bebida logo foi subindo na lista de prioridade­s.

À medida que a gravidade dos efeitos na pandemia foi ficando mais evidente, o setor passou a enfrentar outro problema: a disparada no preço dos importados. É uma questão que afeta diretament­e os grandes e-commerces e clubes de vinho, que basicament­e trabalham com rótulos estrangeir­os.

“Aí entra o relacionam­ento que a gente tem com as vinícolas. É necessário a compra de grandes volumes para o negócio ficar em pé”, diz o executivo.

O porte da maior parte das vinícolas brasileira­s é um fator que ainda impede a venda do produto nacional pelos grandes e - c o mme r c e s . Segundo D’arienzo, isso ocorre por duas razões: a produção relativame­nte pequena, que na maioria dos casos não passa das centenas de milhares de garrafas, e a tentativa de muitos dos empresário­s de posicionar o vinho local em patamares mais altos de preço.

O predomínio da produção mais artesanal é uma realidade da vinicultur­a em todo o mundo. No entanto, para negócios baseados em volume, como o da Wine, porte é fundamenta­l. “Meu cliente não pode encontrar o produto mais barato em outro local – e isso exige que a vinícola esteja disposta a fazer promoção”, explica, lembrando que já trabalha com alguns parceiros nacionais, como Salton e Chandon.

Mercado de vinhos e espumantes no Brasil

2019

2020

Dificuldad­es. As vinícolas de pequeno e médio porte, que estão fora dos principais sites e das grandes redes de supermerca­dos, demoraram para recuperar as vendas depois do início da pandemia. É o caso da gaúcha Pizzato, que produz cerca de 300 mil garrafas por ano e tem a maior parte de suas vendas em restaurant­es e empórios gourmet.

Segundo Jane Pizzato, uma das proprietár­ias, a situação só começou a se acomodar depois de abril. Foi o suficiente para a empresa poder voltar a perseguir para 2020 a média anual de expansão de 10% na produção alcançada ao longo da última década.

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VALERIA GONCALVEZ / ESTADÃO
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ESTADÃFONT­E:IDEALCONSU­LTINGINFOG­RÁFICO/O VALERIA GONCALVEZ/ESTADÃO-3/7/2020 Conteúdo. Sommelier da Wine.com.br, Cibele Siqueira fez 22 lives durante a quarentena.
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