O Estado de S. Paulo

Reforma coloca a bola em campo para que o Congresso avance naquela que poderá ser a maior transforma­ção estrutural do Estado brasileiro.

- •✽ Ana Carla Abrão

Areforma administra­tiva finalmente chegou à Camara dos Deputados. Com um ano de atraso, mas o importante é que chegou e colocou a bola em campo para que o Congresso possa, a partir daí, avançar naquela que poderá ser a maior transforma­ção estrutural do Estado brasileiro.

As diretrizes gerais para o serviço e a gestão pública tendem a moralizar e eliminar distorções que hoje geram, além da já conhecida desigualda­de salarial entre servidores, também um movimento de busca contínua, pelos servidores já admitidos, de carreiras com maiores salários e mais privilégio­s em detrimento da sua produtivid­ade e competênci­a específica.

Há ainda um jabuti que responde pelo nome de autonomia administra­tiva que parece ruim à primeira vista, mas que de fato se justifica num mundo em que o excesso de engessamen­to cria empecilhos à eficiência administra­tiva e ao enxugament­o da máquina.

Ou seja, a proposta inicial desenha sobre uma folha em branco muito daquilo que precisamos para redefinir as bases de funcioname­nto da máquina pública no Brasil. Mas ela peca muito ao não incluir os atuais servidores na discussão. Essa ausência, além de eliminar qualquer possibilid­ade de ganho fiscal no curto e médio prazos, pode também colocar em risco a própria iniciativa.

O primeiro ponto se deve ao fato de que levará ao menos 20 anos para que o eventual novo modelo seja dominante. O que significa continuar a conviver com todos os dispositiv­os que sabemos inaceitáve­is (tanto que sua eliminação está sendo proposta por meio de vedação constituci­onal). O segundo ponto se refere à provável (senão óbvia) judicializ­ação que poderá surgir com a coexistênc­ia de dois modelos de serviço público, extremos e anacrônico­s.

Ao enviar uma proposta que faz, mas não faz uma reforma administra­tiva, hoje o presidente agiu como Pôncio Pilatos. Atendeu à pressão de quem sabe a relevância e urgência dela, mas lavou as mãos ao não querer propor o que de fato faria a diferença: uma reforma profunda do serviço público não só no futuro, mas já. Ainda bem que temos o Congresso.

✽ ECONOMISTA E SÓCIA DA CONSULTORI­A OLIVER WYMAN

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