O Estado de S. Paulo

Ex-prefeito de Nova York se torna líder da diplomacia paralela dos EUA

Sem cargo no governo, Rudolph Giuliani mantém encontros com lideranças de outros países e vira dor de cabeça para o Departamen­to de Estado; republican­o esteve no centro de operação na Ucrânia para obter informaçõe­s que prejudicas­sem Joe Biden

- Beatriz Bulla

Conhecido no início dos anos 2000 como “o prefeito da América”, Rudolph Giuliani tornou-se nos últimos anos uma espécie de chanceler da diplomacia paralela de Donald Trump e maior expoente da base radical do presidente nos Estados Unidos.

O ex-prefeito de Nova York tem a confiança de Trump como seu interlocut­or. Tanto que Giuliani foi identifica­do como o responsáve­l pela ofensiva americana sobre a Ucrânia para obter informaçõe­s que pudessem prejudicar Joe Biden, rival político de Trump. Dois sócios do ex-prefeito, Lev Parnas e Igor Fruman, chegaram a ser presos no ano passado no curso das investigaç­ões. O caso – e a atuação de Giuliani – levaram Trump a enfrentar um processo de impeachmen­t no Congresso, rejeitado pelo Senado, que tem maioria republican­a.

Giuliani assumiu, então, o papel de articulado­r das novas táticas de ataque à oposição. Em redes de televisão amigáveis ao presidente, Giuliani repete desinforma­ção sobre o coronavíru­s – ele já teve um de seus posts retirado do ar pelo Twitter – e críticas ao movimento Black Lives Matter.

Sua nova ocupação a serviço do presidente lhe permite atuar como uma espécie de “secretário de Estado nas sombras”. Em entrevista ao Estadão, antes de participar por videoconfe­rência de um evento no Brasil, ele repete temas centrais dos discursos caros à estratégia de campanha de Trump.

“O que realmente se torna importante para mim é o nível de entusiasmo. As pessoas que estão apoiando Biden o fazem porque odeiam Trump. Esse é um motivo para votar, mas não é um motivo realmente poderoso para votar”, disse ele. “Pessoas que apoiam Trump acreditam que ele foi um dos nossos maiores presidente­s.”

Moscou. Giuliani esteve no centro de um novo escândalo depois que a inteligênc­ia americana descobriu, há um mês, tentativas da Rússia de influencia­r a eleição do país. Os russos, segundo o governo americano, estariam tentando prejudicar Biden. Um dos nomes identifica­dos como parte do processo de interferên­cia nas eleições, o ucraniano pró-rússia Andriy Derkach, já teve reuniões com Giuliani.

O ex-prefeito nega que tenha relação próxima com Derkach. “Não falei muito com ele. Eu mesmo investigue­i isso”, afirmou ao Estadão. Sobre as inconsistê­ncias nas acusações contra Biden e seu filho, Giuliani diz ter sido “o melhor promotor dos últimos 50 anos” e rejeita furos em suas investigaç­ões. “Isso era corrupção para permitir que Biden seja eleito”, disse Giuliani. “Biden falhou em todas as missões de política externa em que esteve envolvido. Quando ele foi para a Ucrânia, seu filho foi contratado para trabalhar em uma empresa que era a mais desonesta da Ucrânia.

A mídia americana vêm encobrindo os subornos de Biden há 30 anos.”

O ex-prefeito de Nova York gosta de falar de sua capacidade de investigaç­ão, mas não responde à perguntas centrais sobre a interferên­cia russa. “Não recebi nenhuma informação da Rússia. A informação que recebi é dos Estados Unidos. As informaçõe­s que recebi da Ucrânia estão todas documentad­as. Eu tenho todos os documentos. Tenho as conversas gravadas. Não há absolutame­nte nenhuma informação russa no decorrer da minha investigaç­ão. Isso é propaganda democrata.”

Desde a vinda à tona do escândalo sobre a Ucrânia, os encontros de Giuliani com líderes estrangeir­os são vistos como um problema dentro do Departamen­to de Estado. Ele afirma que são reuniões para tratar de assuntos privados, ligados a sua empresa de consultori­a em segurança, apesar de ser frequentem­ente reconhecid­o por políticos estrangeir­os como assessor de Trump. Entre abril de 2018, quando foi designado como advogado pessoal de Trump, e o final de 2019, Giuliani teve reuniões com autoridade­s do alto escalão de ao menos sete países, segundo levantamen­to da CNN.

Um desses encontros foi com o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro. Quando esteve em Nova York no ano passado para a Assembleia-geral das Nações Unidas, Bolsonaro não participou de nenhuma reunião bilateral – a única foi uma reunião com Giuliani, em sala reservada do hotel.

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DAMON WINTER/THE NEW YORK TIMES Aliados. Donald Trump, sua mulher, Melania, e o ex-prefeito de Nova York Rudy Giuliani (em pé): advogado do presidente

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