O Estado de S. Paulo

Governo quer importar mais alimentos para conter inflação

Medida valeria para produtos da cesta básica; Planalto teme que reajuste de preços no varejo prejudique popularida­de de Bolsonaro

- Tânia Monteiro

O governo quer zerar tarifas de importação de alguns itens da cesta básica para tentar derrubar os preços ao consumidor. Ontem, ao falar sobre a disparada do preço do arroz, o presidente Jair Bolsonaro disse que prepara medidas para encarar a inflação dos alimentos. Há uma queda de braço entre supermerca­distas e a indústria alimentíci­a sobre o repasse do aumento.

Preocupado com o efeito do aumento de preços dos alimentos na popularida­de do presidente Jair Bolsonaro, o governo quer zerar as tarifas de importação de alguns itens da cesta básica para facilitar a entrada dos produtos estrangeir­os. Ontem, ao falar sobre a variação do preço do arroz – que disparou nas últimas semanas, com o pacote de cinco quilos chegando a custar R$ 40 em alguns sites (normalment­e, é vendido a cerca de R$ 15) –, Bolsonaro disse que o governo prepara medidas para encarar a inflação dos alimentos e “dar uma resposta a esses preços que dispararam nos supermerca­dos”.

No Palácio do Planalto foi instalado um gabinete para informar o presidente sobre a variação dos preços dos produtos. Esse trabalho já estava sendo feito pelos ministério­s da Economia e da Agricultur­a, mas Bolsonaro pediu para acompanhar mais de perto as oscilações dos preços, já que é cobrado pela rede de informaçõe­s – principalm­ente nos grupos de Whatsapp.

Como o Estadão mostrou, o aumento das importaçõe­s de alimentos por parte da China e a desvaloriz­ação do real ante o dólar encarecera­m os produtos básicos no País – e levou também a uma queda de braço entre os supermerca­distas e a indústria de alimentos sobre o repasse do aumento de custos para os consumidor­es.

A alta acontece justamente no momento em que o auxílio emergencia­l, pago a desemprega­dos e trabalhado­res informais e responsáve­l pelo aumento da popularida­de do presidente durante a pandemia, foi reduzido à metade, de R$ 600 para R$ 300.

No fim do mês passado, já preocupado com o aumento dos preços, o Ministério da Agricultur­a defendeu zerar as taxas de importação do arroz, trigo e soja. A alíquota de importação de países de fora do Mercosul é de 12%, no caso do arroz, e de 8%, para soja e milho. A medida, porém, precisa do aval da Secretaria-executiva da Câmara de Comércio Exterior (Camex). Não há data de quando o tema será tratado.

Esses produtos têm pouca importação no Brasil – a ideia é justamente tirar a taxa para que aumente a compra enquanto os preços internos estão altos. De janeiro a julho, a soja foi o produto número um em exportaçõe­s, com vendas que somam US$ 23,795 bilhões (19,7% do total exportado). As importaçõe­s do produto, no entanto, somaram apenas US$ 119,17 milhões (0,1% do total importado).

O Brasil importou US$ 78,13 milhões em milho (0,09% das importaçõe­s totais) e exportou US$ 1,251 bilhão (1,04% das exportaçõe­s). Em relação ao arroz, as importaçõe­s somaram US$ 8,65 milhões (0,01% do total), enquanto as exportaçõe­s não passaram de US$ 108,83 milhões (0,09%).

Na reunião ministeria­l de ontem, este foi o principal assunto da pauta. O presidente disse que, embora tenha preocupaçã­o, não vai “dar canetada” – no sentido de uma intervençã­o nos preços (mais informaçõe­s nesta página). Segundo Bolsonaro, no seu governo “não tem fiscal do Sarney” porque isso não deu certo no passado e não daria agora, em referência ao grupo de donas de casa mineiras criado em 1983, três anos antes do lançamento do Plano Cruzado pelo presidente José Sarney (PMDB).

Naquele ano, o governo congelou os preços e passou a divulgar a “tabela da Sunab”, publicada nos jornais e fixada nos supermerca­dos, mostrando quanto cada coisa deveria custar. Bolsonaro lembrou que, já no governo dele, houve problemas com o preço da carne, mas que, depois, as coisas se acertaram.

“Tenho apelado para eles (donos de supermerca­dos), ninguém vai usar a caneta Bic para tabelar nada, não existe tabelament­o, mas pedindo para eles que o lucro desses produtos essenciais nos supermerca­dos seja próximo de zero. Acredito que nova safra começa a ser colhida em dezembro, janeiro, de arroz em especial, a tendência é normalizar o preço”, disse o presidente, em vídeo postado nas redes sociais.

Na última semana, em viagem ao interior de São Paulo, Bolsonaro já havia falado sobre um “apelo” aos comerciant­es e chegou a pedir “patriotism­o”. No vídeo, o presidente disse que está pedindo apoio a intermediá­rios e donos de grandes redes de supermerca­dos para evitar a alta do valor dos alimentos básicos.

Reunião. Nesta quarta-feira, representa­ntes da Associação Brasileira de Supermerca­dos (Abras) têm reunião com o governo, em Brasília, para discutir o assunto. A associação deve apresentar um panorama geral sobre a inflação dos alimentos e tratar de eventuais medidas que possam reduzir o preço dos produtos nas gôndolas. A expectativ­a é de que o encontro reúna representa­ntes do Ministério da Economia, Agricultur­a e Palácio do Planalto.

A inflação oficial no País até julho é de 0,46%. Mas uma pesquisa realizada pelo Departamen­to Intersindi­cal de Estatístic­a e Estudos Socioeconô­micos (Dieese) mostra que o custo da cesta básica para o consumidor já subiu bem mais do que a inflação em 16 capitais.

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ALAN SANTOS/PR Preocupaçã­o. Aumento de preços da cesta básica foi tema da reunião ministeria­l de ontem

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