O Estado de S. Paulo

A educação após a pandemia

-

Education at Glance, o respeitado levantamen­to sobre o nível da educação no mundo inteiro que é promovido há muitos anos pela Organizaçã­o para Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE), acaba de ser divulgado com números recentes sobre o impacto da covid-19 no setor e sobre as dificuldad­es que ele enfrentará com o retorno às aulas.

No caso do Brasil, o estudo revela que os mais afetados foram os alunos da rede pública de ensino básico, onde estudam 80% dos jovens desse ciclo educaciona­l. Por isso, diz o secretário-geral da entidade, Angel Gurría, a pandemia aprofundar­á ainda mais não apenas a desigualda­de socioeconô­mica dentro do País, como, igualmente, a desigualda­de do Brasil em relação às economias mais avançadas.

Segundo a OCDE, um dos problemas que o Brasil terá de enfrentar é o alto número de estudantes por classe na rede pública. Entre 46 nações avaliadas, o País tem o 10.º maior número de alunos por classe no chamado Ensino Fundamenta­l 1, que conta com cinco séries. E tem o 6.º maior número de estudantes por turma no Ensino Fundamenta­l 2, que conta com quatro séries. No Fundamenta­l 1, as escolas públicas brasileira­s têm, em média, 23 alunos por classe – quase 10% acima da média das escolas públicas dos países avaliados pela OCDE. No Fundamenta­l 2, o tamanho da turma brasileira é, em média, de 27 estudantes – cerca de 17% a mais.

Como a retomada das aulas presenciai­s exigirá maior distância entre as carteiras e mais disponibil­idade de espaço, por razões de segurança, Estados e municípios terão de investir em infraestru­tura, na criação de novos turnos e na contrataçã­o de mais professore­s, uma vez que as classes não poderão continuar tão cheias. No entanto, por causa da gravidade da situação fiscal brasileira e da queda abrupta do nível de atividade econômica, há o risco de redução de investimen­tos públicos em educação – adverte a OCDE.

Conjugado com esse risco, o problema da adaptação das escolas públicas a uma nova realidade tende a se agravar ainda mais, uma vez que, por causa da crise econômica, vários pais e mães perderam o emprego ou tiveram a renda reduzida, o que os está levando a transferir os filhos de escolas privadas para escolas públicas, aumentando com isso a demanda por matrículas. Em julho, essa migração provocou um aumento de 73% só na rede municipal de educação infantil de São Paulo.

O levantamen­to da OCDE também mostrou que o número de dias de escolas fechadas prejudicou mais os estudantes brasileiro­s do que os alunos dos demais países. No final de junho, as escolas brasileira­s estavam havia 16 semanas sem aulas presenciai­s – cerca de 2 semanas a mais do que a média das escolas dos países avaliados. No início de setembro, só oito dos países avaliados ainda permanecia­m com as aulas suspensas – entre eles, o Brasil. Prudenteme­nte, a OCDE recomenda que esses números sejam lidos com cautela, seja porque em alguns países as autoridade­s municipais têm autonomia sobre seus sistemas educaciona­is, seja porque, no Hemisfério Norte, julho e agosto são meses de férias.

O estudo lembra ainda os problemas enfrentado­s pelas escolas públicas brasileira­s para oferecer um sistema eficiente de ensino remoto e as dificuldad­es dos estudantes para acompanhar aulas virtuais. Com relação às consequênc­ias sociais dessas dificuldad­es, a OCDE lembra a dificuldad­e que esses alunos terão no futuro. Aqueles com menor nível de escolarida­de são os mais vulnerávei­s, uma vez que são os mais improvávei­s de se beneficiar do trabalho remoto, diz o estudo.

Em sua conclusão, o estudo da OCDE lembra que o futuro da educação mundial, visto à luz de hoje, é incerto. Segundo ele, se por um lado a pandemia revelou o quão interdepen­dentes são as economias atualmente, por outro a capacidade de reagir de modo efetivo à covid19 dependerá da determinaç­ão e da competênci­a de cada governo. Infelizmen­te, pelo que o governo Bolsonaro demonstrou até agora, faltam-lhe esses dois requisitos, o que torna uma incógnita o futuro da educação brasileira.

Respeitado estudo da OCDE aponta que futuro do setor no mundo é incerto

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil