Obras e zeladorias seguem como trunfo eleitoral.
Vereadores indicam mais de R$ 64 milhões em emendas só nesta legislatura para manutenção de equipamentos públicos existentes
Os atuais vereadores de São Paulo indicaram, até o ano passado, cerca de R$ 104 milhões em obras na cidade, além de R$ 64 milhões para serviços de zeladoria – manutenção e limpeza de equipamentos públicos já existentes –, segundo levantamento sobre os gastos das emendas. Dessa forma, buscam preservar o cacife eleitoral nos bairros da cidade, mantendo seus nomes conhecidos do eleitorado. O Estadão conferiu essas obras e verificou que algumas delas já precisam de reparos ou ficaram só no papel.
Na periferia, a reforma ou construção de escadarias que fazem a ligação entre ruas é uma das ações que mais tiveram repasses indicados por vereadores. Foram liberadas 29 emendas, mas se tratam de serviços de baixo custo que totalizaram R$ 3,7 milhões.
No Jardim São Luiz, zona sul, a reforma de um “escadão” com cerca de 60 metros custou R$ 148 mil, destinados por uma emenda do vereador Reis (PT). A obra tapou buracos, instalou corrimãos e dois postes de iluminação, mas há reclamações de alagamentos. A analista Márcia dos Santos Vieira, de 35 anos, se impressionou quando descobriu o preço. “Se foi todo esse dinheiro deveria estar melhor.”
Outro tipo comum de obra é a instalação de equipamentos de ginástica em praças, em geral voltados para a população idosa e chamados de “Academia da Terceira Idade”. No alto da Brasilândia, zona norte, a instalação de uma praça com esses aparelhos de ginástica entre as ruas Hulétia e Mercedes Baravelle Fraga recebeu R$ 300 mil indicados pelo vereador Milton Leite (DEM) – a obra foi feita pela subprefeitura por R$ 243 mil.
Liberações. Há reclamações de parte de vereadores de que emendas chegam a ser liberadas pela Casa Civil, mas as licitações emperram e as obras não saem. Na documentação que a reportagem usou para apurar o uso das emendas, o campo de futebol de várzea do “Unidos do 6”, em Sapopemba, zona leste, havia recebido R$ 100 mil para a construção de um vestiário e reforma do alambrado, indicados pelo vereador Gilson Barreto (PSDB). Mas, no local, não havia vestiário e os alambrados estavam quebrados.
Barreto disse que foi informado pela Prefeitura de que a obra seria executada com recursos próprios, sem precisar usar sua emenda. “Estamos nos informando sobre a situação do lugar e, constatando-se problemas de conservação, enviaremos ofício às autoridades competentes”, afirmou o vereador. Já a Subprefeitura de São Mateus, responsável pela obra, disse que “lamenta a ação de vândalos que diminuem a vida útil do material reformado para melhor atender a população do bairro.”
Os times de futebol de várzea e os Clubes da Comunidade – em geral, campos que ocupam áreas públicas – também têm destaque na distribuição de recursos que os vereadores fazem com emendas. Barreto é o que mais destinou emendas aos clubes, que, no total, receberam R$ 24,1 milhões em obras tocadas neste mandato, oriundos de 105 emendas parlamentares.
O maior investimento foi indicado pelo vereador Adilson Amadeu (DEM, EX-PTB), que destinou R$ 1,5 milhão para o campo do Estrela do Pari, na região central. O campo ganhou novo gramado sintético no ano passado. O presidente do time, Glauberlã Ribeiro, disse que esperava que a verba fosse suficiente para instalar também um alambrado ao redor do campo, o que não foi feito. “Ainda vamos ter de fazer isso.” Ele disse que os demais times de várzea da região já tinham gramado sintético e que, por isso, buscou a Câmara. Amadeu afirmou que o gasto era justificável diante dos trabalhos sociais da agremiação na comunidade.
A construção de parques para cães, os “Parcães”, recebeu um total de R$ 490 mil dos vereadores, entre 2017 e 2019. Um dos locais que receberam a verba foi o Largo Nossa Senhora do Bom Parto, no Tatuapé, na zona leste. Foram R$ 80 mil para as reformas no Parcão da praça em dezembro de 2017, destinados pelo vereador José Police Neto (PSD) – o campeão desse tipo de emenda.
O vereador disse que as praças para cães são uma grande demanda da comunidade. “São as praças que mais têm cuidados.” Ele afirmou que, depois de instalados os Parcães, as praças passam a ser bastante frequentadas e que o senso de comunidade dos moradores é incentivado. “Todos eles têm grupos de Whatsapp.”
No Largo Nossa Senhora do Bom Parto, o Parcão é frequentado por vários animais de estimação do bairro. A moradora Márcia Bariani, de 51 anos, passeia todas as manhãs no local com o bulldog francês Taison. “Ele gosta de brincar ali, eu entro com ele todo dia”, disse Márcia. A mesma praça, porém, tem um playground para crianças, mas com brinquedos enferrujados e sujeira acumulada. “Nunca vi criança brincando ali”, afirmou o representante comercial Demerson Danezi, de 69 anos, que frequenta o local.