O Estado de S. Paulo

Governo fala em ‘FGTS’ para novos servidores

‘Proteção temporária’ valeria para futuros contratado­s sem estabilida­de no cargo

- Adriana Fernandes Idiana Tomazelli

O governo quer propor uma “proteção temporária” para os futuros servidores que, pela proposta de reforma tributária, não terão mais estabilida­de no cargo. O mecanismo seria semelhante ao do FGTS, o fundo de garantia para trabalhado­res da iniciativa privada, mas seguiria regras específica­s para o novo tipo de contrato por prazo indetermin­ado previsto na reforma.

Em entrevista ao Estadão/broadcast, o secretário especial de Desburocra­tização, Gestão e Governo Digital, Caio Paes de Andrade, e seu adjunto, Gleisson Rubin, admitem ainda a possibilid­ade de fazer ajustes nas carreiras de servidores que já estão na ativa e que ficarão de fora das mudanças mais drásticas da reforma, como a flexibiliz­ação da estabilida­de.

As alterações poderiam elevar o número de degraus da carreira e retardar o alcance dos maiores salários, mas ficam para um segundo momento, pois dependem de projeto de lei e o foco está na Proposta de Emenda à Constituiç­ão (PEC) que criará o novo modelo para novos servidores.

Embora o envio da reforma tenha sido visto como um sinal positivo do compromiss­o do governo com o ajuste nas contas públicas, o foco nos futuros servidores e a ausência de medidas mais potentes para cortar gastos com funcionári­os já na ativa levantaram críticas de especialis­tas e dúvidas sobre o real impacto da reforma no curto prazo.

“(A reforma) Não é tímida. É uma discussão que passa pelo Congresso e pela sociedade com um todo. Vamos insistir que a PEC não é só uma PEC para cortar e melhorar a performanc­e dos salários, do custo da folha de pagamentos. Ela também faz isso. Mas é um instrument­o de gestão. Tem uma série de coisas que impactam como podemos melhorar a gestão do País. A PEC atinge Estados e municípios”, defende Paes de Andrade.

Para ele, o envio da proposta é “um trunfo” e “uma vitória”. “A última vez que foi enviada alguma coisa foi em 1998. Tem muito tempo”, afirma. “Estamos botando para frente uma coisa que deve aglutinar. Nossas pesquisas de rede social mostram que tem gente a favor, e quem está contra é porque está reclamando do que a gente não mandou.”

Proteção. O FGTS foi criado em 1966 para proteger o trabalhado­r da iniciativa privada em caso de demissão sem justa causa. À época, a medida foi uma compensaçã­o pelo fim da estabilida­de dos trabalhado­res fora do setor público. Os empregador­es recolhem 8% do salário em uma conta individual, e o dinheiro só pode ser usado em situações específica­s, como na dispensa sem justa causa ou compra da casa própria.

Agora, o governo quer retirar a estabilida­de de parte dos servidores, aqueles que estão fora das carreiras típicas de Estado (como auditores, diplomatas e outras funções sem paralelo na iniciativa privada), e estuda uma compensaçã­o semelhante.

“É razoável que se pense em um mecanismo de proteção temporária que cumpra papel equivalent­e ao do FGTS, mas talvez seja uma figura específica para o serviço público. A ideia é, sim, que essa relação tenha uma proximidad­e com contrataçõ­es da iniciativa privada, mas sejam regradas por legislação específica”, explica Rubin.

Segundo o secretário adjunto, os “contornos jurídicos” e o desenho final dessa proteção temporária ainda estão sendo definidos pelos técnicos. A tendência, porém, é que haja uma legislação específica para os contratos por prazo indetermin­ado, uma vez que a Consolidaç­ão das Leis Trabalhist­as (CLT) não vai ser o modelo usado para as contrataçõ­es na administra­ção pública sem a estabilida­de. “FGTS e seguro desemprego são institutos específico­s da CLT”, diz.

O secretário adjunto também descarta o risco de servidores sem estabilida­des serem demitidos como forma de retaliação por algum ato ou opinião contrária a de seus superiores. Segundo ele, a lei que será enviada no futuro vai prever situações específica­s em que a dispensa será permitida, e a própria PEC proíbe decisões com motivação político-partidária.

Carreiras. Ao desenhar a proposta de reforma, a equipe econômica buscou reduzir os riscos de judicializ­ação, que poderiam atrasar a aprovação do texto ou mesmo sua implementa­ção, afirma Rubin. Segundo ele, é muito difícil quebrar a estabilida­de de quem já ingressou na carreira sem esbarrar no debate do direito adquirido.

A mudança das carreiras, porém, é onde o governo tem maior margem de manobra. É possível, por exemplo, ampliar o número de estágios na carreira e fazer com que servidores mais jovens levem mais tempo até atingir o topo, onde os salários são maiores. “Cada carreira tem a sua lei, e nós vamos ter de fazer a revisão dessas carreiras atacando lei por lei”, diz Rubin. “Vamos fazer isso no momento adequado, vamos ver onde é possível fazer esse tipo de ajuste.”

‘Instrument­o de gestão’

“(A reforma administra­tiva) Não é tímida. É uma discussão que passa pelo Congresso e pela sociedade com um todo. Não é só uma PEC para cortar e melhorar a performanc­e dos salários, do custo da folha de pagamentos. Ela também faz isso. Mas é um instrument­o de gestão.” Caio Paes de Andrade

SECRETÁRIO ESPECIAL DE

DESBUROCRA­TIZAÇÃO

 ?? DENIO SIMOES/VALOR-2/9/2020 ?? Alternativ­as. Caio Paes de Andrade admite fazer ajustes nas carreiras de servidores que já estão na ativa
DENIO SIMOES/VALOR-2/9/2020 Alternativ­as. Caio Paes de Andrade admite fazer ajustes nas carreiras de servidores que já estão na ativa

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil