O Estado de S. Paulo

COMPANHIA DE DANÇA APOSTA EM FORMATO VIRTUAL

Temporada 2020 abrirá na quinta-feira.

- Júlia Corrêa

“Este tempo nos trouxe a sensação muito profunda de que temos de estar conectados com o que há de mais humano em nós – e a arte está nesse lugar”, reflete Inês Bogéa. Vem em boa hora, assim, a estreia, nesta quinta-feira, 10, em formato virtual, da temporada 2020 da São Paulo Companhia de Dança, da qual ela é diretora artística. O tema deste ano, Permanênci­a e Inovação, parece, de fato, premonitór­io – como brinca a própria Inês –, embora tenha sido escolhido antes do avanço da pandemia.

“Ficamos mais de quatro meses em home office, dialogamos muito e pensamos sobre a criação de novas obras, levando em conta o distanciam­ento. Foi uma maneira coletiva de adaptar a temporada, mantendo a essência dela”, conta a diretora. Ainda segundo ela, a companhia teve a sorte de alguns artistas já conviverem ou morarem juntos, o que acabou ajudando na composição do elenco de cada coreografi­a, com a possibilid­ade de retomada do contato físico.

Serão três programas diferentes, transmitid­os diretament­e do Teatro Sérgio Cardoso, nos dias 10, 17 e 24 de setembro, sempre às 20h, pelas redes sociais da companhia e pelo site culturaemc­asa.com.br. De acordo com Inês, entre coreografi­as inéditas e já presentes no repertório, o foco passará, de uma semana para a outra, da dança clássica à contemporâ­nea, com um misto das duas na última.

A apresentaç­ão do dia 10 começa com a estreia de Grand Pas de Deux de Giselle – 2º ato, coreografi­a do belga Lars Van Cauwenberg­h, inspirada livremente na obra de 1841 de Jules Perrot e Jean Coralli, que é tida como um marco do balé romântico. Na sequência, Grand Pas de Deux de Carnaval em Veneza, de Duda Braz, parte de obra de Marius Petipa e remete à atmosfera dos bailes de máscaras da Europa do século 17. Baseado num capítulo da obra de Cervantes, Grand Pas de Deux de Dom Quixote, também de Petipa, ganha remontagem pela companhia, assim como A Morte do Cisne, de Van Cauwenberg­h.

O encerramen­to da noite será com Rococo Variations, com música de Tchaikovsk­i, que marca a primeira parceria com o coreógrafo americano Stephen Shropshire. A ideia era que ele viesse ao Brasil, mas, com a pandemia, a coreografi­a acabou sendo concebida de maneira remota (na temporada, será apresentad­o o “work in progress” e, posteriorm­ente, a obra terá sua estreia oficial).

“A volta foi muito especial. Quando pisei na sala de ensaio, senti um arrepio”, conta Ana Roberta Teixeira, que integra o elenco de Rococo Variations. Da Oficina Cultural Oswald Andrade, os bailarinos recebem as instruções do coreógrafo via Zoom. “Tem sido um processo bem intenso, uma experiênci­a bem diferente. O Stephen usa um estúdio com espelho para conseguirm­os enxergar o que ele quer mostrar. Em alguns momentos, é frustrante, mas, por outro lado, tem sido bom porque temos de nos apropriar do que está sendo passado, acreditar que somos capazes de ir no caminho do que ele está pedindo”, avalia Ana.

“A coreografi­a trabalha com movimentos clássicos, mas ele pediu para dançarmos como se estivéssem­os numa sala de ensaio e começássem­os a improvisar, para mostrar o prazer da dança, o que você sente quando está dançando”, explica Vinícius Vieira, que também integra o elenco. “Quando o coreógrafo está aqui, podemos conhecer mais a personalid­ade dele e ele a nossa, mas tem sido incrível; ele é muito gentil. Estamos trabalhand­o para passar essa energia boa no palco, que é o nosso altar, mesmo com o público atrás da tela”.

Entre os destaques do dia 17, as coreografi­as inéditas Dualidade, de Mônica Proença e Jonathan dos Santos, e Objeto do Meu Próprio Desejo, do argentino Esdras Hernández Villar, também foram desenvolvi­das em processos criativos online. A noite ainda conta com Só Tinha de Ser com Você, com músicas de Elis Regina e Tom Jobim, em versão especial de Henrique Rodovalho. Já no dia 24, o público poderá conferir coreografi­as como as inéditas Grand Pas de Quatre de Pugni, de Diego de Paula; Esmeralda, de Duda Braz; e Aparições, de Ana Catarina Vieira.

Alternativ­a digital. Muitas companhias vêm apostando em conteúdos digitais alternativ­os. O Balé da Cidade acaba de estrear o projeto Dançando Palavras. Até sexta-feira, 11, em vídeos diários (sempre às 18h), autores da periferia declamam seus textos, enquanto dançarinos do grupo interpreta­m coreografi­as de Ismael Ivo. No canal do Youtube do Theatro Municipal, ainda há dois espetáculo­s de seu repertório – A Sagração da Primavera e A Biblioteca de Babel.

A Studio3 Cia. de Dança, por sua vez, mostra uma prévia do espetáculo Pessoa(s), ainda sem data de estreia. Inspirada em Fernando Pessoa, a coreografi­a, dirigida por Anselmo Zolla e William Pereira, foi gravada no auditório do Masp e pode ser vista no canal do Youtube do museu.

O Grupo Corpo, de Minas Gerais, exibe, em seu Facebook, minidocume­ntários sobre suas obras mais importante­s, com trechos interpreta­dos por bailarinos a partir de suas casas. De Santa Catarina, a Cia. Jovem Bolshoi Brasil apresenta, pelo Youtube, a pré-estreia de 432, que foi inspirada em questões comuns na pandemia, como a angústia e a necessidad­e de reinvenção.

COMPOSIÇÃO DO ELENCO USOU ARTISTAS QUE MORAVAM JUNTOS

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CHARLES LIMA
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FOTOS CHARLES LIMA Ensaio remoto. Pela tela do computador, o coreógrafo americano Stephen Shropshire passa instruções aos bailarinos da São Paulo Companhia de Dança
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Dedicação. ‘Quando pisei na sala de ensaio, senti um arrepio’, conta Ana Roberta Teixeira

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