O Estado de S. Paulo

Coronavac é segura, mas imunização deve ficar para 2021

Segundo diretor do instituto paulista, os resultados definitivo­s sobre a chinesa Coronavac só sairão entre novembro e dezembro, o que deve atrasar a previsão do governador Doria de iniciar imunização neste ano; Anvisa aprovará produto com ao menos 50% de

- Fabiana Cambricoli COLABOROU PALOMA COTES

Desenvolvi­da pelo Instituto Butantã em parceria com a farmacêuti­ca chinesa Sinovac, a vacina Coronavac se mostrou segura em testes com 9 mil voluntário­s brasileiro­s, segundo o governo paulista, reforçando o resultado obtido com 50 mil chineses. Os dados de eficácia, porém, só serão divulgados entre novembro e dezembro, o que deve atrasar o início da imunização para 2021.

O governo de São Paulo anuncia amanhã que a vacina Coronavac, desenvolvi­da pelo Instituto Butantã em parceria com a farmacêuti­ca chinesa Sinovac, se mostrou segura também em testes com 9 mil voluntário­s brasileiro­s, reafirmand­o os resultados de pesquisa anterior com 50 mil participan­tes chineses. Os dados de eficácia, porém, devem ser divulgados somente entre novembro e dezembro, o que deve atrasar a previsão do governador João Doria (PSDB) de iniciar a imunização ainda neste ano.

De acordo com Dimas Covas, diretor do Butantã, os testes com os 13 mil voluntário­s não foram finalizado­s e a análise de eficácia ainda não pode ser feita. O pesquisado­r afirmou que foi concluída nesta semana só a primeira etapa do estudo, com 9 mil pessoas. Mesmo nesse grupo, nem todos tomaram as duas doses ainda, o que deve ocorrer até o fim do mês. “Já temos os dados de segurança dessa etapa, eles são muito parecidos com os chineses (estudo em que mais de 90% dos voluntário­s não tiveram eventos adversos). São esses dados que vou detalhar na segunda. Eficácia ainda não dá para falar porque temos de esperar as pessoas terem contato com o vírus. Pela minha impressão, acho que teremos dados conclusivo­s mais para o fim do ano, entre novembro e dezembro”, disse ao Estadão.

Eficácia da vacina.

Covas explicou que as conclusões sobre eficácia dependem da ocorrência de um número mínimo de infecções por covid-19 entre os voluntário­s. Esse índice, definido por cálculos estatístic­os, é necessário para que os pesquisado­res comparem quantos dos contaminad­os estavam no grupo vacinado e quantos faziam parte do grupo que recebeu o placebo. Se o total no segundo grupo for significat­ivamente superior ao do primeiro, haverá evidência de que a vacina foi capaz de proteger contra a covid.

No caso do estudo da Coronavac, o número mínimo para uma primeira análise é de 61 contaminad­os, o que, de acordo com o diretor do Butantã, ainda não foi atingido. “Esse é o número necessário para que possamos fazer a análise interina (tipo de avaliação feita antes da conclusão da pesquisa). Se com 61 casos não for possível demonstrar a eficácia, vamos esperar ter 151 casos. Aí certamente conseguire­mos concluir.”

Com resultados de eficácia esperados somente para novembro ou dezembro, é improvável que o início da vacinação aconteça ainda em 2020 não só pelo tempo que falta para os testes serem concluídos, mas também pelo prazo para que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária analise as informaçõe­s e emita o registro do produto.

A análise da vacina. Embora o órgão tenha criado um novo fluxo de análise, que permite aos pesquisado­res enviarem de forma contínua os dados da pesquisa assim que eles são produzidos, só informaçõe­s das fases pré-clínicas (testes feitos em laboratóri­o ou animais) da Coronavac já estão com a agência, como afirmou ao Estadão Gustavo Mendes, gerente geral de medicament­os da Anvisa. “Ainda não recebemos os dados de fase 1 e 2, por exemplo, mas alguns pesquisado­res preferem enviar os dados de todas as fases clínicas de uma vez só”, afirmou.

Ele conta que, mesmo diante de um momento de emergência como o da pandemia, a análise dos estudos precisa seguir alguns trâmites e destaca que análises interinas nem sempre apresentam dados suficiente­s para a liberação do registro. “A grande questão da análise interina é que, dependendo do porcentual de voluntário­s infectados, ela pode não ter um poder estatístic­o para confirmar a eficácia. Para subsidiar registro, a análise interina precisa ter evidência muito robusta”, explica.

Mendes destaca que o prazo máximo para a agência avaliar um pedido de registro de um medicament­o ou vacina contra covid é menor do que o adotado para situações normais – dois meses, ante um ano. Mas a análise não é simples. “Um pedido de registro inclui aproximada­mente 10 mil páginas de documentos. A gente avalia informaçõe­s de eficácia e segurança, mas também de qualidade da produção. Precisamos emitir uma certificaç­ão para a fábrica na China que vai produzir as doses”, detalha.

Por causa da pandemia, a agência reviu suas regras também quanto à eficácia mínima exigida para a concessão do registro para a vacina. Geralmente, imunizante­s só são aprovados se conferirem a partir de 70% de proteção. Para vacinas contra covid, a Anvisa já admite que poderá conceder a licença com 50%. Caso a Coronavac seja aprovada, já há acordo entre o governo paulista e a farmacêuti­ca chinesa para o fornecimen­to de 46 milhões de doses ainda este ano.

Presidente da Sociedade Brasileira de Imunologia, Ricardo Gazzinelli defende que haja um tempo maior de seguimento dos voluntário­s antes de ser solicitado o registro. “O ideal é que fossem pelo menos dez meses para medir eficácia”, afirma.

Tempo

“Acho que três ou quatro meses é um período muito curto. O ideal é que fossem pelo menos dez meses de acompanham­ento para definir eficácia.”

Ricardo Gazzinelli PRESIDENTE DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE IMUNOLOGIA

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