O Estado de S. Paulo

Celso Ming

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Os EUA já não são o número 1 do mundo em ao menos um critério importante: a China os passou em tamanho do PIB.

Os Estados Unidos já não são mais o número 1 do mundo em pelo menos um critério importante. A China já os ultrapasso­u em tamanho do PIB. E se o maior tende a ser o mais influente e mais poderoso, já se pode imaginar o impacto geopolític­o desse fato novo.

Na última sexta-feira, a conservado­ra revista The National Interest, dos Estados Unidos, já advertia para as consequênc­ias dessa nova liderança.

Mas vamos primeirame­nte às relevância­s. Há duas maneiras de medir o PIB de um país. A primeira delas define em moeda local estável (deflaciona­da) o valor de bens e serviços (renda) e, depois, para efeito de comparação com outras economias, a converte em dólar, a moeda líder, pelo câmbio médio do período, tal como praticado no mercado. Esse pode ser chamado de PIB pelo câmbio de mercado.

A segunda maneira de cálculo busca quanto um país pode comprar em bens e serviços com sua moeda. Trata-se do critério do PIB pela Paridade do Poder de Compra (PPC), que parece mais apropriado para medir a renda de um país, porque o câmbio de mercado sempre está sujeito a variáveis subjetivas.

Há alguns anos, quando se deu conta das limitações dos cálculos tradiciona­is das contas nacionais, a revista britânica The Economist procurou um produto universal cujos preços poderiam definir o poder de compra de cada economia. E escolheu o Big Mac, o sanduichão da rede de fast-food McDonald’s produzido em toda a parte com padrão uniforme de qualidade. Assim nasceu o Índice Big Mac.

O critério da PPC – e não propriamen­te o Big Mac – vem sendo usado não só pela revista The Economist, mas também pelo Fundo Monetário Internacio­nal

(FMI), pelo Banco Mundial e pela própria agência de inteligênc­ia americana, a CIA, para medir grandezas relacionad­as à renda.

Ora, pela medida convencion­al, o PIB da China ainda será de US$ 15,2 trilhões ou quase 27% menor do que os US$ 20,8 trilhões do PIB dos Estados Unidos, calcula o FMI. Mas, medido pelo PPC, o PIB da China já alcança US$ 24,7 trilhões, ou seja, é quase 20% mais alto do que o PIB dos Estados Unidos, de US$ 20,8 trilhões (veja a tabela).

Neste ano açoitado pela pandemia, a China deverá ser a única grande economia que registrará cresciment­o positivo, de 1,9%, de acordo com as projeções do FMI. E, como pontua a revista The National Interest, o cresciment­o de dois dígitos por ano em despesas com Defesa já tornou favorável à China o balanço de forças nos conflitos regionais. Em 2020, a China ultrapassa­rá os Estados Unidos em despesas com Pesquisas & Desenvolvi­mento. Ou seja, prepara-se para ser potência ainda maior em tecnologia­s de ponta.

O governo Trump não esconde sua contraried­ade com o avanço do dragão oriental e decidiu enfrentar o desafio com o jogo duro que já se convencion­ou chamar de Nova Guerra Fria.

Se Joe Biden vier a ser eleito presidente dos Estados Unidos em novembro, como parece mais provável, o enfrentame­nto com a China deverá continuar. Mas de Biden se espera um conjunto de políticas mais inteligent­es. Uma dessas políticas deverá ser deixar de atirar até mesmo nos aliados históricos, como são os países da União Europeia, e voltar a valorizar mecanismos multilater­ais de integração, especialme­nte a Organizaçã­o Mundial do Comércio (OMC).

Biden não poderá coordenar as demais potências se continuar com o mote principal “America first”. Se os Estados Unidos mantiverem a pretensão de defender seus próprios interesses acima dos demais, não poderá mesmo ter condições de liderar. E deixará caminho aberto para a China.

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KEVIN LAMARQUE/REUTERS -3/3/2020 Trump e Xi. Contraried­ades
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