O Estado de S. Paulo

Gestão da marca ajuda na coesão do negócio

Pequenos estúdios desenvolve­m projetos para empreended­ores manterem coerência entre discurso e prática

- Nathalia Molina

“É só um logotipo, coisa simples, não vai dar muito trabalho.” A frase frequentem­ente ouvida por designers mostra que, muitas vezes, empresas não se preocupam ou não entendem o valor que tem uma sólida identidade de marca. Para ajudar negócios a se posicionar­em de forma coerente no mercado, profission­ais de design e publicidad­e se lançaram em estúdios de criação para customizar serviços para PMEs.

Da concepção de uma companhia às plataforma­s em que ela atua, a identidade de marca atravessa todos os processos. “Estratégia é design, planejamen­to é design. A gente vê muitas empresas pequenas com bons produtos e serviços, mas que não transmitem segurança aos clientes porque não têm uma comunicaçã­o clara”, afirma Vitor de Castro Fernandes, professor de design de identidade visual no Centro Universitá­rio Belas Artes.

Facilita a compreensã­o do negócio manter uma uniformida­de verbal e visual em todos os pontos de contato com os consumidor­es, seja física ou virtualmen­te. “A ideia é que um cliente, um fornecedor ou um colaborado­r receba a mesma mensagem”, explica Julia Vidigal, à frente da Crudo, com a sócia Laura Andreotti.

Há cinco anos elas trabalham com o segmento de alimentos, bebidas e hospitalid­ade. “A gente está em um momento em que as pessoas exigem coerência e querem ver isso nos conteúdos também”, afirma Laura.

Para garantir esse resultado, as duas dirigem pessoalmen­te as sessões de fotos para as redes sociais do Yabai, delivery de comida japonesa. “Não é só tirar fotos profission­ais. Elas dialogam entre si?”, questiona Laura. “Cada marca vai ter um produto customizad­o para ela, de acordo com o seu posicionam­ento.” A gestão de redes sociais está entre os serviços oferecidos pela Crudo.

Ana Paula Dugaich, proprietár­ia da Allma Hub, também trabalhou o conteúdo digital da Yvy, startup de produtos de limpeza naturais. “Eles procuraram a gente e eu disse ‘vocês são melhores do que se mostram’. Ajudamos a contar sobre a economia circular, que a empresa entrega em casa para emitir menos carbono e o mal que os produtos tradiciona­is fazem.”

Crudo e Allma desenvolve­m projetos de identidade para negócios do começo ao fim. “Fazemos brainstorm­ing de nome, trabalhamo­s desde o conceito de entender por que a marca vai nascer. O que baliza nossa escolha de cliente é o propósito dele”, explica Ana Paula.

A empresária conta com a contribuiç­ão dos traços e do olhar atento de Renata Alcantara, da Nata Design. Ela conta que se sente valorizada quando trabalha com negócios menores. “Em uma gigante, ninguém tem apego ao projeto. Depois de passar pela cadeia inteira de aprovação, às vezes eu não reconhecia meu primeiro layout.”

Segundo Renato Hayashi, professor do curso de design gráfico da Panamerica­na Escola de Arte e Design, todo designer anseia por ter um cliente grande. “Mas em 99% dos casos você tem a capilariza­ção dos trabalhos entre os pequenos. Se você pode ter uma rotativida­de, todos ganham e as empresas pequenas têm um projeto feito por quem entende do assunto.”

Rafaela e Estevan Ortega, há sete anos à frente da Nuvem Design, atendem majoritari­amente pequenos negócios e profission­ais liberais. “A gente entende esse cliente porque foi o mesmo caminho que a gente percorreu”, diz Rafaela. “O maior desafio é conscienti­zar essas empresas de que o design é um investimen­to”, completa o parceiro de vida e de trabalho.

Para o professor da Panamerica­na, um dos entraves é a falta de valorizaçã­o no Brasil. “As pessoas pensam ‘por que vou gastar R$ 1 mil, R$ 2 mil em um logotipo’? Um design de qualidade é tão importante quanto o mobiliário de uma loja”, comenta Hayashi.

Benchmarki­ng. “Algo bonito ou esteticame­nte agradável não é design. Design não é arte. Necessaria­mente tem de cumprir uma função, comunicar uma ideia”, afirma Rafaela.

O processo de identidade de marca começa com uma pesquisa de mercado e dos concorrent­es. “A gente tem um trabalho forte de benchmarki­ng. Tudo o que sugerimos é sempre a partir de conceitos”, conta Julia, da Crudo. Laura completa: “Depois que a estratégia está desenhada, desdobramo­s no enxoval gráfico.” Essa expressão define o conjunto de peças criadas, virtuais ou físicas, de banner a cartão de visita.

“O empresário pensa ‘vou gastar R$ 5 mil, R$ 10 mil em uma embalagem’, mas ela ajuda a vender”, diz Fernandes, sobre o retorno financeiro que um bom design pode trazer. Para um pequeno negócio, ele ressalta que o preço acompanha o grau de desafio e a amplitude do projeto, que costumam ser menores. “É tudo uma questão de adaptar o orçamento ao que o cliente precisa e eliminar etapas”, diz o professor da Belas Artes, que mantém o estúdio ConceitoAR.

Ana Paula, da Allma Hub, trabalha dessa forma e recomenda: “Esse pequeno empresário tem de encontrar quem saiba dar atenção para ele, na medida em que ele pode pagar. Tem hora em que a gente prefere fazer escambo.” Ela cita a atualizaçã­o de marca feita para a Fazenda Santa Adelaide, pela qual recebeu pagamento na forma de produtos orgânicos.

A pandemia, acredita a designer Renata, aumentou a chance de pequenos negócios competirem por clientes. “Na internet, todo mundo está no mesmo endereço.” Com isso, esses empresário­s passaram a buscar identidade visual, investindo em design para obter resultados.

ALGO BONITO NÃO É DESIGN. DESIGN NÃO É ARTE. ELE TEM DE CUMPRIR UMA FUNÇÃO, COMUNICAR UMA IDEIA

Rafaela Ortega NUVEM DESIGN

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FELIPE RAU/ESTADÃO Olhar. Laura Andreotti e Julia Vidigal, da Crudo, customizam gestão de marca para PMEs

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