O Estado de S. Paulo

‘SÓ NÃO VÊ A REALIDADE QUEM NÃO QUER’

- /MARCELA PAES

Yan Carpenter (acima) não pensava que a foto que tiraria na volta do trabalho, dentro do BRT (meio de transporte público), faria tanto sucesso. Também nunca imaginou que o registro (foto acima à dir.) o faria sair da comunidade carioca de Rio das Pedras diretament­e para o bairro do Pacaembu, onde vive atualmente. Mas, sim, tudo isso aconteceu na sua vida em cerca de cinco meses.

Hoje, o jovem de 26 anos não depende mais do emprego de atendente em uma hamburguer­ia e vai abrir amanhã sua primeira exposição como artista, no restaurant­e Figueira Rubayat, em São Paulo. Rodo Cotidiano é uma compilação de cliques urbanos de Carpenter, que mostram, em sua maioria, aspectos do dia a dia de trabalhado­res durante a pandemia. Seis dos 18 trabalhos expostos já foram vendidos.

Com o sucesso da foto, o fotógrafo acabou sendo apadrinhad­o por Carol Maluf, que diz que logo de cara percebeu que o registro era o “trabalho de um artista”. Depois de conhecer outros cliques dele pelo Instagram, Carol pediu, por uma mensagem direta, que Yan levasse seu portfólio a uma amiga galerista. “Ele não entendeu nada, mas acabou indo. E, de fato, todo mundo achou as fotos muito boas”, conta ela, que também ajudou Yan a arrumar o emprego fixo como fotógrafo da ONG Gerando Falcões.

“Se você me perguntar como eu estava quando tirei a foto, não vou te dizer coisa boa. Estava em um abismo emocional. Pensava ‘pô cara, não tô trabalhand­o na minha área, tô insatisfei­to, não tô morando no lugar que eu quero. Estava contando moeda para comprar comida”, explica Yan. O jovem carioca – que começou a fazer as fotos urbanas quando saía do trabalho, na caminhada para pegar a van – conta que o clique que viralizou por mostrar o BRT lotado de trabalhado­res com máscara, não foi planejado. “Eu não costumava pegar o BRT, mas nesse dia acabei indo por ele. Eu tirei a foto porque vi muitas pessoas como eu, que continuava­m ali, na linha de frente, pegando ônibus cheio. Aquilo, mais do que tudo, fazia sentido pra mim, dentro da minha vida, do meu diário”. Para ele, o retrato fez sucesso por mostrar algo que, apesar de óbvio, não estava sendo discutido. “Me entristece ver que precisa surgir uma foto para que a situação de um monte de gente comece a ser debatida. Só não vê a realidade quem não quer”.

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YAN CARPENTER
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